Lewandowski esteve na Assembleia Legislativa do Ceará nesta sexta-feira. Foto: Junior Pio/ALECE

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Enrique Ricardo Lewandowski, esteve em Fortaleza, na manhã desta sexta-feira (4), para participar do I Seminário de Direito Constitucional da Assembleia Legislativa, evento que celebra os 30 anos da Constituição do Estado do Ceará, promulgada em 1989. Antes de entrar no auditório Murlio Aguiar, local do evento, ele concedeu entrevista coletiva.

Mesmo tento alertado, via assessoria de comunicação da Assembleia Legislativa, que não falaria sobre a Operação Lava-Jato, após algumas perguntas de jornalistas, porém, Lewandowski trouxe seu posicionamento sobre a questão do réu delatado e do réu delator, a partir da decisão que o Supremo já se manifestou esta semana. “Na medida em que não se dá a oportunidade do delatado falar depois do delator, está se ferindo um valor muito importante da Constituição, que é o direito à ampla defesa e ao contraditório. Portanto, quando isso não ocorre no processo, se está diante de uma nulidade absoluta, então o processo precisa retroceder até o momento em que não se deu essa oportunidade e recomeçar o processo”, afirmou.

Para ele, não há como diferenciar casos de acordo com os processos. “É um vício insanável, ao meu ver, que independe inclusive de prova do prejuízo, até porque a condenação é um prejuízo evidente. Penso também que não é possível tratar de forma diferenciada dois réus que estejam em uma mesma situação, ou em um mesmo processo. Suponhamos que um réu tenha recorrido desde o primeiro momento em que lhe foi negado esse direito, e um outro, por alguma razão, não alegou. O próprio Código de Processo Penal, no artigo 580, determina que se dê idêntico tratamento para réus que estão na mesma situação”, concluiu.

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Entenda o caso

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, no último dia 2 de outubro, pela aprovação de uma tese sobre a extensão da decisão que reconhece o direito de delatados a falar por último em processos criminais. O resultado do julgamento que reconheceu o direito dos delatados pode anular várias condenações oriundas das investigações da Operação Lava Jato, segundo avaliação da força-tarefa de procuradores que atuam na operação.

Por 7 a 4, os ministros da Corte decidiram que advogados de delatados podem apresentar as alegações finais, última fase antes da sentença, após a manifestação da defesa dos delatores. Diante da possibilidade de o entendimento anular centenas de condenações em todo o país, o STF limitou os efeitos de sua decisão.

STF na vanguarda

Lewandowski concedeu entrevista coletiva ao lado do I secretário da Assembleia, deputado Evandro Leitão, que interrompeu a entrevista quando as perguntas passaram a tratar da Operação Lava-Jato. Foto: Júnior Pio/ALECE

Lewandowski tratou ainda de diversos outros temas no papo com os jornalistas, que durou cerca de nove minutos. Para ele, o STF tem um papel de vanguarda, preenchendo lacunas no que diz respeito à legislação. “Nós temos uma Constituição que é principiológica, que possui muitos princípios, normas gerais e abstratas, e que muitas vezes permitem que o STF, em especial, com seu papel de guardião da Constituições de defensor dos direitos fundamentais, ele avance, dê determinados passos que, em seguida, como eu disse, serão complementados ou concretizados pelo Poder Legislativo. Não há nenhum protagonismo excepcional, o que existe é uma atuação do STF absolutamente dentro dos limites da própria Constituição”, disse.

Lewandowski deixou claro, no entanto, que não vê conflito entre os poderes. “Na verdade, há um diálogo entre os poderes. Nós comemoramos mais de 30 anos do advento da Constituição Federal, e agora das Constituições estaduais, e o que nós verificamos é que a mudança social é extremamente dinâmica e, muitas vezes, o processo legislativo não dá conta de regulamentar ou disciplinar estas mudanças. Então, o Poder Judiciário, nos seus vários níveis, ele disciplina provisoriamente uma determinada situação e, depois, o Poder Legislativo vem, com mais cuidado e com mais verticalidade, regulamentando e disciplinando definitivamente essas situações”, explicou.

Discurso anti-instituições

Para o ministro, discursos anti-instituições, crescentes hoje no país, seguem sendo opiniões minoritárias. “Nós temos um dos períodos mais prolongados no Brasil de estabilidade institucional. Nós passamos por várias crises, uma crise econômica mundial que se projeta desde 2008, nós tivemos um processo de impeachment, nós tivemos uma intervenção federal no RJ, e as instituições resistiram. Várias eleições, em todos os nível da Federação, o país marcha tranquilamente, embora existam manifestações absolutamente minoritárias, as instituições estão firmes e nós haveremos, certamente, de manter essa situação por muitos e muitos anos”, opinou.

Politização do Supremo

O ministro comentou ainda acerca de críticas de que há uma politização nas decisões do Supremo. Para ele, a Constituição é, antes de mais nada, um instrumento político. “O STF tem a grande missão, dentre outras, de guardar, manter a estabilidade das instituições republicanas. Portanto, é uma atuação política. Nós estamos na cúpula, digamos assim, da estrutura de poder do estado brasileiro, nós ombreamos – o STF – com o Poder Executivo e o Poder Legislativo Federal, portanto nossas decisões são, no sentido amplo da palavra, sem dúvida nenhuma políticas”, explicou.

Declarações de Janot

Sobre as declarações de Rodrigo Janot, ex-PGR, o ministro tratou como algo isolado. “As declarações do ex-Procurador Geral da República não refletem a posição do Ministério Público Federal. É uma atitude isolada e ela está sendo tratada como tal, dentro de um inquérito que está sendo desenvolvido no próprio STF sobre a relatoria do ministro Alexandre de Moraes”, afirmou.