Segundo Bolsonaro e sua coligação, ao utilizar as palavras-chave “Lula condenação”, “Lula Triplex” e “Lula corrupção PT”, entre outras, encontraram no Google uma página repleta de anúncios pagos pela coligação Brasil da Esperança / Imagem: Reprodução Internet

Na sessão desta quinta-feira (19), o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) julgou improcedente a ação (Aije 0601312-84) que pedia a inelegibilidade dos então candidatos a presidente e vice-presidente da República nas Eleições de 2022, Luiz Inácio Lula da Silva e Geraldo Alckmin. Na ação, Jair Bolsonaro e a coligação Pelo Bem do Brasil acusavam ambos de abuso de poder econômico e uso indevido dos meios de comunicação por suposto impulsionamento irregular de propaganda eleitoral e desinformação durante a campanha. A decisão teve como base o voto do relator, ministro Benedito Gonçalves, corregedor-geral da Justiça Eleitoral.

Na ação, os autores afirmaram que Lula e Alckmin utilizaram recursos financeiros para a realização de impulsionamento ilícito de propaganda eleitoral, consistente no uso da ferramenta Google Ads para divulgar anúncios pagos que buscavam encobrir e dissimular a verdade dos fatos.

Segundo Bolsonaro e sua coligação, ao utilizar as palavras-chave “Lula condenação”, “Lula Triplex” e “Lula corrupção PT”, entre outras, encontraram no Google uma página repleta de anúncios pagos pela coligação Brasil da Esperança. Sustentaram, ainda, que os acusados praticaram abuso de poder econômico e dos meios de comunicação, com base no artigo 22 da Lei de Inelegibilidade (Lei Complementar n° 64/1990).

Veja como votou cada ministro:

  • Benedito Gonçalves (relator)

Após votar por acolher a preliminar de ilegitimidade passiva da Coligação Brasil da Esperança no processo e, em relação a ela, julgar extinto o processo sem resolução de mérito, entre outros pontos, o ministro Benedito Gonçalves passou à análise do mérito e julgou improcedentes os pedidos da Aije em relação à Lula e Geraldo Alckmin.

No voto, Gonçalves citou que a jurisprudência do TSE tem se ocupado de conciliar o uso legítimo da contratação de impulsionamento com a circulação democrática de informações na internet. Ele apontou que precedentes da Corte indicam que a priorização paga de resultados pode ser usada para chamar a atenção do eleitorado, desde que: para conferir destaque positivo a determinada candidatura; por iniciativa de candidatas, candidatos, partidos, federações e coligações; e que o conteúdo seja identificado como anúncio pago.

O ministro apontou que a petição inicial não veio acompanhada de capturas de tela que mostrassem, sequer, que o anúncio produziu o efeito citado pela acusação. “Quanto aos resultados alcançados pelo anúncio, não se provou qualquer imposição à vontade das pessoas usuárias. O anúncio foi exibido na página de resultados aproximadamente 5 milhões e 200 mil vezes, mas foi efetivamente acessado 480 mil vezes, de forma voluntária. A chamada “taxa de cliques” foi, portanto, de pouco mais de 9%. Ou seja, em 91% das vezes em que o anúncio foi exibido, ele foi ignorado”, destacou o magistrado.

Segundo ele, quanto ao conteúdo oferecido, as alegações dos autores, no sentido de que o anúncio levava a site contendo “informações distorcidas”, não ultrapassaram o campo da opinião e da divergência política. “Não foi demonstrada a ocultação de páginas por conveniência eleitoral, bem como não foi demonstrado que o conteúdo de destino falseava a verdade e que a contratação do anúncio foi capaz de alterar o padrão de funcionamento do Google Ads. Fato é que os investigantes nunca estiveram próximos de comprovar a alegada manipulação do eleitorado”, afirmou o relator.

  • Raul Araújo

Ao votar em seguida, o ministro Raul Araújo ressaltou que, apesar de constar ilicitude da conduta, não constatou suficiente gravidade nela para causar desequilíbrio na disputa eleitoral. Além disso, ressaltou que, os aspectos mais graves da conduta foram descobertos após a instrução, mas não são referidos na petição inicial. “Assim, haveria prejuízo para defesa em caso de procedência da ação”, apontou.

Ao final do voto, Araújo destacou que essa conduta desinformadora merece ser regulada pela Justiça Eleitoral para que o produto citado no processo não esteja “à venda” com o objetivo eleitoral claramente desinformador.

  • Floriano de Azevedo Marques

O ministro Floriano de Azevedo Marques lembrou que o Tribunal já fixou, mais de uma vez, que o uso da ferramenta de impulsionamento de propaganda positiva – conteúdo que defende um candidato – é licito. “Dessa forma, não houve abuso de poder econômico”, afirmou. Além disso, destacou que, na sua análise, não vê como o conteúdo pode caracterizar desinformação. Para ele, é uma visão dos fatos, vista pelo ângulo do candidato investigado.

  • Ramos Tavares

No mesmo sentido, para o ministro André Ramos Tavares, não houve ocultação de informação na plataforma de busca e o impulsionamento citado não direcionou o tráfego dos usuários, tão pouco implicou e qualquer veiculação ou deturpação do direito à informação dos eleitores. “A taxa de cliques apresentada pelas informações do Google demonstram que não haveria gravidade necessária para classificar esse ato como abusivo”, disse.

  • Cármen Lúcia

Vice-presidente do TSE, a ministra Cármen Lúcia acompanhou o voto do ministro relator e fez algumas ressalvas durante o voto. “Estou acompanhando o voto do ministro relator na parte dispositiva, mas acho que não se pode deixar de ressaltar a gravidade deste quadro. É preciso ter atenção que isso pode, sim, gerar uma tal gravidade que importe em ilícito eleitoral grave e que é preciso um cuidado especial da Justiça Eleitoral”, explicou.

Segundo a ministra, na preliminar, o voto seria pelo afastamento da coligação, “porque acho que houve uma ilegitimidade bem caracterizada”, afirmou. “Eu não afasto que um cenário como este há de ter um cuidado em cada caso. Não vejo como se afirmar genericamente, como se pudesse ter um placebo jurídico que vale para tudo. Eu faço essas ressalvas para se evitar uma interpretação da nossa decisão”, concluiu, ao votar com o relator.

  • Nunes Marques

O ministro Nunes Marques afirmou que, na análise dele, as condutas descritas, principalmente na sustentação oral, não na inicial, eram verossímeis, foram constatadas nos autos e possuem uma relativa gravidade. No entanto, apontou que esses fatos mais graves só foram descobertos durante a instrução processual e não constaram da petição inicial, ocasionando que a parte adversa não teve oportunidade de se defender especificamente desses fatos.

Justificou ainda seu voto, destacando, primeiro, pela impossibilidade de inovação devido à questão dos fatos não terem constados da petição inicial da Aije e, segundo, em que pese a gravidade dos fatos, não há gravidade suficiente a gerar um desequilíbrio na eleição.

  • Alexandre de Moraes

Último a votar, o presidente da Corte Eleitoral, ministro Alexandre de Moraes, destacou que, no caso analisado, ao clicar na propaganda, o usuário foi encaminhado para conteúdo que apresentava versões positivas do próprio candidato e desmentidos de versões fraudulentas, conforme apontado pelo relator.

Moraes então ressaltou que o caso levantava uma questão a qual ele vem se debatendo há algum tempo que a Justiça Eleitoral deveria se debruçar: quando a eleitora ou o eleitor busca o conteúdo de um candidato, mas é direcionado, de forma ilícita, para uma página de candidato adversário. “Em termos econômicos, o Superior Tribunal da Justiça (STJ) já disse que esse impulsionamento, em termos de Direito do Consumidor, é ilegal. Se é ilegal para o Direito do Consumidor, muito mais para o Direito Eleitoral”, afirmou.

Argumentos da acusação

Durante a sustentação oral da acusação, o advogado Tarcísio Vieira de Carvalho Neto, apontou que houve manipulação dolosa monetizada do maior buscador de informações do mundo, que tem mais de 3 bilhões e 500 milhões de acessos diariamente. “Considerado pela doutrina especializada, não só em Direito Eleitoral, a plataforma de publicidade mais poderosa do mundo nos tempos atuais”, afirmou.

Ele defendeu que a prática de impulsionamento atenta contra todo o esforço que o TSE tem feito no protagonismo nacional no combate às fake news. “E fere, de morte, assim dizer, o princípio da autenticidade eleitoral. Portanto, com esse comportamento ilícito e imoral jurídico, os investigados atentaram contra a livre informação e contra a formação de opinião”, ressaltou.

Alegações da defesa

O advogado da defesa, Miguel Filipi Pimentel Novaes, iniciou a argumentação lembrando que, naquele momento, não seria possível apresentar novos fatos, como fez a acusação. “Sob pena de violação ao contraditório e a ampla defesa, não foi permitido aos investigados, em momento algum, se manifestar sobre esses novos documentos”, afirmou ele.

Sobre a acusação, o advogado enfatiza que não houve nenhuma perturbação do acesso à informação para o eleitor o fato da Coligação Brasil da Esperança ter impulsionado conteúdo na plataforma Google. Entre outros pontos, o advogado alegou que o funcionamento do sítio apenas conferiu destaque ao conteúdo, sem atrapalhar a busca e sem obrigar o usuário a consumir a informação.

Parecer da Procuradoria-Geral Eleitoral

O vice-procurador-geral eleitoral, Paulo Gonet Branco, leu parecer do órgão pela improcedência da ação. Ele destacou que houve conteúdo positivo divulgado pelo impulsionamento feito pelos acusados, não sendo esta uma conduta suficientemente grave para configurar abuso de poder econômico e uso indevido dos meios de comunicação. Gonet lembrou que o acesso a matérias de cunho diverso não foi cerceado pelos investigados.

Ao defender a improcedência da ação, o representante do Ministério Público Eleitoral (MP Eleitoral) argumentou que, além de ser ilegítima a inclusão da coligação Brasil da Esperança no polo passivo, o uso desta modalidade de propaganda eleitoral já havia sido permitido pelo Plenário em ocasião anterior.

“O TSE já afiançou a licitude da forma de propaganda impugnada, não havendo razão para que outro juízo seja adotado nesta oportunidade”, concluiu o vice-procurador-geral eleitoral.

Informações do TSE