Deputado federal Ulysses Guimarães, presidente da Assembleia Nacional Constituinte, no ato de promulgação da atual Constituição brasileira, ao lado do senador cearense Mauro Benevides. Foto: Arquivo/Câmara dos Deputados.

O principal líder da Assembleia Nacional Constituinte e responsável pela promulgação da Constituição Cidadã, em 1988, deputado Ulysses Guimarães, também autor de célebres frases sobre a política e políticos nacionais, respondendo indagações e críticas sobre a qualidade da nossa representação no Congresso Nacional, disse certa vez: “Você só diz que esse Congresso é ruim porque ainda não viu o próximo”. Uma verdade ainda atualíssima. O Congresso seguinte, todos conhecemos, sempre está aquém dos anteriores, ao ponto de, quase uníssona, a sociedade execrá-lo nas oportunidades e espaços em que expressa sua posição política. Lamentavelmente, pelos nomes dos pretensos candidatos neste ano, forçados somos a reconhecer quanto estará atualizada, ainda no próximo ano, a afirmação de Ulysses Guimarães. Mas este comentário tratará da representação futura.

O deputado federal Daniel Silveira, hoje filiado ao União Brasil no Rio de Janeiro, desde terça-feira (29) está homiziado no seu gabinete na Câmara dos Deputados, por não aceitar cumprir uma ordem judicial expedida pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, determinando o uso de tornozeleira eletrônica, atendendo pedido de representante da Procuradoria Geral da República (PGR). O deputado já cumpriu prisão, recentemente, no Rio de Janeiro, decretada pelo próprio ministro Alexandre, sendo-lhe posteriormente concedido a prisão domiciliar, com algumas outras restrições. E por descumpri-las, segundo o integrante da PGR, foi pedida a nova medida para permitir que as autoridades possam ter controle sobre as suas idas e vindas.

O presidente da Câmara Federal, deputado Arthur Lira, publicou uma nota, no início da tarde desta quarta-feira (30) defendendo o cumprimento das decisões judiciais. Não poderia ser diferente. Mas defendeu a inviolabilidade dos espaços da Câmara, embora tenha passado a ideia de ser este espaço apenas o plenário, repudiando a exploração midiática na Casa, o que ocorreu nesta quarta, quando o deputado logo cedo começou a dar entrevistas do seu gabinete.

O presidente do STF, ministro Luiz Fux, antecipou para 20 de abril o julgamento do processo que responde o deputado Daniel, e no qual foram decretadas todas as medidas restritivas pelo ministro Alexandre de Moraes. O presidente da Câmara, em sua nota sobre o caso, pediu, ainda, urgência no julgamento daquele feito, sobretudo para ficar acertado, no Supremo, se decisões judiciais podem ser cumpridas no território da Câmara dos Deputados.

O deputado Daniel Silveira está respondendo a processo criminal por desrespeitar o próprio mandato quando quer o privilégio das imunidades, para, fora do legítimo desempenho parlamentar, como tantos outros. A imunidade dá direito ao legislador, estadual ou federal, de fazer cobranças, críticas e reclamações sobretudo relacionado com as competências e obrigações dos integrantes dos outros Poderes. Ela, por não ser absoluta, e jamais poderia ser, tem limites. Mas o despreparo, ou a prepotência cumulada com a arrogância de alguns, fazem nascer os excessos. Só quem está preparado para o importante e honroso exercício da representação popular dignifica o Parlamento. A imunidade parlamentar é o instrumento do bom deputado ou senador.

Ela existe para deixar incólume o deputado que tem coragem de denunciar, responsavelmente, irregularidades na administração pública, no próprio Legislativo, no Executivo e no Judiciário, cobrar responsabilidades do presidente da Câmara, do Senado, do presidente da República, e do chefe do Poder Judiciário. Fiscaliza, sem temer represálias, pois é da sua competência. O deputado Daniel Silveira, pelo seu comportamento parlamentar, quer fazer uso da imunidade para outros fins, diversos daqueles que são a razão para os quais foram garantidos constitucionalmente aos parlamentares. E é, por situações degradantes como as criadas pelo Daniel Silveira, e outras, de responsabilidades de colegas deles, que o político brasileiro acaba sendo nivelado por baixo, e o Poder representado pelo povo, o Legislativo, mesmo com pecados menores que os do Executivo, acaba sendo o mais execrado.

Quando a frase de Ulysses Guimarães, aquela que reconhece ser a próxima representação legislativa pior que a atual, deixar de ser real, o Congresso, o Poder Executivo e o Poder Judiciário serão bem melhores, pois mais fiscalizados e cobrados pela sociedade e os seus próprios integrantes.

Sobre o assunto, veja o comentário do jornalista Edison Silva: