Lewandowski disse que Constituição e outras leis já têm restrições adequadas. O ministro pediu que a liminar seja incluída em pauta para referendo do Plenário Virtual. Foto: Carlos Humberto/SCO/STF.

A restrição à indicação de conselheiros e diretores de estatais que sejam titulares de alguns cargos públicos, ou que tenham atuado na estrutura de partido político ou em campanha eleitoral nos três anos anteriores, viola os princípios constitucionais da isonomia, da proporcionalidade e da razoabilidade.

Com base nesse entendimento e no risco de dano irreparável, pois os executivos de empresas públicas serão eleitos até o fim de abril, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski suspendeu na última quinta-feira (16) a proibição de ocupar cargos de direção nessas companhias a quem tiver sido, no último triênio, ministro do Governo Federal, secretário de estado ou município ou titular de posto comissionado de natureza especial ou de direção e assessoramento superior na administração pública.

A regra consta do inciso I do parágrafo 2° do artigo 17 da Lei das Estatais (Lei 13.303/2016).

Lewandowski ainda conferiu interpretação conforme à Constituição ao inciso II do parágrafo 2° do artigo 17 para estabelecer que a proibição de militantes de partidos políticos serem indicados para a direção de estatais limita-se àquelas pessoas que ainda participam da estrutura decisória de alguma legenda ou de trabalho vinculado a organização, estruturação e realização de campanha eleitoral.

Porém, quem assumir cargo em estatal não pode manter o vínculo partidário.

 

As regras discutidas no Supremo estão previstas na Lei das Estatais. A restrição para cargos públicos diz respeito a ministros de Estado, secretários estaduais, secretários municipais, dirigentes estatutários de partidos políticos, parlamentares, representantes do órgão regulador ao qual a empresa esteja sujeita e ocupantes de funções especiais ou de direção e assessoramento superior na administração pública.

A ação direta de inconstitucionalidade foi ajuizada pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB). Segundo a agremiação, as previsões da lei impedem a atuação de profissionais com habilidades e experiências necessárias para as finalidades públicas das empresas, além de barrar a livre concorrência de candidatos preparados.

O julgamento foi iniciado no Plenário Virtual e Lewandowski, relator da matéria, votou pela declaração de inconstitucionalidade dos dispositivos, mas a análise das normas foi interrompida por pedido de vista do ministro André Mendonça.

O PCdoB, então, apresentou pedido de liminar por causa da proximidade das assembleias gerais ordinárias para eleição de administradores e membros dos conselhos de administração das estatais. Tais reuniões devem ocorrer até o fim de abril, sendo convocadas um mês antes, conforme o artigo 132 da Lei das Sociedades Anônimas.

Restrições exageradas

Em sua decisão, Lewandowski argumentou que a Lei das Estatais extrapolou nas vedações à indicação de executivos de estatais: “É que essas proibições, além de não levarem em conta nenhum parâmetro de natureza técnica ou profissional com vistas a garantir a boa gestão das empresas estatais sob escrutínio, introduziram no texto legal preocupações alheias a tal âmbito.”

Entre elas, a restrição a pessoas que exercem legitimamente a atividade política ou governamental de ocupar tais cargos. Tal medida, disse o ministro, viola o princípio da isonomia e o preceito, essencial em uma democracia, segundo o qual ninguém pode ser privado de direitos por motivo de convicção política (artigo 5º, caput e VIII, da Constituição). Uma restrição do tipo só poderia ser estabelecida pelo texto constitucional, e não de lei, declarou ele.

As vedações também desrespeitam o direito à igualdade, que determina a ampla acessibilidade a cargos, empregos e funções públicos (artigo 37, I, da Constituição), segundo o ministro. Para ele, tal garantia somente admite o estabelecimento de requisitos positivos, e não negativos, de qualificação técnico-profissional compatíveis com o seu exercício.

Lewandowski também considerou irrazoável e desproporcional a proibição aos que tenham atuado na estrutura de partido político ou em campanha eleitoral nos três anos anteriores de ocupar cargos de direção em estatais.

Além disso, o ministro afirmou que a alegação de que as restrições servem para reduzir o risco de captura da empresa estatal por interesses político-partidários ou sindicais, fator supostamente responsável por alguns casos notórios de corrupção, não se sustenta.

De acordo com ele, há meios menos graves de gerar tais resultados, bastando aplicar as restrições do artigo 37 da Constituição e de outras normas, como a Lei das Sociedades Anônimas (Lei 6.404/1976), a Lei do Conflito de Interesses (Lei 12.813/2013) e a Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/1992), além daquelas da Lei das Estatais.

Os cidadãos têm o dever de participar da vida pública, para que se engajem na busca de soluções comuns para os problemas sociais, disse o ministro. “Por isso, penso que afastar indiscriminadamente pessoas que atuam na vida pública, seja na estrutura governamental, seja no âmbito partidário ou eleitoral, da gestão das empresas estatais constitui discriminação odiosa e injustificável sob o ponto de vista do princípio republicano, nuclear de nossa Carta Magna.”

“Ademais, não custa lembrar que, no sistema presidencialista de governo (e mesmo no parlamentarista), quando os eleitores escolhem, por meio do voto, um certo candidato para representá-los na chefia do Executivo, pelo período correspondente a um mandato, sufragam também um determinado conjunto de valores constantes de seu programa político, os quais serão colocados em prática mediante políticas públicas desenvolvidas por auxiliares que ele nomeia para os distintos cargos da administração estatal, direta e indireta”, destacou Lewandowski.

De acordo com o magistrado, há risco de dano irreparável, tendo em vista a proximidade das assembleias gerais ordinárias para eleição de administradores e membros dos conselhos de administração das estatais.

Fonte: ConJur