Embora as mulheres correspondam a mais da metade da população brasileira e das filiadas a partidos políticos, elas ocupam apenas 15% das cadeiras do Parlamento federal.

A baixa representatividade decorre, em parte, da falta de apoio às candidaturas femininas e à violência de gênero sofrida no ambiente político.

Medidas práticas para prevenir e combater esses problemas foram discutidas nesta sexta-feira (18), durante evento online promovido pelo Ministério Público Eleitoral, que contou com mais de 400 inscritos entre membros e assessores que atuarão na fiscalização das eleições gerais deste ano.

O webinar foi inciativa do Grupo de Trabalho de Prevenção e Combate à Violência Política de Gênero, vinculado à Procuradoria-Geral Eleitoral, e também contou com a participação de integrantes da Justiça e do Parlamento, além de especialistas na matéria.

De acordo com uma das coordenadoras do GT, procuradora regional da República, Raquel Branquinho, o foco do evento é fornecer subsídios para o trabalho operacional dos membros do Ministério Público, compartilhando ferramentas e procedimentos efetivos de investigação para garantir respostas efetivas à sociedade.

“A violência política de gênero agora está tipificada como crime na legislação, mas sua efetividade depende da aplicação pelo Ministério Público e do processamento pela Justiça, para que possamos reduzir a sensação de impunidade”, afirmou.

O vice-procurador-geral Eleitoral, Paulo Gonet, fez a abertura do evento e destacou que o Ministério Público Federal (MPF), por sugestão do GT, inseriu na sua tabela de assuntos o tema violência política de gênero, para classificar todas as representações que chegam à instituição. A medida é fundamental para a geração de estatísticas e monitoramento dos casos, com o objetivo de assegurar tramitação célere e respostas efetivas.

“Também requeremos ao Conselho Nacional do Ministério Público a inclusão do tema na tabela de assuntos de todos os segmentos do MP, com o propósito de termos o retrato fiel desse sério problema, para o qual daremos especial atenção neste ano eleitoral”, afirmou o vice-PGE.

Baixa representatividade

Setenta e um por cento dos municípios não elegeram mulheres como prefeitas ou vices e 16% das câmaras municipais não receberam representantes femininas nas eleições de 2020. Além disso, três em cada quatro mulheres que se candidataram sofreram algum tipo de violência.

Para a procuradora da República, Nathalia Mariel, que também coordena o Grupo de Trabalho, vários avanços legislativos foram obtidos nos últimos anos no sentido de fomentar a participação de mais mulheres na política e combater a violência de gênero. No entanto, ainda há resistência dos partidos em cumprir as regras e a existência de fraudes, que precisam ser combatidas.

É o caso da reserva de 30% das candidaturas nas eleições proporcionais para as mulheres e de percentual proporcional de verbas públicas de campanha às candidatas, assim como a destinação de 5% dos recursos para políticas de fomento à participação feminina.

No último ano, dispositivos inseridos nos códigos Penal e Eleitoral também tornaram crime ações que buscam impedir ou dificultar a campanha ou o exercício do mandato das mulheres. Nathalia chamou atenção para a responsabilidade do Ministério Público em garantir a efetividade dessas lei, apresentando aos tribunais teses relacionadas aos temas.

Nesse sentido, destacou a necessidade de promotores e procuradores identificarem como violência de gênero todo ato que, de maneira direta ou indireta, crie obstáculos para a participação de mulheres no meio político. É o caso do uso de candidaturas laranjas para burlar a cota de gênero, a falta de recursos para candidatas ou restrições à propaganda.

A representante do Observatório de Violência Política Contra a Mulher, Ana Claudia Santano, lembrou que a legislação internacional considera o bloqueio econômico como um tipo de violência política.

“O não repasse de verbas dos fundos Eleitoral e Partidário às mulheres, por exemplo, constitui violência politica de gênero”, pontuou. Segundo ela, reconhecer essas práticas como atos de violência que restrigem a atuação feminina na política é o primeiro passo para se encontrar soluções efetivas para o problema.

A juíza auxiliar da Presidência do TSE, Flávia da Costa Viana, ressaltou que é preciso estar atento para a variedade de formas que a violência política pode assumir. “Essa é uma das principais razões que impedem o aumento da participação de mulheres na política, no Brasil e em outros lugares do mundo”, afirmou.

Segundo ela, estudos apontam que cerca de 80% das parlamentares ouvidas em 39 países diferentes afirmam ter sofrido algum tipo de violência, como ameaças, agressões físicas e psicológicas ou assédio sexual. Por isso, é necessária a atuação conjunta das instituições, partidos políticos e da sociedade para combater o problema.

Casos práticos

Durante o webinar, membros do MP Eleitoral de diferentes estados apresentaram casos práticos de investigações envolvendo o uso de candidatas laranjas para fraudar a cota de gênero e destacaram a importância de instrução bem fundamentada para caracterizar a irregularidade. Eles observaram que a votação inexpressiva recebida por mulheres – algumas não recebem nenhum voto – apesar de ser forte indício de fraude, não é suficiente para comprovar o ilícito perante a Justiça.

A falta de movimentação de recursos pra campanha, a não realização de publicidade, pedidos de votos para outro candidato ao mesmo cargo ou a existência de parentes concorrendo ao mesmo posto são outras evidências que podem contribuir para a configuração do ilícito. No evento, os participantes também puderam conhecer ferramentas e manuais práticos para a captura de provas digitais que podem ser usadas nas investigações.

Fonte: site do MPF.