Alexandre de Moraes foi o relator. Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil.

Por unanimidade, o Supremo Tribunal Federal (STF) garantiu a extensão da licença-maternidade de 180 dias para o chamado pai solo, ou seja, genitor de família monoparental, formada pelo pai e sua prole, sem a figura materna.

Os ministros julgaram improcedente recurso extraordinário apresentado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) contra a concessão do benefício a um servidor público, pai de crianças gêmeas, geradas por meio de procedimento de fertilização in vitro e utilização de barriga solidária.

Ao julgar o RE 1.348.854, representativo do Tema 1.182 da Sistemática da Repercussão Geral, o Plenário do STF definiu a seguinte tese: “À luz do artigo 227 da Constituição Federal, que confere proteção integral da criança, com absoluta prioridade, e do princípio da paternidade responsável, a licença-maternidade, prevista no artigo 7º, inciso XVIII, da Constituição Federal de 1988, e regulamentada pelo artigo 207, da Lei 8.112/1990, estende-se ao pai genitor monoparental”.

Em sustentação oral no início do julgamento, na sessão de quarta-feira (11), o procurador-geral da República, Augusto Aras, destacou que é direito da criança, com absoluta prioridade, ter a presença de seus pais. Segundo ele, “se o recém-nascido não tem a figura da mãe, mais ainda se justifica que se lhe assegure a presença do pai”.

Aras apontou que não se trata apenas do direito de o pai estar com os filhos, mas, principalmente, do direito e da necessidade de as crianças estarem com seu pai, que, desde cedo, vai lhes proporcionar cuidado, amor e assistência integral. O procurador-geral também pontuou que em alguns países não existe mais a distinção entre licença-maternidade e licença-paternidade, mas a chamada licença-parental, que permite a ambos os gozos desses direitos.

Isonomia

No caso analisado, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) recorre de decisão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) que confirmou a concessão da licença-maternidade, por 180 dias, a um perito médico do próprio INSS, pai de crianças gêmeas geradas por meio de fertilização in vitro e barriga de aluguel. Segundo o TRF-3, a finalidade das licenças parentais é privilegiar o desenvolvimento do recém-nascido, e negar esse direito viola o princípio da isonomia material em relação às crianças concebidas por meios naturais.

Concessão por analogia

Por videoconferência, o advogado Biovane Ribeiro, representando o perito médico, afirmou que o salário e a licença-maternidade têm como objetivo a proteção à criança e ao núcleo familiar mínimo. Ele sustentou que, embora não haja norma legal ou constitucional que assegure o benefício ao pai solteiro, é possível concedê-lo por analogia, de forma a assegurar o direito de a criança ter a presença paterna em tempo integral nos primeiros meses de vida.

O procurador-geral da República (PGR), Augusto Aras, defendeu que, na ausência da mãe, a concessão da licença, nessa circunstância, concretiza o princípio constitucional da proteção integral à criança. Na qualidade de terceiros interessados, se manifestaram, no mesmo sentido, representantes da Defensoria Pública da União (DPU) e da Federação Nacional dos Trabalhadores no Judiciários Federal e Ministério Público da União (Fenajufe).

Direito reconhecido administrativamente

Em nome do INSS, Bruna Medeiros, da Procuradoria-Geral Federal (PGF), argumentou, da tribuna, que, como o autor do pedido era servidor público, não é possível falar em salário-maternidade, benefício do Regime Geral de Previdência Social. Em relação à licença análoga à gestante, afirmou que, na ausência da mãe biológica, a administração pública federal já reconhece, administrativamente, esse direito aos servidores, independentemente de gênero ou estado civil.

Proteção da criança

Em seu voto, o ministro relator, Alexandre de Moraes, afirmou que considera inconstitucional qualquer previsão do regime de previdência do servidor público que não estenda ao pai monoparental os mesmos direitos de licença-maternidade garantidos à mulher. Ele observou que, por diversas vezes, o STF assegurou direitos a mulheres gestantes visando não apenas ao seu bem-estar, mas também à proteção integral da criança. Como exemplo, citou a decisão que vedou o trabalho de gestantes e mulheres em fase de amamentação em locais insalubres e a que iguala os prazos de licença-maternidade para gestantes e adotantes.

Equiparação de direitos

O ministro lembrou que, desde a Constituição Federal de 1988, não há mais a figura da “cabeça do casal”, e o poder familiar é dividido, tanto nos direitos conjugais, quanto nos deveres de proteção aos filhos, aos quais devem ser assegurados todos os direitos de convivência familiar. Segundo ele, a igualação de direitos pretendida pelo homem, neste caso, visa à integral proteção da criança, e não a um benefício a si próprio.

O relator destacou a excepcionalidade de, em nome da isonomia, estender a um homem os direitos das mulheres, mas argumentou que a medida se fundamenta na necessidade de assegurar a fruição de um direito da família. “É excepcionalidade porque, histórica, tradicional e tragicamente, os homens sempre tiveram mais direitos que as mulheres, e o que sempre se buscou foi estender às mulheres os direitos que só os homens tinham”, observou.

Fontes: STF e MPF.