O ministro Gilmar Mendes defende mudança no Marco Civil da Internet / Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF

O ministro Gilmar Mendes, decano do Supremo Tribunal Federal (STF), entende que a recente decisão da corte que admitiu a possibilidade de veículos de imprensa serem responsabilizados por declarações de entrevistados é uma maneira de dar ao jornalismo maior responsabilidade, mas “sem abuso” por parte do tribunal.

Conforme o magistrado, os tempos atuais, de fake news turbinadas pela inteligência artificial, exigem mais rigor de quem produz conteúdo jornalístico, e foi esse o espírito que conduziu os ministros da Suprema Corte a tomar a controversa decisão, que muitos especialistas no tema acreditam que pode levar a abusos e à autocensura.

Em entrevista ao programa É Notícia, da Rede TV!, apresentado pelo jornalista Kennedy Alencar, Gilmar falou sobre esse assunto e também sobre outros que estão na ordem do dia. O decano tratou da responsabilização das plataformas de redes sociais pelo conteúdo que publicam; do projeto de lei aprovado no Senado que limita decisões monocráticas da corte; da indicação de Flávio Dino para o STF e de Paulo Gonet para a Procuradoria-Geral da República; e dos estragos causados pela “lava jato”.

Leia a seguir as principais declarações do ministro na entrevista:

A decisão do Supremo sobre a imprensa
“Eu acho que a decisão do tribunal é importante no que diz respeito a essa mudança que ocorreu, qualitativa, no contexto das redes sociais. Hoje ocorre aquilo que os mais jovens chamam de lacração, algo que sai no jornal ou na imprensa em geral e, em seguida, sai na mídia social. Então, é claro que isso tem de ser devidamente temperado, mas o espírito que moveu o tribunal foi o de responsabilizar sem abuso, responsabilizar por falta grave no serviço”.

Responsabilização das plataformas
“O artigo 19 do Marco Civil da Internet (que trata exatamente da responsabilização das plataformas de redes sociais pelo conteúdo que publicam) cumpriu uma função, que era valorizar o espaço livre na rede, a ideia de não criar uma censura imediata. Mas agora nós temos de pensar um pouco na vida como ela é”.

A PEC do Senado sobre as decisões monocráticas
“Isso me parece que é uma reação não adequada e não correspondente ao papel que o tribunal teve, escolheu-se um momento muito delicado. O debate vai para além do conteúdo da PEC, vai para um certo simbolismo. Eu disse até na minha fala lá no Plenário, será que o grande problema do Brasil é o Supremo Tribunal Federal? Será que é o Supremo que é a grande ameaça à democracia? Eu poderia sugerir vários itens de reformas talvez mais urgentes. A questão do papel dos militares que ocupam todos os cargos ou a inelegibilidade deles, o papel que eles tiveram nessa crise, o grande problema das PMs politizadas, que leva à insegurança pública e por isso exige-se uma GLO. Ou o tema da segurança pública, o Rio de Janeiro com 50% do seu território ocupado por milícias e narcotraficantes”.

Flávio Dino
“Eu tenho uma excelente expectativa e, claramente, quando se viu a perspectiva de sua indicação, eu a saudei efusivamente porque, de fato, é uma pessoa qualificada no ramo jurídico, foi juiz federal, foi primeiro lugar no seu concurso, teve prática jurídica, convivemos na gestão do (Nelson) Jobim no Supremo Tribunal Federal, na criação do CNJ. Então, depois ele faz a opção difícil de deixar a magistratura e ir para a política, disputa o cargo de deputado federal e depois governador, dois mandatos, também tem experiência, e agora ministro da Justiça. Tem uma visão, portanto, de todo esse complexo arcabouço jurídico e político, e da vida política como ela é”.

Paulo Gonet
“Eu também tenho essa justa expectativa em relação ao Paulo Gonet. Por tudo o que ele representa, por sua atuação, por suas obras e publicações. Ele é, de fato, um jurista de escol. Todo mundo no Supremo o reconhece. Os seus textos são primorosos. Ele é muito cuidadoso, nós vimos nos pareceres que ele deu agora como vice-procurador geral eleitoral”.

‘Lava jato’
“Eu me pergunto sempre, como gente tão chinfrim conseguiu fazer um desastre tão grande? E falava-se: ‘Não, vocês têm de decidir desta maneira’, ou as tais dez medidas de Curitiba, a tal República de Curitiba, e coisas do tipo. Veja, vamos mencionar devidamente: dois ou três procuradores, mais o Moro, fazendo regras que deveriam ser incorporadas à Constituição e às leis do país, esse era o catálogo de Curitiba. Veja, o país é muito maior do que isso, não é? Então, a mim me parece que houve uma falha grave e isso, de alguma forma, eu já até disse, a República de Curitiba pariu Bolsonaro, enquanto ela criminalizou toda a política. E aí faltou ao sistema político essa reação que, ocasionalmente, nós temos na tradição da política brasileira, esse clube seleto de cardeais que mudam os rumos das coisas”.

Fonte: Consultor Jurídico