Ministro participou de encontro com advogados em São Paulo. Foto: Reprodução/ Felipe Lampe/Iasp

O ministro André Mendonça do Supremo Tribunal Federal (STF) revelou na última segunda-feira (24) que vive um dilema por causa do julgamento das primeiras cem denúncias relativas aos atos golpistas de 8 de janeiro.

Destacando que o STF tem a tradição de defender as garantias relacionadas ao direito de defesa, ele diz se questionar quanto às cobranças que podem surgir sobre seu posicionamento na análise dos casos.

“Não necessariamente agora no ambiente da denúncia, mas em algum momento do julgamento dos casos, se eu aplico essa corrente mais garantista ou se eu entro em uma vertente que se concebe, teoricamente, como Direito Penal do inimigo… É um dilema porque eu serei cobrado para aplicar a Justiça. Quais contornos vão definir isso?”, indagou o ministro.

Outro ponto que preocupa Mendonça é o questionamento acerca da interpretação restritiva quanto ao foro por prerrogativa de função no Supremo. Isso porque a corte só julga quem comete crime como parlamentar federal (deputados e senadores) em casos em que a conduta criminosa está ligada ao exercício do mandato.

“Nenhuma dessas pessoas está nessas circunstâncias. Para mim, esse é um ponto que merece reflexão não apaixonada.”

 

As declarações do ministro foram feitas durante encontro com representantes e associados do Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp), na capital paulista.

Para André Mendonça, o julgamento das cem primeiras denúncias relativas aos atos golpistas deve analisar as situações fáticas daqueles que estão presos. Segundo o ministro, há dois grupos distintos: quem foi preso em flagrante durante os atos e aqueles que estavam concentrados no acampamento em frente ao Quartel-General do Exército, em Brasília.

“Nós temos dois grupos. São 50 denunciados por invadir os prédios públicos, os que foram presos em flagrante nos prédios do Planalto, Supremo, Congresso ou na Praça dos Três Poderes. O outro grupo é formado por pessoas que foram presas quando ainda estavam no acampamento em frente ao Exército. Temos um grupo que estava agindo com violência e outro que estava se manifestando acampado na área militar de Brasília. São situações fáticas. É muito mais simples definir a situação daqueles que foram presos em flagrante. A definição dos outros não necessariamente é tão simples”, explicou o ministro.

O julgamento

O Plenário do Supremo já formou maioria para receber as primeiras cem denúncias contra golpistas que participaram dos atos de 8 de janeiro. Até o momento, são oito votos a favor do recebimento das denúncias. Os ministros André Mendonça e Nunes Marques ainda não votaram. O julgamento, feito pelo Plenário Virtual, começou no dia 18 (quando o episódio completou cem dias) e terminará nesta segunda-feira (24).

As denúncias estão em dois inquéritos: 50 delas se referem a instigadores dos atos, que estiveram acampados em frente ao Quartel-General do Exército até o dia 9 de janeiro. As outras 50 dizem respeito a autores intelectuais e executores, que efetivamente praticaram os atos de vandalismo e destruição do patrimônio público.

No inquérito relativo aos bolsonaristas que incentivaram os ataques, as acusações são de associação criminosa e incitação pública à animosidade das Forças Armadas contra os poderes constitucionais.

Já no outro inquérito, as denúncias são pelos delitos de associação criminosa armada, abolição violenta do Estado democrático de Direito, golpe de Estado, deterioração de patrimônio tombado e dano qualificado pela violência e grave ameaça, com emprego de substância inflamável, contra o patrimônio da União e com considerável prejuízo para a vítima.

Fundamentação do relator

Para o ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, as denúncias expuseram “de forma clara e compreensível todos os requisitos exigidos”, descreveram detalhadamente as condutas e permitiram aos acusados a compreensão das acusações e o pleno exercício do direito de defesa. Ele ressaltou que a Constituição não permite a propagação de ideias contrárias ao Estado democrático de Direito, nem mesmo manifestações públicas que busquem sua ruptura.

De acordo com o magistrado, são inconstitucionais condutas que tenham o objetivo de controlar ou destruir “a força do pensamento crítico” e as instituições democráticas. Na sua visão, os atos de 8 de janeiro pleitearam “o arbítrio, a violência e a quebra dos princípios republicanos”.

O ministro descreveu as condutas dos denunciados como “gravíssimas” e entendeu que elas correspondiam aos preceitos primários estabelecidos no Código Penal, “ao menos nesta análise preliminar”.

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Inq 4.921

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Inq 4.922

Fonte: ConJur