Foto: Reprodução/ TSE

A mídia internacional vem dando ampla cobertura à eleição presidencial de domingo (30/10) no Brasil, com um misto de preocupações e uma (quase) explícita torcida. Os principais destaques são dados à guerra de desinformações, a declarações infundadas de fraude, ao desmatamento da Amazônia, ao futuro da pesquisa e da ciência e ao destino da democracia no Brasil. O presidente Jair Bolsonaro não aparece bem nesse cenário.

Na verdade, são poucas as referências a favor de Bolsonaro nas notícias publicadas pela imprensa internacional recentemente. Uma delas, já observada pela imprensa brasileira, é a de que Bolsonaro saiu vitorioso nas eleições gerais, mesmo que perca a eleição presidencial, porque ele solidificou a posição da direita no Congresso Nacional.

Sobre a importância dessa eleição, a BBC News traduz bem o sentimento mundial, com uma declaração de Steve Bannon, um dos mais controversos assessores do ex-presidente Donald Trump: “Essa será uma das mais intensas e dramáticas eleições do Século XXI.” O jornal The New York Times diz que, para historiadores, essa eleição “é largamente considerada a mais importante da nação em décadas” — por causa do que está em jogo.

Para o jornal The Washington Post, o que está em jogo é o futuro da democracia: “muitos analistas veem essa eleição como um referendo à jovem democracia do Brasil”. O jornal destaca que Bolsonaro trabalhou, em seu governo, para limitar o poder do judiciário e atacou diretamente as instituições eleitorais. Para o France 24, uma vitória de Bolsonaro representa “um risco para a independência do STF”.

Os ataques às instituições eleitorais, através de previsões infundadas de fraudes na contagem dos votos, foram destaques em várias publicações, que viram relações entre os atos de Bolsonaro e os de Donald Trump, após as eleições de 2020 nos EUA.

PBS (Public Broadcasting Service) afirma: “O que está acontecendo no Brasil é terrivelmente similar ao que aconteceu nos EUA na eleição de 2020. Bolsonaro afirma que o sistema de votação eletrônica do Brasil é usado para cometer fraudes, sem nunca produzir qualquer prova”.

NPR (National Public Radio), por sua vez, informa: “Notícias falsas sobre urnas eletrônicas no Brasil estão se espalhando em círculos de extrema direita nos EUA”. Segundo a publicação, circulam declarações infundadas de que as urnas eletrônicas feitas pela Dominion e pela Smartmatic nos EUA estão ajudando a fraudar as eleições no Brasil, embora nenhuma das duas seja usada no país. O The College Reporter destaca que o sistema de votação brasileiro já foi amplamente aprovado por inúmeros observadores internacionais.

Aljazeera destaca que essa é a eleição mais causou divisão da história do Brasil. O Financial Times diz que a coalisão bolsonarista continuará a moldar a política do país, mesmo que o atual presidente não seja reeleito. O Foreign Affairs afirma que Bolsonaro sairá vitorioso nas eleições deste ano, mesmo que perca a eleição presidencial, indicando que o domínio da direita irá prevalecer.

canal WFTV 9 diz que os brasileiros irão fazer, no domingo, uma escolha entre os valores conservadores da direita e a esperança de retorno de um próspero governo de esquerda do passado. “Mas, nesse país ferozmente polarizado, grande parte dos eleitores vão votar contra o candidato que desprezam” — em vez de em um candidato que apreciam.

Desinformação na mídia social
A questão da desinformação (ou de notícias falsas) online é destacada por várias publicações. Segundo a PBS, “Os eleitores brasileiros estão sendo bombardeados por desinformações”, antes da eleição presidencial. A NPR destaca que as narrativas de fraude eleitoral no Brasil se tornaram internacionais: “Em muitos casos, tais alegações falsas estão sendo disseminadas em inglês, para audiências americanas, por influenciadores de direita e sites de mídia conservadora, que plantam a ideia de que fraudes semelhantes podem acontecer nas eleições deste ano nos EUA”.

“Rumores infundados e politicamente motivados estão varrendo a mídia social na maior democracia da América Latina, perturbando a política brasileira da mesma forma que perturba a polícia americana”, diz o Daily Independent. O The Guardian atribui parte da culpa às empresas de mídia social. Segundo o jornal, a Global Witness divulgou, só para efeito de teste, desinformações no YouTube e no Facebook. O YouTube aprovou todas elas e o Facebook metade delas, antes de a organização apagá-las.

O site New.com.au, da Austrália, noticia que a campanha eleitoral no Brasil tem sido uma orgia de difamações, ataques na mídia social e mentiras tão bizarras que, em alguns casos, chegam a ser cômicas. O Common Dreams diz que as campanhas de desinformação na eleição presidencial brasileira se assemelham aos esforços dos seguidores de Trump para subverter as eleição presidencial de 2020 nos EUA. O site .coda tem a mesma visão: “Para os americanos, as notícias do Brasil invocam um sentimento estranho de déjà vu“.

Efeito meio ambiente
Como é de praxe, muitos países esperam que o Brasil salve o “pulmão do mundo” — a chamada floresta tropical (rainforest) da Amazônia. O The New Republic declara enfaticamente: “O mundo depende da esquerda brasileira para salvar a Amazônia”. E toma um partido, explicitamente: “Derrotar Bolsonaro na eleição de domingo é o primeiro passo; mas não é suficiente”.

O influente Financial Times também vincula a eleição presidencial no Brasil ao destino da Amazônia, tal como a agência Reuters, que afirma: “A eleição presidencial de domingo no Brasil pode determinar o destino da floresta amazônica, a maior rainforest do mundo, depois que o desmatamento cresceu muito durante o governo Bolsonaro”. Para a Reuters, proteger a Amazônia é vital para interromper a mudança climática catastrófica, por causa da grande quantidade de gás de efeito estufa que ela absolve.

As publicações especializadas em meio ambiente e ciência, Nature e Science declaram explicitamente suas posições na eleição do Brasil — mais exatamente contra Bolsonaro. “Há apenas uma escolha na eleição do Brasil, pelo país e pelo mundo: um segundo mandato de Bolsonaro irá representar uma ameaça à ciência, à democracia e ao meio ambiente”, publica a Nature.

“Tal como a seu populista congênere nos EUA Donald Trump, Bolsonaro ignorou as advertências dos cientistas sobre a Covid-19 e negou os perigos da doença. Ele também minou os programas de vacinação, questionando a segurança e a eficácia do tratamento, resultando na morte de 685 mil pessoas no Brasil e na crise econômica que se seguiu à pandemia” — assim como aconteceu nos EUA.

O jornal Science afirma que são enormes os riscos para a ciência e para o meio ambiente a reeleição de Bolsonaro, porque ela vai erodir ainda mais a pesquisa e acelerar o desmatamento da Amazônia. “Os cientistas estão aflitos”, diz o jornal. O Science declara sua torcida por Lula: “Ele teve seus problemas, mas prometeu investir mais em ciência e indicou um curso mais verde do que a de seus mandatos anteriores, de 2003 a 2011”.

CBC radio também declara que o destino da Amazônia está nas mãos dos eleitores brasileiros. “Os cientistas advertem que o destino da Amazônia também está na cédula eleitoral. Dezenas de milhares de incêndios ilegais já dizimaram partes do precioso ecossistema. Se Bolsonaro for reeleito, a Amazônia sofrerá mais perdas, o que terá um impacto devastador na mudança do clima.” Esse é um “parecer” semelhante à da Emissora de TV KFGO e do jornal The New York Times.

Efeito religião
O site de La Prensa Latina vê a eleição presidencial no Brasil como uma batalha por eleitores religiosos. “Apesar de a religião sempre ter sido um fator na política brasileira, o cristianismo assumiu um papel relevante nas atuais eleições, devido ao crescimento do poder dos evangélicos que, agora, contam com pelos menos 30% do eleitorado do país.”

Bolsonaro é sempre acompanhado pela primeira-dama Michelle Bolsonaro, que se declara “uma evangélica fervorosa e uma serva do Senhor”. E prometeu aos cristãos “a presença de Jesus Cristo no governo, se seu marido for reeleito”.

site Newsy diz que a mensagem de Bolsonaro se foca na apresentação de uma visão de um país radicado no cristianismo e contra coisas rejeitadas pelas religiões, como comunismo, socialismo e aborto. Algumas publicações destacaram que, entre as desinformações, houve uma alegando que Lula iria fechar as igrejas.

Economia e política externa
Bloomberg prevê que a eleição de Bolsonaro ou de Lula não irá exercer impacto substancial no mercado financeiro do Brasil, que tem ido bem. Não há previsão de que a eleição de um ou de outro irá ameaçar o cenário fiscal do país a curto prazo. Mas, a longo prazo, haverá algumas mudanças, porque os dois candidatos discordam em questões essenciais, desde a privatização de empresas estatais a um foco mais sustentável na transição para recursos sustentáveis de energia.

A revista Americas Quartely afirma que o ministro da Economia, Paulo Guedes, que foi influente no primeiro governo de Bolsonaro, não conseguirá, em um segundo mandato, “impedir as políticas crescentemente populistas e fiscalmente irresponsáveis do atual presidente, que vêm se acentuando nos últimos meses”.

A revista também suspeita que o crescente papel das forças armadas em um segundo mandato de Bolsonaro irá contribuir para o isolamento diplomático do Brasil na América Latina e em todo o Ocidente.