A tese foi proposta pelo relator da ação, ministro Nunes Marques. Foto: Reprodução

“É inconstitucional o dispositivo de Constituição estadual que permite a transposição, absorção ou aproveitamento de empregado público no quadro estatutário da administração pública estadual sem prévia aprovação em concurso público, nos termos do artigo 37, II, da Constituição Federal.”

Essa foi a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal para declarar inconstitucionais o artigo 65-A da Constituição estadual, a lei 2.281/2017 e o decreto 286/2018 do Amapá. Os termos previam que, em caso de extinção, fusão, incorporação ou transferência de propriedade para iniciativa privada ou para a União de empresa pública constituída na época do extinto território do Amapá, o empregado que tenha ingressado por concurso público em determinadas pessoas jurídicas poderia optar por ser aproveitado no quadro de pessoal da administração pública estadual.

A tese foi proposta pelo relator da ação, ministro Nunes Marques. Todos os ministros seguiram o voto do relator. O ministro Dias Toffoli divergiu apenas quanto à modulação dos efeitos. O julgamento, com repercussão geral, aconteceu em sessão do Plenário Virtual encerrada nesta última quarta-feira (12/4).

A Corte analisou um recurso do governo amapaense que alegava que o aproveitamento de empregados da Companhia de Eletricidade do Amapá (CEA) em cargos efetivos e estatutários afronta a regra da Constituição Federal que veda a investidura de servidor sem a aprovação em concurso público (artigo 37, inciso II). Também sustentava que a transposição é impossível mesmo que os funcionários sejam concursados, por ausência de compatibilidade entre o cargo que ocupam atualmente e qualquer cargo disponível na administração direta.

O governo local apontou, ainda, violação da Súmula Vinculante 43 do STF, que considera inconstitucional toda modalidade de provimento que propicie a investidura de servidor, sem prévia aprovação em concurso público destinado ao seu provimento, em cargo que não integra a carreira na qual anteriormente investido.

A CEA foi privatizada em junho de 2021 em leilão vencido pela Equatorial Participações e Investimentos, conduzida pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) com a participação dos ministérios de Minas e Energia e da Economia.

Empregados da companhia questionavam o decreto estadual 286/2018 baseado no artigo 65-A da Constituição amapaense. Eles pretendiam ver garantido que a transposição para o quadro de pessoal do governo local ocorresse quando presentes os motivos previstos na Constituição estadual, com força do artigo 65-A. O Tribunal de Justiça do Amapá (TJ-AP) havia reconhecido o direito dos funcionários da companhia de optarem por ingressar nos quadros funcionais do estado.

No voto, Nunes Marques ponderou que, até hoje, o governo local não oficializou a extinção, fusão, incorporação ou transferência da propriedade da CEA, seja para a iniciativa privada ou para a União. “Isto é, o fato gerador para a transposição dos empregados da empresa ao quadro de servidores estaduais ainda não ocorreu”, destacou.

Além disso, o ministro destacou que a carreira não existe no quadro de servidores públicos da administração direta do Amapá. “Sendo assim, é impossível absorvê-la.”

O ministro lembrou que a Constituição Federal estabelece que a posse em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, ressalvados os cargos em comissão. “Tal exigência encontra fundamento no postulado da isonomia de acesso a cargos públicos e na concretização dos princípios da moralidade administrativa e da impessoalidade”, afirmou.

Nunes Marques pontuou que a jurisprudência do STF é firme no sentido de ser necessária a observância da prévia aprovação em concurso público tanto no provimento originário quanto no derivado. “A transposição, a absorção ou o aproveitamento de servidores em outros órgãos ou entidades da Administração direta, autárquica e fundacional do mesmo Estado são figuras vedadas pela ordem constitucional vigente, por ofensa ao princípio do concurso público.”

Divergência

Apesar de acompanhar o relator quanto à fixação da tese de repercussão, o ministro Dias Toffoli apresentou divergência parcial para propor a modulação dos efeitos do acórdão. No voto vencido, o ministro sugeriu manter a validade do aproveitamento dos empregados públicos da CEA para o quadro de pessoal da administração pública do estado que exerceram o direito de opção até a data prevista pelo artigo 8 do decreto 286/2018, que era 28 de março de 2018.

“Com a privatização da empresa, os servidores optantes pela transposição do cargo, com esteio na boa-fé objetiva e amparados pela legislação vigente, não podem retornar ao status anterior, qual seja, a sua condição de empregados públicos, o que lhes causaria danos irremediáveis, os quais devem ser evitados por meio da modulação dos efeitos deste acórdão, mantendo-se a validade da opção pelo aproveitamento em relação àqueles que exerceram seu direito no prazo previsto no aludido decreto.”

Além disso, propôs que, na linha da jurisprudência do STF, ressalvar os servidores que já se aposentaram e aqueles que já tenham reunido as condições para a aposentadoria na data da publicação da ata do acórdão.

Fonte: site Conjur