Nezinho emocionou-se durante discurso nesta terça. Foto: ALECE

O deputado estadual Nezinho Farias (PDT) afirmou, nesta terça-feira (18), na Assembleia Legislativa, utilizando-se de vários tempos cedidos pelos colegas, no primeiro e segundo expedientes da sessão ordinária desta terça-feira, que renuncia ao seu mandato se os integrantes do Ministério Público ou da Assembleia, encontrarem alguma veracidade na denúncia feita pelo seu colega, deputado André Fernandes (PSL) de que ele teria ligação com facções criminosas. Ele cobra reciprocidade a André se não conseguir provar a denúncia que fez.

O pedetista afirmou ter a consciência totalmente tranquila da própria idoneidade. “Eu ontem (segunda-feira) oficializei no Ministério Público abrindo mão do meu sigilo bancário, telefônico e me colocando à disposição daquela casa para que tirasse qualquer dúvida. E digo hoje aqui nessa Casa, quero pedir ao presidente José Sarto que peça ao MP para dar agilidade, para que faça essa apuração o mais rápido possível. Se o MP ou essa Casa encontrarem alguma coisa que está nessa denúncia, eu não preciso nem colocar essa Casa em constrangimento, eu assino a minha renúncia. Agora, eu quero saber, de quem fez essa denúncia, se não sendo comprovado, se ele tem a coragem de renunciar ao mandato?”

O deputado lembrou de sua trajetória política em quase 60 anos de vida, tendo sido vereador, vice-prefeito e prefeito de Horizonte mais de uma vez, hoje estando em seu primeiro mandato como deputado estadual. “Vir para essa Casa é um privilégio de cada cearense, representar o povo nessa Casa é um privilégio”, afirmou.

“Eu não troco a minha honra por mandato algum, pois a minha honra é para sempre e o mandato é por 4 anos”, concluiu Nezinho, antes de receber apartes em tom de solidariedade de mais de uma dezena de colegas deputados.

A bancada do PDT prepara uma representação contra André Fernandes no Conselho de Ética da Casa. Outros partidos já teriam demonstrado interesse em fazer o mesmo, como é o caso do PSDB e o Solidariedade, segundo o presidente José Sarto.

Entenda a denúncia

O Ofício protocolado por Fernandes no Ministério Público na última sexta-feira (14) tem três páginas e afirma que Nezinho teve a campanha eleitoral financiada pela facção Primeiro Comando da Capital (PCC). Em troca, o deputado teria que apresentar e aprovar um projeto que fortalecesse a atividade desempenhada pela facção.

No documento, André Fernandes afirma que o projeto de lei apresentado por Nezinho, para regulamentar jogos eletrônicos no Estado, atenderia aos interesses da facção e serviria para fortalecer a lavagem de dinheiro através do “jogo do bicho”. A proposta, alvo da denúncia, no entanto, recebeu voto favorável do próprio André na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), no último dia 4, onde o deputado do PSL é membro titular do colegiado, não tendo levantado qualquer questionamento sobre o projeto.

Dizendo-se indignado, Farias cita que o projeto que Fernandes dissera ter ligação com jogos de azar trata apenas de jogos eletrônicos, os chamados e-sports.

“No início da sua denúncia, ele (André Fernandes) coloca o projeto, apresentado por mim nesta Casa, como se eu tivesse um envolvimento com Jogo do Bicho, ou jogo de azar. Este projeto trata-se de um projeto de regulamentação de esportes eletrônicos, vídeo game, que já foi brincadeira de criança e adolescente, hoje milhões vivem dessa questão do esporte eletrônico. Foi um projeto atendendo uma solicitação da juventude que me procurou, que foi discutido em audiência pública, em aberto e, na Comissão de Constituição e Justiça, o próprio deputado (André Fernandes) votou a favor. Eu não entendo a sua contradição, a sua irresponsabilidade de jogar no Ministério Público o nome de uma pessoa que tem 31 anos de vida pública”.

Solidariedade dos colegas

Após o discurso de Nezinho, que durou mais de uma hora, nada menos que 16 deputados, além do presidente da Casa, José Sarto, utilizaram-se de apartes para solidarizarem-se ao pedetista. As falas estenderam-se tanto que os 3 tempos de 15 minutos do primeiro expediente não foram suficientes, cabendo ainda o primeiro tempo do segundo expediente para que os parlamentares comentassem o fato.

O primeiro a apartear foi Evandro Leitão (PDT), que pediu ‘medidas enérgicas’ por parte da Casa e lembrou de alguns outros entreveiros que Fernandes teve com colegas deputados em apenas poucos meses de mandato. João Jaime (DEM) afirmou que o dano causado por uma ‘irresponsabilidade verbal como essa, mesmo sem sentido, é irreparável’, já que os adversários políticos dirão ser verdade. Jaime qualificou a acusação como falta de decoro, cabendo ao Conselho de Ética analisar a gravidade de uma eventual punição.

Marcos Sobreira (PDT) lembrou da acusação, que chamou de falsa, que Fernandes fizera em seus primeiros momentos como deputado, de que os colegas utilizariam carros oficiais, depois de quando dissera que denunciaria caso recebesse proposta financeira de algum colega e, na última sexta-feira, quando afirmou que deputados da base governista fugiram de seu discurso. “Todos sabem que estávamos em uma visita às obras de Transposição no Interior, algo muito importante para o Ceará e o Nordeste”, disse. Segundo Sobreira, ‘é uma sequência de atos que visam desmoralizar essa Casa’, afirmou, lembrando ter discutido e aprovado o projeto de Nezinho, visto que preside a Comissão de Cultura e Esporte da Assembleia.

Moisés Braz (PT) cobrou agilidade do Conselho de Ética após receber a denúncia. Heitor Férrer (SD) lamentou o ocorrido e pediu que André venha à tribuna e desminta o que disse, retirando ainda a denúncia que protocolou no MP.

Elmano (PT) afirmou que não se trata de uma discussão político-partidária, mas de ética. “Não é aceitável que um parlamentar minta. Não há prova e nem indício algum. Nesse caso não há nada, a não ser a irresponsabilidade e a vontade de crescer na política, ainda que de forma antiética”, disse o petista, afirmando ter sido um caso de ferimento de decoro parlamentar.

Érika Amorim (PSD) lembrou de prêmios que Nezinho recebera quando prefeito de Horizonte, inclusive com selo Unicef pelo trabalho com crianças e adolescentes em condição de risco. Dr. Carlos Felipe (PCdoB) destacou o carinho com que a população daquela cidade trata o parlamentar. Agenor Neto (MDB) lamentou que o fato ficará para sempre marcado com muita tristeza na história da Assembleia Legislativa e disse esperar que Fernandes tenha a coragem de se desculpar.

Salmito Filho (PDT) lembrou a frase de Montesquieu, que diz que ‘uma injustiça feita contra um é uma ameaça a todos’. Líder do governo na Casa, o deputado Júlio César Filho (Cidadania) lamentou a ausência de André Fernandes na sessão, a quem atribuiu uma postura arrogante nos discursos, sempre trazendo acusações vazias e sem embasamento. “Insistir no erro, ou é desonestidade ou é despreparo”, disse.

Sérgio Aguiar (PDT) lembrou que a imunidade parlamentar não deve ser escudo para denúncias caluniosas. Fernando Santana (PT) disse que, caso não haja confirmação do que denunciou André, que haja punição ou, pelo menos, retratação por parte do deputado. Leonardo Pinheiro (MDB) disse que em ‘época de redes sociais como vivemos, parece que a honra das pessoas não vale mais nada’.

O deputado Bruno Gonçalves (PP) disse que Nezinho foi usado como bode expiatório por André, que segundo Bruno, ‘nunca ajudou um pobre, nunca fez política nas ruas, política de verdade’.

Antes de encerrar, Nezinho Farias disse que concluirá seu mandato de cabeça erguida. “Eu tenho orgulho da minha história e a minha história ninguém vai destruir”, disse.

Encerrando a discussão, o presidente José Sarto também prestou solidariedade ao colega Nezinho, afirmando que “os fatos falam por si” e as novidades serão analisadas com rapidez.