Ministra Rosa Weber (ao centro) e ministro Ricardo Lewandowski são os mais antigos do Supremo Tribunal Federal. Foto: Ascom/STF.

A emenda à Constituição Federal de 88, conhecida como a PEC da Bengala, foi promulgada pela Mesa do Congresso Nacional, em maio de 2015, quando presidia o Senado e o Congresso o senador Renan Calheiros, e presidia a Câmara, o deputado Eduardo Cunha, posteriormente cassado por decisão do plenário da Câmara, por quebra de decoro parlamentar. O apelido de PEC da Bengala foi dado por se tratar de alteração constitucional para permitir que ministros das Cortes superiores da nossa Justiça tivessem o privilégio de aposentarem-se, compulsoriamente, aos 75 anos, quando todos os servidores aposentam-se aos 70 anos.

Até agora, seis anos depois da promulgação da PEC da Bengala, ainda não foi editada a Lei Complementar, que deveria orientar o processo de aposentação dos ministros, e já se cuida de fazer uma nova alteração no texto constitucional para voltar à aposentadoria compulsória para o teto dos 70 anos. A alegação da deputada Bia Kicis (PSL), primeira signatária do projeto, é a de que ela oxigenará as Cortes superiores dando chance a magistrados que, ao longo de anos permanecem trabalhando nas entrâncias inferiores do Judiciário, exatamente pelo longo tempo de permanência no cargo dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Os ministros do Tribunal de Contas da União (TCU) também foram beneficiados com a PEC da Bengala.

Em parte, o argumento da deputada é aceitável, mas a solução não está na mudança do texto da Constituição, no momento conveniente a esse ou aquele quadro político nacional. Os ministros na área do Judiciário e na Corte de Contas nacional, poderiam ter mandato com tempo certo, escolhidos da forma como hoje é feita. E, dependendo do tempo estabelecido para cada mandato, aconteceria a oxigenação sugerida pela parlamentar bolsonarista. Dez anos de mandato para um integrante do STJ, e de quinze anos para o de um membro do STF, sem renovação, é de bom tamanho. A diferença entre um e outro pode justificar-se com a alegação de que para o STJ, fora do quinto constitucional, só vai magistrado, portanto um juiz já com alguns anos de atividade judicante. Para o STF, pode até ir, mas nem sempre vai magistrado, portanto, a quase totalidade dos indicados não teve tempo de atividade como julgador.

Ademais, a proposta ora em discussão na Câmara, com boas perspectivas de ficar travada no Senado, não gerará, de imediato, nenhuma mudança no Supremo Tribunal, como de início pensaram a deputada e seus apoiadores, pois no Brasil, essa mesma Constituição desrespeitada por quem a jurou cumpri-la, garante a coisa julgada e o direito adquirido. Aqui, no Ceará, temos exemplos de respeito à coisa julgada e o direito adquirido com pensões pagas a ex-governadores, em valores bem superiores ao que ganha hoje o governador do Estado. Os ex-governadores garantiram as pensões com base num dispositivo da Constituição do Ceará, à época em que implementaram o direito à pensão. Naquele momento a Constituição do Ceará dizia que a pensão de ex-governador era o que ganhava a “qualquer título” o presidente do Tribunal de Justiça. Governador do Ceará ganha hoje, aproximadamente, metade do subsídio de um desembargador.

Portanto, iniciativa como a da deputada Bia Kicis, e dos colegas que lhes emprestam apoio, com o complemento político que a proposição encerra, não passa de mais uma agressão à norma maior do nosso Ordenamento Jurídico. Além do mais, expõe gratuita e desrespeitosamente a todos quantos venham a ser indicados para tais cargos por sinalizar que eles chegam lá comprometidos com quem os indica. E não é assim, a não ser que o indicado, realmente, não seja um verdadeiro cidadão. Este, cioso dos seus deveres com o cargo e com a Nação, obedece sua própria consciência e as leis do País.

A proposta de emenda subscrita pela deputada Bia Kicis é a de número 159. Ela foi apresentada em 2019, logo no início do Governo Bolsonaro, quando praticamente estavam iniciando as investidas dos bolsonaristas contra decisões dos ministros do Supremo. A alegação de a iniciativa visar a oxigenação daquela Corte soa falso, pois o propósito mesmo é o de proporcionar a Bolsonaro indicar um maior número de ministros, como se os indicados fossem ser os tarefeiros do Presidente na Corte Suprema do País.

Veja o comentário do jornalista Edison Silva sobre o tema: