Elizeta Ramos pode assumir PGR interinamente caso sucessor de Aras não seja confirmado / Foto: Leobark/MPF

Um bloco de ações de controle de constitucionalidade foi proposto pela procuradora-geral da República, Elizeta Ramos, ao Supremo Tribunal Federal (STF), contra legislações dos 26 estados e do Distrito Federal, nesta sexta-feira (24). As ADIs têm como objeto dispositivos que estabelecem o regramento das licenças maternidade, paternidade e aos adotantes nos regimes de servidores públicos e militares. O objetivo é garantir a uniformização no ordenamento do sistema de proteção parental, afastando disparidades entre os entes da Federação. Para a PGR, é preciso dar às normas a interpretação conforme os princípios constitucionais do livre planejamento familiar, da igualdade no exercício de direitos e de deveres referentes à sociedade conjugal, da proteção integral e do melhor interesse da criança.

Na avaliação de Elizeta Ramos, o sistema de proteção parental deve ser submetido a um regime jurídico uniforme em todo o país, independentemente do vínculo de trabalho dos servidores públicos beneficiários — estatutário, civil ou militar, em caráter permanente ou por tempo determinado. A PGR pontua, ainda, que a mulher deve ter livre decisão quanto ao compartilhamento do período de afastamento com o companheiro ou a companheira por esse ser o sentido que melhor se compatibiliza com a leitura atualizada do texto constitucional.

“Não são poucas as demandas judiciais instauradas em decorrência da disparidade de regimes de licença parental, tendo se orientado o Supremo Tribunal, em julgamentos mais recentes, pela uniformização dos parâmetros de concessão da licença à gestante e à adotante de diferentes categorias de beneficiárias”, esclarece a chefe do Ministério Público da União (MPU). Nas ações, Elizeta Ramos aponta uma série de precedentes do STF com alcance de repercussão geral e em controle abstrato de constitucionalidade no sentido de garantir o tratamento uniforme.

Um deles é o julgamento do Tema 782 da Sistemática da Repercussão Geral, no qual a Corte declarou que a legislação não pode determinar prazos diferentes de licença à mãe adotante e à mãe biológica. Esse precedente também fundamentou a decisão do Tribunal no julgamento de outra ação proposta pela Procuradoria-Geral da República — ADI 6.603. Na ocasião, o STF reconheceu a inconstitucionalidade de lei que instituiu prazos díspares para a licença à mãe biológica e à mãe adotante que integram as Forças Armadas. Já na análise do Recurso Extraordinário 1.348.854, a Corte definiu que o espectro protetivo da Constituição não se limita à recuperação física da mulher gestante, mas está ligado à proteção integral dos recém-nascidos e crianças, cabendo também ao genitor monoparental de criança gerada por fertilização in vitro a licença prevista no artigo 7º.

No entanto, a PGR esclarece que as decisões em sede de repercussão geral vinculam somente o entendimento do Judiciário e as decisões em ações de controle concentrado a categorias específicas — como das adotantes das Forças Armadas. Assim, permanece no ordenamento brasileiro a abertura para práticas discriminatórias que exigem a atenção do Judiciário e do MPF. “É necessário compreender de forma uniforme e integrada o instituto da licença parental como meio de viabilização da partilha de responsabilidades da maternidade, biológica ou por adoção, entre os responsáveis pelo planejamento familiar, o que passa pela necessidade de uniformização de prazos e de admissão do compartilhamento voluntário do período de afastamento entre os cônjuges ou companheiros(as)”, afirma Elizeta Ramos.

Tratamento isonômico

Nas ações diretas de inconstitucionalidade, a PGR aponta a diversidade de normas federais editadas para dar cumprimento ao dever constitucional de assegurar proteção à maternidade e à infância que já foram reavaliadas pelo STF a fim de se adequarem à realidade atual do país. Entre elas, dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), da Lei 8.112/1990, que regula o instituto da licença-maternidade para as servidoras públicas e membros das Forças Armadas, e da Lei 11.770/2008, que criou o Programa Empresa Cidadã, que em redação posterior ampliou o espectro protetivo. Entretanto, segundo Elizeta Ramos, normas estaduais permanecem promovendo tratamento diferenciado e discriminatório nessa seara, apesar dos esforços da Suprema Corte.

“O regime constitucional inaugurado em 1988 incorporou elementos de resguardo da família e de defesa e proteção da criança e do adolescente, dispensando especial preocupação com a igualdade entre filhos. Por esse viés, afigura-se incompatível com os preceitos constitucionais a regulamentação de períodos de acolhimento familiar distintos em face do nascimento ou da adoção, da idade da criança adotada ou da natureza do vínculo e do regime jurídico da genitora ou adotante”, aponta Elizeta Ramos, reiterando que o tratamento diferenciado em relação aos prazos de licenças e com base no regime funcional dos beneficiários afronta o princípio da igualdade.

Pedidos

Defendendo que os períodos de licença parental devem ser entendidos como benefícios a serem usufruídos pelo casal com base no planejamento familiar e atendendo aos melhores interesses da criança, a procuradora-geral da República requer ao STF que declare a inconstitucionalidade das leis dos 26 estados e do Distrito Federal que vão na contramão dessa premissa.

A PGR ainda pede ao STF que assegure às genitoras, às adotantes e aos pais solo (adotantes ou biológicos) 180 dias como parâmetro mínimo de licença remunerada a partir do nono mês da gestação, do parto, da adoção ou da obtenção de guarda para fins de adoção. Nestes casos, independe o tipo de vínculo com a instituição, se contratual trabalhista ou administrativo, estatutário, civil ou militar, permanente ou temporário.

Outro pedido é para que a licença-paternidade seja fixada no prazo mínimo de 20 dias — relativo ao prazo constitucional de cinco dias (art. 10, § 1º, do ADCT) e a prorrogação de 15 dias concedida pela Lei federal 11.770/2008 (art. 1º, II). Esse mesmo período vale para a paternidade biológica e a adotiva.

Por fim, é requerido também ao STF que sejam os períodos de licença parental compreendidos como “interregnos que podem ser usufruídos de forma partilhada pelo casal, como direito direcionado à concretização dos princípios da proteção integral e do melhor interesse da criança”. Neste caso, cabe à mulher decidir quanto ao compartilhamento do período de afastamento com a pessoa que seja empregada, servidora pública, militar ou membro de Poder, de órgão autônomo ou das Forças Armadas.

Fonte: Ministério Público Federal