Lei Antimanicomial de 2001 proíbe internação em instituições com características asilares. Foto: Reprodução/ MP-BA

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o Ministério da Saúde vêm trabalhando em parceria para gradualmente fechar os hospitais de custódia, também conhecidos como manicômios judiciários — instituições onde pessoas com transtornos mentais cumprem sanções penais.

A atuação conjunta também prevê o alinhamento de orientações direcionadas a profissionais de saúde e do Poder Judiciário.

Os órgãos vão negociar com estados e municípios o financiamento federal para equipes multidisciplinares responsáveis por avaliar a situação de cada pessoa e integrá-las à Rede de Atenção Psicossocial (Raps) — que consiste em um conjunto de serviços, disponíveis nas cidades e comunidades, voltados aos cuidados de pessoas com transtornos mentais. Também haverá um incentivo ao crescimento dessa rede.

A internação de tais pessoas em locais com características asilares é proibida desde 2001 pela Lei Antimanicomial. A norma estabelece a preferência pelo tratamento em serviços comunitários de saúde mental.

Embora as internações tenham diminuído nos últimos anos, dados do Sistema de Informações de Departamento Penitenciário Nacional (Sisdepen) mostram que, em 2022, 1.869 pessoas cumpriam medidas de segurança em hospitais de custódia ou em estabelecimentos penais comuns.

Com o objetivo de reforçar a estrutura de saúde pública, representantes do Ministério da Saúde se reuniram, na última semana, com o coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas do CNJ, juiz Luis Lanfredi.

“O diálogo entre as instituições não visa apenas ao fechamento das unidades, mas busca, principalmente, a definição de condições materiais que possibilitem ao Estado cumprir a legislação brasileira, assim como, no plano internacional, se adequar aos preceitos das convenções de direitos humanos assinadas pelo Brasil, assegurando dignidade no cumprimento das medidas de segurança conforme esses parâmetros legais e estândares internacionais”, assinala Lanfredi.

O magistrado ressalta que também há pessoas em sofrimento mental nos presídios comuns, onde não são raros os relatos de tortura contra elas: “São questões que não podem ser ignoradas nem pelo Poder Judiciário, nem pelo Executivo, uma vez que todos ali estão sob custódia e a proteção do Estado, o qual detém responsabilidade pela integridade física e psicológica sobretudo dessas pessoas que reclamam e precisam de tratamento de saúde adequado, até porque determinado compulsoriamente”.

No último mês de fevereiro, o CNJ instituiu, por meio de resolução, a política antimanicominal do Judiciário, que regulamenta o tratamento dado a pessoas com transtorno mental ou qualquer forma de deficiência psicossocial — tanto presas quanto acusadas ou investigadas.

O documento traz diretrizes para a atuação da magistratura durante audiências de custódia envolvendo pessoas com indícios de transtorno mental, e estabelece, além dos cuidados médicos, o acompanhamento por uma equipe multidisciplinar, além de orientar o encaminhamento ao atendimento na Raps.

A resolução ainda determina que a internação seja implementada somente em hipóteses excepcionais, como insuficiência de outras alternativas e necessidade de uso como recurso terapêutico momentâneo ou para restabelecimento da saúde da pessoa. Nesses casos, o Judiciário deve garantir o cumprimento da medida em algum hospital geral ou outra unidade referencida pelos Centros de Atenção Psicossocial (Caps) — nunca em alguma unidade prisional ou instituição com características asilares.

A parceria entre CNJ e Ministério da Saúde também busca cumprir uma determinação da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH). Em 2006, o órgão ordenou que o Estado brasileiro desenvolvesse programas de formação e capacitação para médicos, psicólogos e enfermeiros baseados em princípios internacionais de tratamento de pessoas com transtornos mentais.

Fonte: ConJur