Ministro do STF, ministro Luiz Fux. Foto: Fellipe Sampaio

O juiz das garantias presume, sem base empírica, a parcialidade do magistrado que atuou durante a investigação para julgar a ação penal. Dessa maneira, viola o princípio da proporcionalidade. Além disso, o mecanismo interfere na estrutura do Judiciário e sua criação só poderia ter sido proposta por esse poder.

Com esse entendimento, o ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux, relator do caso, concluiu nesta quarta-feira (28/6) seu voto pela inconstitucionalidade, por diversos aspectos, do juiz das garantias.

O julgamento foi interrompido por pedido de vista do ministro Dias Toffoli. A presidente da corte, ministra Rosa Weber, afirmou que colocará o caso na pauta de 9 de agosto.

Ao criar o mecanismo, a lei “anticrime” (Lei 13.964/2019) buscou reduzir o risco de parcialidade nos julgamentos. Com a medida, o juiz das garantias fica responsável pela fase investigatória e o juiz da instrução fica a cargo do andamento do processo e da sentença.

Entre as atribuições do juiz das garantias está decidir sobre o requerimento de prisão provisória ou outra medida cautelar e sobre a homologação de acordo de colaboração premiada. A competência do julgador acaba com o recebimento da denúncia ou queixa.

A partir desse momento, o juiz da instrução assume o caso e, em até dez dias, deve reexaminar a necessidade das medidas cautelares impostas pelo juiz das garantias. E o julgador que, na fase de investigação, praticar atos privativos da autoridade policial ou do Ministério Público ficará impedido de atuar no processo.

Em 22 de janeiro de 2020, um dia antes de a lei “anticrime” (que havia sido adiada por 180 dias pelo ministro Dias Toffoli) entrar em vigor, Fux suspendeu a implementação do juiz das garantias. Por mais de três anos, o magistrado não liberou a liminar para análise pelo Plenário – o que gerou críticas de outros ministros. No mês passado, o caso entrou na pauta do Supremo.

Na sessão do último dia 21, Fux começou a apresentar seu voto e argumentou que suspendeu a implementação do mecanismo por causa da falta de debates sobre o instituto e da impossibilidade de sua implementação em 30 dias, no meio do recesso judicial. No dia seguinte, o ministro afirmou que a criação do mecanismo violou o pacto federativo e o princípio da proporcionalidade.

Presunção inválida

Nesta quarta, Fux argumentou que a presunção de parcialidade do juiz que atuou na investigação para proferir a sentença não tem fundamento. Segundo ele, os julgadores não decidem com o objetivo único de confirmar seus despachos anteriores. Eles chegam a uma conclusão com base na análise das provas do processo, destacou o relator.

“Ao impor a regra de impedimento (do juiz que atuou na investigação para proferir a sentença) sem quaisquer outras considerações concretas, constituiu-se excesso normativo, sacrificando outros direitos fundamentais”, opinou Fux.

O relator também criticou as citações de modelos de outros países descoladas do contexto geral desses sistemas de Justiça. E declarou ser uma “falácia” dizer que é possível instalar o juiz das garantias sem aumento de gastos.

Fux votou para declarar inconstitucionais ou promover interpretação conforme a Constituição a diversos dispositivos criados pela lei “anticrime”. O magistrado entendeu que os parágrafos 1º e 2º do artigo 3-B e o parágrafo 2º do artigo 3-C, ambos do Código de Processo Penal, não são razoáveis. Eles preveem a revogação de medidas cautelares, como prisões provisórias, se a investigação não for concluída ou os atos não forem revisados em determinado prazo. O ministro lembrou que o Supremo permite renovações sucessivas de interceptações telefônicas, desde que devidamente fundamentadas.

Durante a epidemia de Covid-19, as audiências de custódia por videoconferência foram fundamentais para assegurar os direitos dos presos em flagrante. Dessa forma, seria um retrocesso vedar a medida por meio virtual, avaliou Fux.

Além disso, configura censura, na visão do ministro, a proibição do juiz das garantias de fazer acordo com jornalistas para explorar a imagem da pessoa submetida à prisão. Conforme o ministro, cabe aos órgãos de imprensa decidir como noticiar os fatos. Se houver abusos, podem ser responsabilizados posteriormente.

Fonte: site Conjur