Gilmar Mendes foi relator do pleito que julgou ADIs questionando a reforma trabalhista . Foto: Reprodução

A reparação de dano moral indireto ou “em ricochete” no âmbito das relações trabalhistas não exclui a possiblidade de o ofendido buscar indenização também no âmbito civil.

Além disso, é constitucional que se estipule valores de reparação extrapatrimonial acima dos limites impostos pela reforma trabalhista (Lei 13.467/2017), quando considerados os termos dos casos concretos e princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da igualdade.

Essa foi a tese aprovada, por maioria, pelo Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal (STF) em julgamento finalizado na noite da última sexta-feira (23), em pleito que analisava a constitucionalidade de artigos da Consolidação das Leis do Trabalho, alterados pela reforma trabalhista, que estipularam teto de reparação por danos decorrentes de relação de trabalho de acordo com a intensidade da ofensa (leve, média, grave e gravíssima).

Segundo o relator do caso, ministro Gilmar Mendes, não é inconstitucional que o cálculo estipulado pela norma seja utilizado pelos magistrados “para a quantificação” dos danos extrapatrimoniais nas relações de trabalho. O ministro, porém, votou pela parcial inconstitucionalidade dos trechos, uma vez que não pode existir limite a situações concretas em que os magistrados julguem pertinentes danos acima do estipulado.

“Repiso, porém, que tais critérios, em especial o valor-referência do salário, não podem ser utilizados como ‘teto’, sendo possível que o magistrado, diante das especificidades da situação concreta eventualmente, de forma fundamentada, ultrapasse os limites quantitativos previstos nos incisos I a IV do § 1º”, escreveu o ministro em seu voto.

“Embora assentada a incompatibilidade do sistema de tarifação legal da Reforma Trabalhista, porém, compreendo que a norma impugnada não deve ser julgada in totum inconstitucional com pronúncia de nulidade. Isso porque os parâmetros fixados no art. 223-G, tanto nos incisos I a XII do caput do dispositivo quanto no próprio § 1º, podem validamente servir de critérios, ainda que não exaurientes, para a definição do quantum da reparação extrapatrimonial pelo magistrado trabalhista”, afirmou Gilmar.

O julgamento analisou quatro ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs) que tratavam, em suma, do mesmo tema: os limites da indenização trabalhista imposto por lei aprovada em 2017 (reforma trabalhista), que configuram espécie de teto para o valor do dano. Pela normativa aprovada no governo Michel Temer (MDB), o dano, a depender de sua intensidade, poderia chegar até no máximo 50 salários do ofendido (levando em conta sua última remuneração).

As ações alegavam violação a artigos da Constituição que versam sobre a dignidade humana, os princípios da não discriminação e da igualdade de tratamento, além de normas referentes à reparação de dano e proteção do trabalhador.

A Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), uma das impetrantes, afirmou que  a lei não poderia limitar a atuação do Poder Judiciário em relação à estipulação de indenização por dano moral, tendo em vista que isso poderia limitar o próprio exercício da jurisdição. Um limite máximo para a base de cálculo para fins de reparação poderia resultar também em limitação ao direito de indenização.

A Advocacia-Geral da União (AGU) emitiu parecer pelo não conhecimento da ação, ou seja, contrário à possibilidade de declaração de inconstitucionalidade da norma.

Já Procuradoria-Geral da República (PGR) se posicionou pela inconstitucionalidade do limite estipulado pela reforma, argumentando que a tarifação legal prévia e abstrata de valores máximos para indenizações por danos extrapatrimonais afronta o princípio da reparação integral do dano moral, “caso a importância definida não seja suficiente para conferir ampla compensação, proporcionalmente ao agravo e à capacidade financeira do infrator, o que reduz o seu efeito pedagógico-punitivo”.

A PGR utilizou como exemplo o acordo firmado entre a mineradora Vale e o Ministério Público do Trabalho para reparação dos danos causados pelo crime ambiental de Brumadinho, quando a queda de uma barragem de minério de ferro matou centenas de trabalhadores e destruiu a fauna e a flora da região.

Segundo a Procuradoria, uma tarifação de valor máximo de indenização afronta o princípio de reparação integral do dano sempre que “nos casos concretos, esses valores não forem bastantes para conferir adequada compensação do prejuízo extrapatrimonial, ampla e proporcional ao agravo e à capacidade financeira do infrator”.

O voto do relator, ministro Gilmar Mendes, foi seguido por Nunes Marques (voto-vista), Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Luiz Fux, Roberto Barroso e André Medonça, restando vencidos os ministros Edson Fachin e Rosa Weber. Ambos votaram pela total inconstitucionalidade dos referidos artigos da CLT alterados pela reforma trabalhista, mas acabaram derrotados.

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Fonte: ConJur