Desde 2003, o novo Código já foi alterado por outras 53 normas, segundo estatística do portal normas.leg.br. Arte: Reprodução.

O Código Civil completou na segunda-feira (10) vinte anos de sanção. Sancionada em 10 de janeiro de 2002, a Lei 10.406 entrou em vigência um ano depois, em 11 de janeiro de 2003, substituindo o Código anterior, de 1916.

Resultado de décadas de tramitação no Congresso – o projeto original foi elaborado entre 1969 e 1975 por uma comissão de juristas, encabeçada por Miguel Reale -, o novo Código Civil foi uma necessária atualização de um texto obsoleto. Já no artigo 1º, por exemplo (“Toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil”), a palavra “pessoa” substituiu “homem”, em reconhecimento à evolução da igualdade de gênero.

Entre outras mudanças que refletiram as transformações sociais entre 1916 e 2002, a maioridade civil passou de vinte e um para dezoito anos. Uma série de alterações tratavam do direito das obrigações, das empresas, das coisas, da família e das sucessões, como detalhou o então senador Josaphat Marinho (PFL-BA) (1915—2002), relator do texto no Senado, na obra O Projeto de Novo Código Civil.

O Código Civil anterior, o chamado Código Beviláqua, foi promulgado em 1916. Na década de 1930, começaram a surgir tentativas de reformulação da norma. Em 1969, o governo Costa e Silva constituiu uma comissão para atualizar o código, coordenada pelo professor da Universidade de São Paulo Miguel Reale. Também participaram do grupo de trabalho os juristas Agostinho Alvim, José Carlos Moreira Alves, Clóvis do Couto e Silva, Silvio Marcondes, Torquato Castro e Ebert Chamoun.

Seis anos depois, o anteprojeto de um novo código civil foi entregue ao governo Ernesto Geisel. O texto foi publicado no Diário Oficial e foi feita a solicitação a diversas instituições culturais e jurídicas do país para que colaborassem, encaminhando sugestões.

Com alterações, o projeto foi aprovado pela Câmara dos Deputados em 1983. Contudo, devido à redemocratização do Brasil e à instauração da Assembleia Nacional Constituinte, a proposta foi deixada de lado.

No fim dos anos 1990, o projeto voltou a ser discutido e diversas emendas foram feitas para atualizá-lo. Após ser aprovado pela Câmara dos Deputados e pelo Senado, o novo Código Civil foi sancionado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso em 10 de janeiro de 2002.

A norma aproveitou a estrutura do código de 1916 e ampliou o uso das cláusulas gerais. Também unificou as obrigações de Direito Civil e de Direito Comercial. Além disso, incorporou mudanças feitas por outras leis, pela Constituição e pela jurisprudência, como a permissão do divórcio e o reconhecimento da união estável.

O ministro do Supremo Tribunal Federal Edson Fachin afirmou, em artigo publicado na ConJur, que as regras e princípios do Código Civil demonstram sua resiliência.

“O Código Civil é obra de um pensamento estruturado, que emerge de um sistema de normas de direito privado, correspondente às aspirações de uma dada sociedade. O Direito Civil contemporâneo, nesse influxo, é reflexo de um tempo que se firma a partir da segunda metade do século XX, e mais diretamente, entre nós, a partir da Constituição de 1988, que redemocratizou o país”, declarou Fachin.

“Plasticidade”

Hoje em dia, o novo Código é, por sua vez, motivo de debate, sofrendo críticas daqueles que o consideram desatualizado. Desde 2003, o novo Código já foi alterado por outras 53 normas, segundo estatística do portal normas.leg.br.

Porém, para o consultor legislativo do Senado, Carlos Eduardo Elias de Oliveira, professor de Direito Civil na Universidade de Brasília (UnB), o texto continua a “satisfazer” a sociedade de 2022, tanto quanto em 2002, graças à sua “plasticidade”:

“Miguel Reale procurou usar conceitos jurídicos abertos na redação. O juiz pode, a depender do momento histórico, da cultura do momento e do contexto da época, dar uma interpretação diferente. Ou seja, o Código foi feito para ser adaptado às mudanças sociais. Costumo dizer que ele foi redigido com uma vocação à eternidade. Reale chamava isso de “operabilidade” afirmou Oliveira.

O consultor ressalvou que já houve mudanças pontuais, como nas regras dos processos de adoção. E lembra que problemas novos, como a herança digital e a bioética, podem vir a exigir novas atualizações.

Propostas

Inúmeras propostas que alteram o Código Civil tramitam atualmente no Senado. Entre elas figuram as seguintes:

Divórcio consensual: O PL 2.569/2021, da senadora Soraya Thronicke (PSL/MS), para facilitar a mudança do regime de bens. O divórcio, a separação e o fim da união estável poderiam ser feitos de forma extrajudicial, por escritura pública, caso haja consenso entre as partes.

“Essa medida tem como objetivo facilitar as relações jurídicas interpessoais, de forma a garantir mais celeridade aos procedimentos”, explicou a senadora ao apresentar o projeto.

Direitos dos animais: Em agosto de 2019, o Plenário do Senado aprovou o PLC 27/2018, que cria regime jurídico especial para os animais. Pelo texto, os animais não poderão mais ser considerados “bens móveis”. De iniciativa do deputado Ricardo Izar (PP/SP), a matéria retornou para a Câmara dos Deputados.

Personalidade jurídica para condomínios: Em setembro do ano passado, os senadores aprovaram o PL 3461/2019, de autoria do senador Fernando Bezerra Coelho (MDB/PE), que concede personalidade jurídica aos chamados “condomínios edilícios”, aqueles que têm ao mesmo tempo área privativa do morador e áreas comuns compartilhadas. Segundo o relator, senador Mecias de Jesus (Republicanos/RR), a proposta gera segurança jurídica aos condôminos.

Fonte: Agência Senado e ConJur.