O procurador-geral da República, Augusto Aras, enviou manifestações ao Supremo Tribunal Federal (STF) relativas a duas Ações de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPFs) que discutem questões eleitorais.

Na ADPF 824, Aras foi contra pedido de suspensão do entendimento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de validar convenção partidária presidida por pessoa com direitos políticos suspensos em razão de condenação por improbidade administrativa.

Em outra frente, na ADPF 776, o PGR foi favorável ao pleito do partido Progressistas para que não seja aplicada nos processos referentes às eleições de 2020 a nova orientação jurisprudencial firmada pelo TSE relativa ao efeito suspensivo de recurso ajuizado contra pena de inelegibilidade.

No âmbito da ADPF 824, o Partido Solidariedade sustenta que, ao permitir convenções partidárias presididas por pessoas com direitos políticos suspensos, o TSE promoveu uma “viragem jurisprudencial”, violando o princípio constitucional da anualidade eleitoral. Mas, de acordo com o PGR, não houve mudança de entendimento, uma vez que não existia jurisprudência consolidada sobre o assunto.

No parecer, Aras destaca que o tema já havia sido julgado, de forma contrária, pelo TSE, em dois outros processos (dezembro de 2016 e março de 2017). Os julgamentos eram referentes ao mesmo pleito (eleições proporcionais de 2016 no município de Natividade-RJ) e resultaram do exame de agravos regimentais de decisões monocráticas do mesmo ministro e nos quais não houve qualquer debate em Plenário a respeito do tema.

“Assim, não havia jurisprudência consolidada do Tribunal Superior Eleitoral sobre o assunto. Existiam duas únicas decisões em que o tema sequer foi discutido com profundidade”, reforça o procurador-geral.

Em outro trecho da manifestação, o PGR concorda com o posicionamento do TSE, no sentido de que não se pode ampliar o conceito de viragem jurisprudencial para “abarcar uma simples variação da jurisprudência em tema ainda incipientemente analisado, sob pena de tolher a efetividade da tutela jurisdicional eleitoral”.

ADPF 776

A “viragem jurisprudencial” também é tema da ADPF 776. Nesse caso, o partido Progressistas questionou o entendimento do TSE que limitou o efeito suspensivo em recurso eleitoral apenas quanto à parte da decisão judicial que declara a cassação de registro, o afastamento de titular ou a perda de mandato eletivo.

Antes de novembro de 2020, quando passou a vigorar a nova orientação, o TSE entendia que o recurso ordinário, previsto no Código Eleitoral, tinha efeito suspensivo amplo quando a decisão questionada representasse cassação de registro, afastamento de titular ou perda de mandato eletivo. Ou seja, bastava a interposição do recurso para interromper a eficácia de toda a decisão questionada, alcançando, por exemplo, também, a inelegibilidade.

A legenda alegou que a nova interpretação violaria os princípios da separação dos Poderes, da reserva legal e da anterioridade em matéria eleitoral, e solicitou que o STF não permitisse a aplicação imediata do entendimento nos processos referentes às eleições de 2020.

Na avaliação do PGR, o pleito deve ser atendido, uma vez que as decisões do Tribunal Superior Eleitoral que impliquem mudança da jurisprudência até então firmada e que repercutam nos resultados da eleição não têm aplicabilidade imediata ao caso concreto e somente terão eficácia sobre outros casos no pleito eleitoral posterior.

No parecer enviado ao STF, Augusto Aras reforçou que o artigo 16 da Constituição Federal determina que a lei que alterar o processo eleitoral não se aplica “à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência”. A avaliação é de que o dispositivo constitucional protege, simultaneamente, os princípios democráticos, da igualdade de chances e da segurança jurídica.

“As regras do processo eleitoral não podem ser alteradas quando já iniciado o processo, muito menos depois de encerrado. É corolário da segurança jurídica que os partícipes do processo eleitoral (partidos políticos, candidatos, eleitores) não sejam surpreendidos com alterações nas “regras do jogo”, sustenta Augusto Aras.

O PGR alerta, também, que a ADPF não discute a correção ou não da interpretação legal fixada pelo TSE. No entanto, como configura uma “viragem jurisprudencial”, o entendimento não poderia se aplicar ao processo eleitoral já encerrado, sob pena de violação dos princípios da anualidade eleitoral e da segurança jurídica.

Fonte: site do MPF.