População carente levaria mais de 30min para chegar a um hospital. Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil.

Um levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) revelou que 1,6 milhão de pessoas de baixa renda moram a uma distância maior do que 5 quilômetros de uma unidade de atendimento do Sistema Único de Saúde (SUS) capaz de receber pacientes que desenvolvam síndrome respiratória aguda grave (SRAG) – a manifestação mais severa de Covid-19.

Essa parcela da população está na faixa acima de 50 anos e pertence ao grupo dos 50% mais pobres. O número corresponde a 41% da população vulnerável em grandes centros urbanos.

O levantamento – realizado nas 20 maiores cidades do Brasil – mostra também que há cerca de 230 mil brasileiros que levariam mais de 30 minutos para chegar a um hospital em casos de emergência. Essas pessoas teriam dificuldade de acessar uma unidade de saúde capaz de fazer triagem ou encaminhar casos graves de Covid-19 para internação.

Para o técnico de planejamento e pesquisador da Diretoria de Estudos e Políticas Regionais, Urbanas e Ambientais (Dirur) do Ipea, Rafael Pereira, que coordenou o estudo, essas duas análises trazem informações que podem ser úteis às prefeituras, já que apontam no mapa os bairros dessas cidades onde as pessoas têm maior dificuldade de acessar o SUS. “Esses são os bairros que, de maneira mais prioritária, as prefeituras podem se concentrar em ações para fornecer atendimento pré-hospitalar, por exemplo, com serviços de ambulância ou mesmo com equipes de agentes comunitários de saúde para fazer o atendimento domiciliar”, sugeriu.

Pereira apontou ainda que a pesquisa também pode orientar os locais para a construção de hospitais de campanha, para aumentar, de maneira mais eficaz, a capilaridade e o alcance da rede de saúde.

Segundo o pesquisador, nessa faixa de renda as pessoas são muito mais dependentes do SUS e, dificilmente, podem utilizar o sistema de saúde privado. “Em geral, as pessoas de baixa renda moram em regiões mais afastadas, com menos oferta dos serviços de transporte e de saúde. Vários estudos no Brasil e no exterior têm mostrado que, para pessoas acima de 50 anos, a manifestação do novo coronavírus tende a ser mais agressiva e a piorar para uma infecção mais grave”, afirmou.

Periferia

O estudo indicou desigualdades no atendimento de saúde em todas as 20 maiores cidades do Brasil. A região central das grandes capitais registra o maior número de hospitais, com mais oferta de leitos de tratamento intensivo e respiradores mecânicos, do que as regiões de periferia, onde há mais dificuldade de acesso ao sistema de saúde. “As populações de periferia que mais dependem do SUS e são mais vulneráveis de contágio de covid-19, onde se tem a pior condição de urbanização, de saneamento básico, são as que infelizmente têm a pior condição de saúde”, apontou Pereira.

Leitos por habitantes

Rafael Pereira informou que a terceira análise do projeto leva em consideração a disponibilidade de leitos e respiradores por habitantes. O coordenador informou que, na média para as 20 cidades analisadas, o SUS dispõe de 1,1 leito de UTI adulto com respirador para cada 10 mil habitantes – número que está próximo do que é indicado pelo Ministério da Saúde.

No entanto, essa quantidade é recomendada em situação de normalidade, não para cenários em que casos de internação ou de problemas de respiração crescem em alta velocidade. “A gente não está em situação de normalidade. Então, aquela disponibilidade de 1,1 leito para cada 10 mil habitantes, muito provavelmente, não vai dar conta do estrangulamento que a gente vai enfrentar nas próximas semanas. Em alguns estados a gente já está passando por isso. Manaus, no Amazonas, já está em situação crítica”, disse Rafael Pereira.

O pesquisador informou ainda que o levantamento de leitos por habitantes, em geral, analisa municípios como um todo. A pesquisa, no entanto, foi além, e considerou o número de hospitais dentro do município para avaliar a demanda em cada região da cidade. Essa metodologia indicou grande desigualdade não apenas entre os municípios, mas nas cidades localizadas neles.

Rafael Pereira citou Belo Horizonte e Goiânia, que têm 2,8 leitos de UTI para cada 10 mil habitantes. Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, obteve o pior resultado: 0,3 leitos para cada 10 mil pessoas. “A gente tem uma grande variedade de situações de municípios, como Caxias, que estão em situação grave. Há outros em situação mais confortável, mas a gente não sabe se isso vai ser suficiente. Mesmo em Belo Horizonte, que tem um bom número de leitos por habitantes, haverá um estrangulamento nas próximas semanas”, observou.

Fonte: Agência Brasil.