O procurador-geral argumenta que a LSN foi revogada pela Lei 14.197/2021. Foto: Roberto Jayme/Ascom/TSE.

O procurador-geral da República, Augusto Aras, enviou ao Supremo Tribunal Federal (STF) manifestações em que defende a perda de objeto de quatro Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs) que questionam a Lei de Segurança Nacional (Lei 7.170/1983).

Aras lembra que a norma foi revogada pela Lei 14.197, editada em 1º de setembro de 2021, e com entrada em vigor em prazo de 90 dias. Assim, as ADPFs estariam prejudicadas.

Segundo o PGR, efeitos residuais da norma revogada, a serem verificados nos 90 dias antes da entrada em vigor da nova regra (período conhecido como vacatio legis), devem ser apreciados nos casos concretos, em controle difuso de constitucionalidade, por meio das vias adequadas.

A Lei de Segurança Nacional é discutida nas ADPFs 797/DF, proposta pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB); 799/DF, de autoria do Partido Socialista Brasileiro (PSB); 816/DF, ajuizada pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), pelo Partido dos Trabalhadores (PT) e pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB); e 821/DF, do Cidadania.

As ações questionam diversos dispositivos da lei, sustentando que eles violariam o direito fundamental à liberdade de expressão, além de criminalizar manifestações políticas e críticas a autoridades, entre outros problemas. As ações defendem a não recepção da regra pela Constituição Federal de 1988.

Augusto Aras lembra que, em 1º de setembro deste ano, foi editada a Lei 14.197, que acrescentou o Título XII na Parte Especial do Código Penal, definindo crimes contra o Estado Democrático de Direito. A norma revoga expressamente a íntegra da Lei de Segurança Nacional.

“Ainda que a entrada em vigor da Lei 14.197/2021 dependa do transcurso da vacatio legis de 90 dias, tal circunstância não é relevante em relação ao campo da validade das leis, uma vez que a sucessão de leis no tempo, para efeito de controle abstrato de constitucionalidade, é aferida pela data da promulgação da lei e não da sua entrada em vigor”, explica.

O PGR salienta que o prazo para entrada em vigor de uma nova lei tem o objetivo de proteger o cidadão de mudanças bruscas no sistema jurídico, garantindo a necessária adaptação à nova ordem.

“Assim, embora no período entre a publicação da lei e o término da vacatio legis as relações jurídicas fiquem sujeitas à disciplina da lei anterior, não há como negar validade à lei nova e, por conseguinte, não há como deixar de reconhecer que, para efeito de controle abstrato de constitucionalidade, a lei anterior foi ab-rogada desde a data da publicação da lei superveniente”, cita.

Assim, as ADPFs estariam prejudicadas por perda de objeto. O procurador-geral da República afirma também que o STF já decidiu que uma norma pode ser revogada por lei posterior mesmo antes do transcurso do prazo de vacatio legis.

Augusto Aras afirma ainda que a Lei de Segurança Nacional esteve em vigor por 38 anos e jamais foi objeto de impugnação em controle abstrato de constitucionalidade. Segundo ele, não se justificaria analisar as ADPFs neste momento em que a norma já está revogada. De acordo com o PGR, qualquer efeito da Lei de Segurança Nacional verificado neste prazo de 90 dias deve ser analisado nas situações concretas, em controle difuso de constitucionalidade, sistema que permite que qualquer juiz ou colegiado decida, no caso específico e individual, pela compatibilidade da lei com a Constituição.

Interpretação

Na ADPF 821/DF, o Cidadania questiona ainda dois artigos do Código Penal: 138, que define o crime de calúnia; e 142, que trata das situações que não constituem injúria ou difamação punível.

A ação pede interpretação para reconhecer os tipos penais apenas se “atendidos requisitos da tipicidade e antijuridicidade materiais (e não meramente formais) e apenas relativamente a condutas que caracterizem crimes contra as instituições democráticas e proteção de minorias e grupos vulneráveis (por exemplo, a menção às discriminações racial, de classe social e por motivação religiosa)”.

Para Aras, esse pedido não deve ser conhecido. “Na técnica da interpretação conforme a Constituição, todas as possíveis normas (interpretações) emanam do texto da lei. Não é dado ao aplicador do direito, a pretexto de interpretar determinada lei conforme a Constituição Federal, dar-lhe sentido que não tem suporte na letra da lei”, explica.

Para o PGR, se atendida, a nova interpretação iria alterar o conteúdo da lei, o que não é permitido.

Com informações do MPF.