Grande maioria dos deputados tratou a denúncia como de cunho eleitoral e cobrou provas. Foto: Reprodução/TV Assembleia.

Teve grande repercussão na sessão remota da Assembleia desta quinta-feira (14) a peça apresentada pelo Sindicato dos Médicos do Ceará ao Ministério Público Estadual (MPCE), afirmando ter recebido denúncias de que médicos estariam sendo pressionados pelo Governo do Estado a assinar atestado de óbitos falsos, indicando mortes por Covid-19.

O presidente da Casa, deputado José Sarto (PDT), informou ter encaminhou ofício ao Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE) solicitando que seja remetido ao Parlamento Cearense o pedido de investigação protocolado pelo Sindicato dos Médicos na última quarta-feira (13). Sarto disse que a oficialização do pedido, por meio da Procuradoria da Casa, tem por objetivo pedir esclarecimentos ao presidente do sindicato, Edmar Fernandes, sobre quem são os autores das denúncias, bem como os médicos que estão sendo pressionados e quem está realizando essa pressão sobre eles.

“Sou médico, assim como vários parlamentares desta Casa, e uma das grandes dificuldades da profissão é preencher um atestado de óbito, porque ele tem um aspecto legal. Para além do comprometimento da relação entre médico e família, existe um aspecto legal”, observou. “Queremos saber quem cedeu à ordem de assinar atestado de óbito falso, porque isso é crime”, enfatizou.

Sobre a suspeita levantada pelo sindicato, José Sarto pontuou ainda que a atitude da entidade médica não reflete o posicionamento de toda a categoria. “Ontem (13) recebi uma carta assinada por 300 médicos, afirmando que essa não é uma posição da maioria dos médicos, mas de parte da burocracia do Sindicato dos Médicos”, informou.

Também em nota, o Conselho Regional de Medicina do Estado do Ceará (Cremec) reafirmou a autonomia médica, diante do que classificou como ‘denúncia genérica’.

Requerimento de reunião virtual

Também nesta quinta-feira, os deputados Augusta Brito (PCdoB) e Guilherme Landim (PDT) apresentaram requerimento que solicita a realização de reunião virtual com o presidente do Sindicato dos Médicos do Ceará, para prestar esclarecimentos ao legislativo estadual sobre supostas denúncias. 

“A afirmação do presidente do Sindicato dos Médicos é muito séria e coloca em descrédito o trabalho de milhares de profissionais que diariamente enfrentam as dificuldades características do combate ao coronavírus. É preciso que o presidente venha a esta Casa, virtualmente, e preste esclarecimentos sobre essas denúncias num momento tão grave como o que enfrentamos”, afirma Landim, que também é médico.

O requerimento foi aprovado na reunião da Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público. O convite não tem caráter obrigatório.

Polêmica

As denúncias que o sindicato afirma ter recebido repercutiram na sessão plenária desta quinta. Autora do requerimento, a deputado Augusta Brito lamentou a ‘infeliz denúncia do sindicato’. Segundo ela, a nota apenas prejudica o trabalho do Estado, levando descrédito à população que precisa ser bem informada quanto à pandemia. “Considerando a gravidade da situação, e as atribuições regimentais desse colegiado, se faz urgente que a realização da reunião virtual para que possamos apurar as informações veiculadas”, justificou a deputada.

Para alguns parlamentares, as tais denúncias têm cunho político-partidário. “Todo mundo sabe que o presidente do Sindicato está cheio de fotos com o presidente Bolsonaro nas redes sociais e é ligado à Dra. Mayra Pinheiro que, desde que perdeu a eleição pro Senado, só quer prejudicar o Ceará”, afirmou o deputado Osmar Baquit (PDT). O parlamentar alegou que que o sindicato deveria criar uma comissão própria para investigar, caso entenda que há alguma irregularidade, além de lembrar que a entidade deveria lutar pela liberação dos respiradores comprados pelo Estado e retidos pela União.

Para Guilherme, declarações colocam em descrédito milhares de profissionais médicos. Foto: Reprodução/TV Assembleia.

Médico, o deputado Bruno Gonçalves (PP) também defendeu que se ouça o sindicato sobre denúncias. “Jamais um profissional deixará sua casa para forjar atestado de óbito a mando de alguém”, afirmou, lamentando que o Sindicato dos Médicos esteja ‘aparelhado pela União’.

O líder do governo na Casa, deputado Júlio César Filho (Cidadania), defendeu que o sindicato apresente provas do que afirmou. “Uma pessoa que acusa sem provas não merece crédito. É importante que possamos ouvi-lo até para podermos investigar”, defendeu.

Heitor Férrer (SD) lamentou que fake news venham dificultando o combate ao coronavírus no Ceará. Também médico, Guilherme Landim disse ser estarrecedor, em momento como esse, que o sindicato venha fazer declarações ‘maldosas, politiqueiras e criminosas’. “Precisamos saber a quem interessa esconder os casos de Covid no Ceará, pois o Estado testa bem mais do que a maioria dos demais”, afirmou Guilherme.

O deputado Acrísio Sena (PT) defendeu que a Assembleia Legislativa cobre ao Conselho Regional de Medicina e ao Sindicato dos Médicos do Ceará darem resposta sobre o que chamou de ‘mais uma fake news divulgada pelo deputado estadual André Fernandes (PSL)’.

“Isso demonstra a falta de responsabilidade do parlamentar, divulgando mais uma fake news criminosa, e a Assembleia precisa chamar estas entidades pra responder: quem são estes médicos? Onde estão as provas? Alguém precisa responder por isso”, afirmou.

Primeiro secretário da Mesa Diretoria, o deputado Evandro Leitão (PDT), não poupou críticas às denúncias. “Além de enfrentar esse vírus tão forte, temos que enfrentar aqui o vírus da mentira, das fake news. Estão querendo fazer política com a pandemia, com uma classe de profissionais”, lamentou.

Fernando Hugo (PP), decano da Casa e também com formação médica, sugeriu que a Assembleia ouvisse não apenas representantes do Sindicato dos Médicos, mas também da Ordem dos Advogados no Brasil (OAB-CE), Conselho Regional de Medicina do Estado do Ceará (Cremec) e comissões de Saúde da Assembleia e da Defensoria Pública.

Salmito (PDT) lembrou que é o Cremec é quem rege a profissão, devendo ter sido feitas as denúncias naquela entidade, que preza inclusive pelo Código de Ética Médica.

Deputado Audic Mota(PSB) sugeriu que, antes de levar o presidente do Sindicato à Casa, que a Delegacia de Crimes Contra o Patrimônio Público o ouça, envie relatório para a Assembleia, para que sejam analisadas as provas apresentadas.

Outro médico, deputado Leonardo Pinheiro (PP) disse esperar que o Sindicato tenha provas das acusações, pois do contrário seria um desserviço imenso ao combate ao coronavírus.

O deputado Renato Roseno (Psol) disse lamentar muito que o Sindicato dos Médicos não represente os médicos, lembrando que mais de 300 profissionais da classe assinaram nota dizendo não serem representados pela entidade. Roseno defendeu o convite ao presidente da entidade para ser ouvido, além de o deputado André Fernandes, que postou denúncias com o mesmo teor nas redes sociais.

Voz dissonante no assunto, o deputado Delegado Cavalcante (PSL) se disse contrário ao requerimento e sugeriu que o presidente do sindicato entrasse com mandato de segurança para não ir à Assembleia. Ele reclamou dos termos utilizados por alguns colegas para falar do assunto, afirmando já terem opinião formada sobre a questão, o que inviabilizaria qualquer debate na Casa.