Constituição do Ceará completa próximo dia 5 de outubro 31 anos. Foto: Moacir Ximenes/Divulgação.

Em julho de 2003, o então deputado estadual Sérgio Benevides, após responder um demorado processo disciplinar, acusado que era de desviar recursos da merenda escolar da Prefeitura de Fortaleza, na gestão do prefeito Juraci Magalhães, foi absolvido pela maioria dos seus colegas, ao fim de uma sessão secreta, cercada de expectativas por conta do escândalo que sensibilizou uma boa parte da população cearense. Houve uma grande revolta de setores da sociedade e, estimulados pelo próprio presidente da Casa, na época, Marcos Cals, um grupo de parlamentares recorreu ao Tribunal de Justiça do Ceará, pedindo a anulação da sessão sob a alegação de violação às constituições Federal e Estadual, assim como ao próprio Regimento do Poder Legislativo.

O Tribunal de Justiça julgou o processo em tempo razoável, em setembro de 2003, e anulou a sessão. A desembargadora de então, Huguet Braquehais, foi a relatora e reconheceu que o Art. 138 do Regimento Interno da Assembleia feria a Constituição Estadual, no seu Art. 48, e também a Constituição Federal, no artigo 55. Assim, houve uma outra sessão, em 2004, e Sérgio Benevides teve o seu mandato cassado, motivando até um registro irônico do seu advogado, Waldir Xavier, ao ressaltar que seu cliente, num mesmo processo e pelos mesmos juízes (os deputados) foi absolvido e condenado. Em 2006, três anos depois, uma Resolução da Assembleia alterou, parcialmente, aquele dispositivo regimental, agora também questionado, não judicialmente, no caso da suspensão por 30 dias do mandato do deputado André Fernandes.

Há mais de um ano foi instituída uma Comissão Especial para atualizar o Regimento Interno da Assembleia. O trabalho está muito lento, embora não requeira tanta expertise dos parlamentares e dos assessores designados para a missão. Uma adaptação aos regimentos do Senado e da Câmara Federal, com a inclusão de algumas peculiaridades inerentes ao Parlamento estadual, não deveria demorar tanto tempo para a conclusão da obra. A consultoria dada pelos técnicos do Congresso Nacional, ainda no ano passado, deveria ter sido suficiente para a elucidação de qualquer dúvida da equipe. O Regimento do Legislativo cearense, como os dos demais legislativos estaduais brasileiros, não pode diferir muito dos congêneres federais, pois todos devem a mesma obediência aos ditames da Carta Federal.

É importante ter a Assembleia do Ceará um Regimento Interno moderno, claro, bem explicitado para que cada um dos seus deputados possa exercer o mandato respeitando-o. Mas, mais importante ainda para esses mesmos parlamentares, e, principalmente para o Estado do Ceará, é a atualização da nossa Constituição, recentemente atacada no Supremo Tribunal Federal em dois dos seus dispositivos. No primeiro, que trata da criação de uma aposentadoria especial para conselheiros em disponibilidade do extinto Tribunal de Contas dos Municípios, já saiu uma decisão liminar suspendendo os seus efeitos. O outro é relacionado ao número de assinaturas dos deputados para instalação de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI). Esses são questionamentos bem recentes. Existem outras Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) contra a Constituição do Ceará.

As duas últimas ADIs foram propostas pelo partido Solidariedade e pela Procuradoria Geral da República. A alegação do procurador-geral, Augusto Aras, contestando o dispositivo que exige a assinatura de apenas 12 deputados para a efetivação de um pedido de instalação de CPI na Assembleia Legislativa cearense, é de que ele fere a Constituição Federal, pois deveria exigir assinaturas de apenas um terço da composição da Assembleia, no caso 15 parlamentares (a Assembleia tem 46 deputados). A intenção dos cearenses em reduzir o número de assinaturas para instalar uma CPI é até louvável, beneficiava a bancada de oposição, quase sempre muito pequena. Mas é flagrante a inconstitucionalidade do dispositivo.

A Constituição do Ceará não deve continuar capenga. Para uma solução definitiva contra esses atropelos, a Assembleia deveria garantir meios à sua Comissão permanente de Constituição e Justiça, para, anualmente, apresentar projeto de Emenda à Constituição deixando-a sempre em simetria com a Carta Federal.

Veja o comentário do jornalista Edison Silva sobre os questionamentos a artigos da Constituição Estadual e do Regimento Interno da Assembleia Legislativa: