Mourão foi entrevistado pela TV Senado. Foto: Reprodução/TV Senado

Segundo o general da reserva do Exército e ex-vice presidente da República Hamilton Mourão, um de seus principais desafios no Senado será a construção de consensos para a aprovação de reformas e leis importantes para o país.

Ele, que representará o Rio Grande do Sul, também reiterou que fará oposição ao governo de Luiz Inácio Lula da Silva, mas que não faz “oposição ao Brasil“.

”Minha visão é muito clara. Tenho ideias totalmente opostas ao governo eleito. Pautas que eu considero esquerdizantes, pautas que vão no caminho do déficit público, não respeitando o equilíbrio fiscal, essas pautas não terão o meu apoio; terão a minha oposição constante. Agora, eu não faço oposição ao Brasil. Se esse governo abrir os olhos e entender que se não abraçar as causas das grandes reformas o país não tem jeito, e se fizer avançar essas reformas, contará com o meu apoio porque isso é bom para o Brasil, independentemente de quem for o governante de turno”, declarou ele.

Com quase dois milhões e seiscentos mil votos, Antônio Hamilton Martins Mourão foi eleito pelo Republicanos para um mandato de oito anos, a contar da legislatura que se inicia em 1º de fevereiro de 2023. Será seu segundo cargo eletivo (após a vice-presidência no mandato de Jair Bolsonaro).

Rio Grande do Sul

Mourão, que foi comandante militar do Sul entre abril de 2014 e janeiro de 2016, nasceu em Porto Alegre, tem 71 anos e ingressou no Exército em fevereiro de 1972, na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), em Resende (RJ).

A chapa eleita com Hamilton Mourão para o Senado é formada por Liziane Bayer (Republicanos), como 1ª suplente, e Coronel Andreuzza (Republicanos), como 2º suplente. ”Por ter sido general do Exército brasileiro, ter passado 46 anos no Exército, com toda a vivência que eu adquiri, e ter sido vice-presidente da República, para mim, o caminho natural seria representar o meu estado, o Rio Grande do Sul, no Senado Federal”, explicou Mourão.

Geopolítica

Mourão obteve 44,11% dos votos válidos do Rio Grande do Sul nas eleições de outubro e já manifestou interesse em presidir a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE) do Senado. Ele aponta um cenário internacional atual ”extremamente difuso, conturbado, com disputa geopolítica forte entre uma potência em ascensão, que é a China, e os Estados Unidos, além de uma situação difícil na Europa ocidental em razão da questão energética, fruto da guerra entre a Ucrânia e a Rússia, e ainda os problemas vividos pelo Reino Unido e pela América do Sul”.

”O Brasil tem de trabalhar com pragmatismo e flexibilidade para poder aproveitar as melhores posições neste cenário que estamos vivendo. Temos negócios fortíssimos com a China e o Oriente, e por isso temos de ter essa postura, além, obviamente, de não descuidarmos de nosso entorno. O Brasil é o gigante da América do Sul. Fazemos fronteiras com dez países, apenas Chile e Equador não têm fronteira direta conosco. Poucos países têm fronteiras tão grandes como o Brasil tem. E temos a costa oposta da África ocidental; parte do povo que formou a nacionalidade brasileira veio de lá e temos que manter esses laços”, declarou Mourão em entrevista ao programa Senado Notícias Especial.

Narcotráfico

Mourão, que cumpriu missão de paz em Angola e foi adido militar na Venezuela, avalia ainda que o Brasil deve assumir um papel ativo no combate ao narcotráfico latino-americano.

”No cenário que nós vivemos hoje, é muito difícil haver conflito de nação contra nação. Esse conflito da Rússia com a Ucrânia é um caso inédito nos últimos 70 anos. Nesse período tivemos conflitos indiretos. E, no nosso entorno próximo, temos a questão muito séria do narcotráfico, associado ao contrabando e tráfico de armas. O narcotráfico hoje é um flagelo mundial, afeta a juventude do mundo inteiro e é um grande negócio também. Os grandes consumidores são os Estados Unidos e a Europa. Na nossa vizinhança existem países produtores. Nós somos área de trânsito, ou seja, é algo que tem de ser combatido com força pelo Estado brasileiro”, argumentou ele.

Mercosul

Ex-comandante do 27° Grupo de Artilharia de Campanha em Ijuí (RS) e da 6ª Divisão de Exército, em Porto Alegre, Mourão também defende o aprimoramento do Mercosul, bloco econômico fundado em 1991 por Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai. Ele avalia que “o Mercosul nasceu e avançou muito bem, mas depois entrou em posição de marca passo, em razão até da situação econômica vivida pelo nosso principal parceiro, a Argentina, que tem atravessado ciclos de moeda, dívida e falta de crédito”. Essas ocorrências, segundo ele, atrapalham as implementações necessárias, como a diminuição da tarifa externa comum, a verdadeira união aduaneira e o trânsito de nacionais, que ainda ocorre com alguns limites.

”Então nós temos de avançar nessa questão, principalmente na questão aduaneira. Lá no meu estado, no Rio Grande do Sul, isso é um problema sério. Nós temos uma ligação com a Argentina importantíssima, ali entre Uruguaiana e a cidade de Paso de Los Libres. Tenho recebido diversas manifestações de pessoas que trabalham nessas áreas, de pessoas que são importadoras, exportadoras, sobre as dificuldades, sobre [o excesso de] burocracia existente de ambos os lados da fronteira. Então é algo que temos de fazer avançar para que, efetivamente, nós consigamos replicar aqui o que acontece na União Europeia. Lá no Rio Grande do Sul já tive algumas reuniões com as federações ligadas à agricultura, ao comércio, que apresentaram suas ponderações, as dificuldades que enfrentam com os prazos que têm para liberar uma carga, o que aumenta os custos. Às vezes, deixamos de ter até mais competitividade por causa desse problema de aduana”, ressaltou.

Amazônia

”Com um pé na Amazônia e outro pé no Rio Grande do Sul, com pai amazonense, mãe gaúcha e família em Manaus”, Mourão considera importante que o Brasil compreenda o que é a Amazônia, para poder defender a forma de exploração sustentável que seja a mais adaptada à região.

”É importante que as pessoas entendam que a Amazônia tem cinco milhões de quilômetros quadrados, tem 25 milhões de brasileiros que lá vivem, é uma região que tem um dos piores índices de desenvolvimento humano e está assentada sobre uma quantidade de riqueza muito grande. Então precisamos proteger, preservar, mas precisamos, principalmente, desenvolver a Amazônia. É obvio que o desenvolvimento passa pelos parâmetros do século XXI, ou seja, respeitando a rica biodiversidade, respeitando a nossa legislação, que diz que 80% da região têm de estar preservadas. Isso equivale a 3,7 milhões de quilômetros quadrados; são dez vezes a Alemanha. O Brasil tem de fazer isso aí, é a nossa mitigação para o aquecimento global, mas ao mesmo tempo temos de ser pagos por esse serviço ambiental que estamos prestando ao resto da humanidade. Essa é uma das questões que eu vou discutir e procurar levar à frente no Senado Federal”, destacou.

Forças Armadas

Ao ser questionado sobre como pretende atuar no Senado para ajudar na aprovação de projetos relacionados à defesa nacional, Mourão respondeu que essa demanda está ligada à capacidade do Executivo de investir em proposições de armamento e modernização das Forças Armadas.

”Eles têm de ser constantemente incentivados. Nós precisamos ter uma Força Aérea capaz de operar em todo o território nacional, dentro da nossa estratégia de dissuasão. A Marinha há muito tempo precisa desse submarino nuclear, que é outro elemento de dissuasão. E, obviamente, as nossas fronteiras terrestres, que são guarnecidas pelo Exército brasileiro, precisam de comunicações amplas, flexíveis, de aeronaves de transporte que permitam que a tropa seja deslocada de acordo com as necessidades, uma vez que as distâncias envolvidas na Amazônia são enormes, as grandes vias de deslocamento são os rios, e nós não podemos depender única e exclusivamente de deslocamento fluvial” afirmou.

Mourão também defende investimentos em mobilidade estratégica, em vez de ampliar a presença das Forças Armadas na Amazônia, a partir da criação de novos grupamentos e batalhões na região.

”Acho mais importante que a gente tenha mobilidade estratégica, ou seja, que sejamos capazes de retirar tropa do Centro-Sul do país em determinados momentos e colocar lá, uma vez que as unidades que estão desdobradas naquela região são unidades de vigilância, e o que precisaria seriam tropas capazes de atuar no emprego geral, vamos falar assim. Então acho que isso é mais importante, até porque é difícil você ter grandes conjuntos de tropa em lugares que são muito afastados, onde a população é rarefeita e você praticamente não tem um núcleo mobilizado. Digo isso por experiência própria”, frisou Mourão, que já foi comandante da 2ª Brigada de Infantaria de Selva em São Gabriel da Cachoeira (AM), na fronteira com Venezuela e Colômbia.

Atuação no Senado

Na entrevista, Mourão também comentou os “eixos” nos quais pretende concentrar sua atuação no Senado: economia, educação, saúde e segurança pública. “Nós sabemos que só com o desenvolvimento econômico a gente conseguirá gerar emprego e renda para a massa da população brasileira e, principalmente, emprego de qualidade e mais renda para todo mundo”, avalia ele, que foi  chefe da Secretaria de Economia e Finanças do Exército até dezembro de 2017.

”Ou seja, que o país entre realmente numa rota de desenvolvimento e de avanço numa riqueza continuada, uma vez que nós estamos há 40 anos marcando passo naquilo que os economistas chamam de ‘armadilha da renda média’. E a outra parte são as questões ligadas à educação. Nós precisamos ter gente capacitada para esses empregos de qualidade que vão surgir. Há a questão da saúde. Nós temos uma população que está ficando cada vez mais idosa e precisa ter acesso a uma saúde de qualidade. E tudo isso é sinônimo de gestão melhor; não é só questão de recursos. E outra é a segurança pública, que é o anseio da nossa população, de poder andar nas ruas das nossas cidades sem medo”, ressaltou o general, que também já atuou como vice-chefe do Departamento de Educação e Cultura do Exército.

Fonte: Senado Federal