Trad (de pé) presidiu reunião, na qual Martinez (D) anunciou progresso nos estudos sobre IA na região do Mercosul e Estela Aranha advertiu sobre dependência tecnológica dos EUA e China. Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado

Parlamentares e especialistas defenderam nesta terça-feira (21) que o Brasil e os países que formam o Mercosul desenvolvam uma legislação específica para regular o uso de dados pessoais e de inteligência artificial. Eles participaram de um seminário promovido pela Representação Brasileira no Parlamento do Mercosul, presidida pelo senador Nelsinho Trad (PSD-MS)

“Apesar das inúmeras facilidades propiciadas por essas novas ferramentas, deparamos com um grande dilema: como preservar a privacidade dos usuários e seus dados pessoais? Essa preocupação surge quando percebemos que a inteligência artificial necessita de um grande volume de informações para sua otimização. Por isso, existe um crescente interesse dos estados nacionais em harmonizar não apenas a proteção de dados, mas também o uso da inteligência artificial. Isso não tem mais volta”, observou Trad.

O seminário foi proposto pelo senador Carlos Viana (Podemos-MG), presidente da Comissão Temporária sobre Inteligência Artificial (CTIA). O colegiado analisa o projeto de lei (PL) 2.338/2023, sugerido pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco. O texto regulamenta o uso da inteligência artificial no país. Segundo o presidente da CTIA, a comissão deve votar até julho o relatório do senador Eduardo Gomes (PL-TO).

“Uma regulamentação muito restritiva poderia nos condenar à dependência tecnológica em uma área estratégica em termos de competitividade global. Uma regulação ineficaz tornaria a sociedade prisioneira das big techs. O relatório final, elaborado pelo senador Eduardo Gomes, combina responsabilidade e liberdade, assegura proteção aos direitos fundamentais e fomenta a inovação”, explicou Carlos Viana.

Para o vice-presidente da CTIA, senador Astronauta Marcos Pontes (PL-SP), a regulamentação da inteligência artificial traz um desafio. Por conta da velocidade das mudanças tecnológicas na área, a legislação vai precisar de atualização constante para permanecer eficaz.

“Trata-se de uma tecnologia disruptiva, que traz enormes benefícios para a sociedade. Mas, como toda tecnologia disruptiva, é preciso ter os cuidados necessários. Uma legislação sobre inteligência artificial tem um risco de se tornar obsoleta muito rapidamente. Os riscos vão ser variáveis no tempo: o que hoje a gente considera como baixo risco em inteligência artificial, daqui a pouco vai ser alto risco. Essa parte da legislação precisa ser constantemente reavaliada e modificada”, argumentou.

Cooperação

O seminário “Dados Pessoais e Inteligência Artificial no Mercosul” contou com a participação de Marcelo Salomão Martinez, chefe da Divisão de Temas Digitais do Itamaraty. Segundo o diplomata, a discussão sobre o tema “avançou muito” durante a presidência pro tempore do Brasil no Mercosul, ocorrida no segundo semestre de 2023.

“Do ponto de vista da proteção de dados, avançamos muito por iniciativa da Autoridade Nacional de Proteção de Dados. A ANPD propôs que a gente levasse à pauta a criação de um mecanismo de cooperação interagências no Mercosul, com autoridades que tratam do tema da proteção de dados. Encerrada a presidência brasileira, o tema foi retomado neste ano com a presidência do Paraguai “, afirmou.

O PL 2.338 prevê que uma autoridade da administração pública federal fique “responsável por zelar, implementar e fiscalizar” o uso da inteligência artificial no Brasil. Entre outras atribuições, o órgão deve “regulamentar os sistemas de inteligência artificial de risco excessivo”. O presidente da ANPD, Waldemar Gonçalvez Ortunho Junior, defendeu que o órgão desempenhe essa função:

“Esse tema é prioritário e tem sido tratado pela ANPD. É uma experiência nova e estamos à frente de diversas autoridades mundiais. O Brasil não está parado no tema. Em temas de inteligência artificial, não podemos deixar passar. Temos que assumir esta liderança, temos que tomar esse conhecimento e evitar riscos”.

O seminário contou ainda com a presença de Estela Aranha, membro do Conselho Consultivo de Alto Nível das Nações Unidas para a Inteligência Artificial. Ela defendeu a aprovação, “com pequenos ajustes”, apresentado por Pacheco. E alertou: o Brasil e os países do Mercosul têm o desafio de desenvolver ferramentas de inteligência artificial como forma de assegurar as soberanias nacionais.

“Hoje, a gente tem a concentração (de tecnologias) somente em dois países: Estados Unidos e China. Alguns países estão investindo muito para tentar alcança-los. Mas o Sul Global está absolutamente atrás e precisa de condições melhores. Se a gente não conseguir alcançá-los e somente usar os modelos deles, vamos apenas contratar serviços de softwares. A gente fica absolutamente dependente técnica, científica e economicamente dessas empresas”, advertiu Estela Aranha.

Fonte: Agência Senado