O procurador é ex-chefe da extinta “Lava Jato” de Curitiba. Foto: Wilson Dias/Agência Brasil.

O membro do Ministério Público deve ser, por excelência, imparcial. Assim, ao criticar diretamente agentes políticos, os procuradores podem passar para a população a impressão de que têm um “lado” e que, se fossem processar determinado agente, seriam especialmente rigorosos.

O entendimento é da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), em julgamento finalizado nesta quarta-feira (07). O colegiado negou um pedido feito pelo procurador Deltan Dallagnol, ex-chefe da extinta “Lava Jato” de Curitiba, para a anular a pena de censura que lhe foi imposta pelo Conselho Nacional do Ministério Público por criticas ao senador Renan Calheiros (MDB/AL).

O relator, ministro Nunes Marques, votou contra o requerimento de Deltan. Ele foi seguido por Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski.

Luiz Edson Fachin abriu divergência e foi seguido pela ministra Cármen Lúcia. Em julgamento virtual, a maioria da Turma já havia decido pela manutenção da punição contra Deltan desde o fim de março. Mas restava ainda o voto de Cármen Lúcia.

Antes das eleições para a presidência do Senado, que ocorreram em 2019, Deltan disse no Twitter que se Renan vencesse a disputa dificilmente a Brasil veria a aprovação de uma reforma contra a corrupção.

“[Renan] tem contra si várias investigações por corrupção e lavagem de dinheiro. Muitos senadores podem votar nele escondido, mas não tem coragem de votar na luz do dia”, afirmou o procurador na ocasião.

Para Nunes Marques, “a manifestação acima, se viesse de um cidadão não investido de autoridade pública ou do titular de um cargo eletivo, seria absolutamente compatível com a liberdade de expressão. Seria a opinião política do emissor, independentemente da procedência ou não do que afirmado”.

“Porém”, prossegue o ministro, quando “essa manifestação parte de uma autoridade que tem certas garantias e vedações constitucionais justamente para manter-se fora da arena política, então há um problema”. “O autor não emitiu uma opinião geral sobre política […] Ele emitiu opinião muito bem determinada, a respeito de uma eleição específica e contra um candidato claramente identificado.”

Nunes Marques também rejeitou a alegação da defesa de Deltan de que um processo semelhante contra ele já havia sido julgado e indeferido pela Corregedoria do Ministério Público Federal (CMPF). Para o procurador, a apreciação, pelo CNMP, de um caso já tratado pela CMPR, violaria a garantia de ne bis in idem, que impede que um mesmo caso seja julgado mais de uma vez.

“O Supremo já decidiu, em relação ao Conselho Nacional de Justiça, mas com motivos perfeitamente aplicáveis ao CNMP, que a competência correicional desse órgão é originária e concorrente à das corregedorias setoriais. Assim, eventual decisão da Corregedoria do Ministério Público Federal em nada afeta a competência até mesmo para rever a decisão da CMPF”, disse o ministro.

Divergência

Ao abrir divergência, Fachin disse que a Constituição de 1988 consagrou em diversos dispositivos as liberdades de expressão, pensamento e manifestação como garantias de todos. Também afirmou que a declaração de Deltan não comprometeu a dignidade do MPF.

“A apuração de violação funcional do dever de manutenção do decoro necessita que a manifestação do membro do Parquet , comprometa, de alguma forma, a dignidade da instituição que representa; entretanto, o mero exercício da liberdade de expressão, ainda que em tom ácido ou crítico, não tem esse condão, por si só”, disse.

Fonte: site ConJur.