Sergio Moro foi substituído por Gabriela Hardt na 13ª Vara Federal de Curitiba, onde tramitavam os processos da “Lava Jato”, ao final de 2018, quando ele pediu exoneração do cargo de juiz para assumir o Ministério da Justiça e Segurança Pública no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro. Foto: Reprodução

A juíza Gabriela Hardt, em atuação como substituta na 9ª Vara Federal de Curitiba, baseou-se no relato de um delator e em mensagens codificadas de celular para decretar a prisão provisória de 11 investigados por um suposto plano para sequestrar o senador Sergio Moro (União Brasil-PR).

Os mandados de prisão e de busca e apreensão foram cumpridos pela Polícia Federal na última quarta-feira (22).

Ao todo, foram expedidos 24 mandados de busca e apreensão, sete mandados de prisão preventiva e quatro de prisão temporária nos estados de São Paulo, Paraná, Mato Grosso do Sul e Rondônia. Os suspeitos são apontados como membros da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC).

A apuração teve origem no depoimento de uma testemunha protegida. Ela contou que já tinha integrado o PCC e procurou o Ministério Público de São Paulo após ter sido jurada de morte pela facção. Segundo o delator, quem estaria incumbido de matá-lo seria Janeferson Aparecido Mariano Gomes.

Indagada a respeito de outros planos de Gomes, a testemunha disse que recentemente tinha ficado sabendo que ele estaria planejando atentados contra autoridades. E mencionou que, entre os alvos, estaria Sergio Moro.

O delator contou que seu informante lhe disse que Gomes estaria encarregado da tarefa de levantar informações e sequestrar o senador, mas não soube especificar que atos criminosos seriam feitos posteriormente.

Além disso, a testemunha entregou ao MP-SP quatro números de telefones, que seriam de contatos de pessoas próximas a Gomes. Com a quebra de sigilo, a Polícia Federal obteve, em e-mails, imagens que apontariam a existência de um plano para sequestrar Moro.

Em um print da tela do celular de Janeferson Gomes, ele pede a Aline Paixão, que seria sua companheira, para salvar certos códigos. “Tokio” seria o código para Moro. “Flamengo“, para sequestro, e “Fluminense“, para ação. Em outras mensagens, supostos integrantes do PCC discutiriam valores e medidas para executar um plano contra “Tokio”. As conversas também demonstrariam que o grupo alugou imóveis em Curitiba, onde Moro tem casa.

Para Gabriela Hardt, o suposto plano se deve à atuação de Sergio Moro como juiz e como ministro da Justiça. Como julgador, ele “alçou notoriedade pelo combate ao crime organizado à frente da ‘lava jato'”, declarou a julgadora.

Já como ministro da Justiça, editou a Portaria 157/2019 e foi autor do anteprojeto que culminou na Lei “anticrime” (Lei 13.964/2019), restringindo as visitas em presídios federais ao parlatório e à videoconferência. Conforme Hardt, as normas criaram “grande dificuldade aos líderes de grupos criminosos para comandar seus negócios ilícitos de dentro da prisão”.

Porém, as medidas já estavam em vigor havia dois anos, quando foi editada a Portaria 718/2017 pelo então ministro da Justiça, Torquato Jardim. A norma vedou visitas íntimas em penitenciárias federais para líderes de organizações criminosas, custodiados submetidos ao regime disciplinar diferenciado e detentos envolvidos em episódios de fuga, violência ou indisciplina. Por outro lado, a norma permitiu que delatores premiados tivessem um contato íntimo por mês com pessoas de fora do cárcere.

Hardt também disse que a recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de negar ação contra a restrição a visitas a presos federais “certamente acirrará os ânimos das facções criminosas contra o Estado”.

“Desse modo, é possível aventar que um atentado contra a integridade do senador Sergio Moro está sendo preparado pelo Primeiro Comando da Capital (PCC) a fim de demonstrar poder e causar temor ao Estado, como forma de supostamente diminuir a alegada opressão sofrida pela facção dentro do sistema prisional federal”, opinou a juíza.

Questionamentos de promotor

A Polícia Federal sustenta que o PCC tinha um plano para resgatar o líder da facção, Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola. Ele está encarcerado na Penitenciária Federal de Brasília.

Em 2019, Marcola foi transferido de uma prisão paulista para a Penitenciária Federal de Brasília. À época ministro da Justiça, Sergio Moro buscou receber crédito pela medida. Há quem diga que o PCC se indispôs contra Moro por causa do episódio.

O promotor do MP-SP Lincoln Gakiya, que também seria alvo do PCC, rebate o argumento. Em entrevista publicada há um ano pela revista eletrônica Consultor Jurídico, ele disse que a transferência de Marcola foi pedida pelo MP paulista e autorizada pela Justiça, sem nenhuma participação de Moro.

“É uma inverdade (o plano de ação do então ministro da Justiça e da Segurança do governo Bolosonaro para transferência de líderes do PCC). Elaborei, planejei e fiz o pedido ainda durante o governo de (Márcio) França, em 2018. E quem deferiu a ordem foi um juiz estadual. Não o Governo Federal. O juiz federal que recebe esse preso nem pode analisar o mérito do pedido. Só analisa se o pedido está formalmente em ordem. Não houve nenhuma participação seja do Governo Federal, seja do ex-ministro Moro, do presidente Bolsonaro ou de qualquer outra pessoa. Foi feito por mim, por conta e risco. Ao Governo Federal bastava apenas cumprir”, disse o promotor.

Substituta de Moro

Gabriela Hardt substituiu Sergio Moro na 13ª Vara Federal de Curitiba, onde tramitavam os processos da “Lava Jato“, ao final de 2018, quando ele pediu exoneração do cargo de juiz para assumir o Ministério da Justiça e Segurança Pública no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro. Ela permaneceu como titular até abril do ano seguinte. Atualmente, é de novo substituta na 13ª Vara.

Foi a juíza quem condenou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à prisão, em fevereiro de 2019, no caso do sítio de Atibaia (SP). À época, ela copiou trechos da sentença do caso do tríplex do Guarujá (SP), na qual Moro também havia condenado Lula. Ambas foram, mais tarde, anuladas pelo STF.

Fonte: ConJur