Luís Roberto Barroso deferiu cautelar na ação ajuizada pelo Partido Socialista Brasileiro – PSB. Foto: ASCOM/STF.

O Supremo Tribunal Federal (STF) declarou a inconstitucionalidade de interpretações de dispositivos do Decreto 9.546/2018 que excluam o direito de candidatos com deficiência à adaptação razoável em provas físicas de concursos públicos.

Também considerou inconstitucional a submissão genérica de candidatos com e sem deficiência aos mesmos critérios em provas físicas, se não ficar demonstrada a sua necessidade para o exercício da função pública.

O princípio da adaptação razoável designa as modificações e os ajustes necessários que não acarretem ônus desproporcional ou indevido.

Em decisão unânime, o colegiado confirmou a cautelar deferida pelo ministro Luís Roberto Barroso na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6476 e converteu o julgamento do referendo em análise de mérito, na sessão virtual encerrada no último dia 3 de setembro

A ADI foi ajuizada pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB) contra o decreto de 2018, que, ao alterar o regramento anterior (Decreto 9.508/2018) sobre reserva de vagas para pessoas com deficiência nos concursos para a administração federal, excluiu a previsão de adaptação das provas físicas para esse grupo e estabeleceu que os critérios de aprovação nessas provas poderão ser os mesmos aplicados aos demais candidatos, entre outras disposições.

Direitos das Pessoas com Deficiência

Em seu voto, o ministro Barroso observou que a Constituição Federal, em relação ao trabalho de pessoas com deficiência, proíbe qualquer discriminação relativa a salário e critérios de admissão (artigo 7º, inciso XXXI) e assegura a reserva de percentual de cargos e empregos públicos (artigo 37, inciso VIII).

Já a Convenção de Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD), incorporada à ordem jurídica brasileira com o status de emenda constitucional, veda qualquer tipo de discriminação em razão da deficiência que tenha o propósito ou efeito de impedir ou impossibilitar o reconhecimento, o desfrute ou o exercício de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas.

No mesmo sentido, o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015) também veda qualquer discriminação, inclusive nas etapas de recrutamento, seleção, contratação, admissão e exames admissional e periódico, bem como a exigência de aptidão plena.

Tecnologias assistivas

Em relação ao dispositivo que prevê a possibilidade de o candidato com deficiência utilizar, nas provas físicas, suas próprias tecnologias assistivas, sem a necessidade de adaptações adicionais, Barroso afirmou que a única interpretação constitucionalmente adequada é a que prevê uma faculdade em favor desse candidato.

Dessa forma, se um candidato surdo que usa aparelho auditivo considerar desnecessário qualquer tipo de adaptação adicional, ele pode dispensar, por exemplo, a presença de intérprete de Libras.

“A intenção, evidentemente, não é admitir a pessoa que não esteja apta ao exercício da função pública. Não se garantem as adaptações irrazoáveis e que não atendam a critérios de proporcionalidade. Por outro lado, é preciso eliminar toda barreira de acesso a cargos públicos às pessoas com deficiência que são aptas ao exercício da função”, pontuou o ministro.

Provas físicas

Quanto ao dispositivo que estabelece que os critérios de aprovação nas provas físicas poderão ser os mesmos para candidatos com e sem deficiência, o relator considerou que essa exigência só se sustenta quando for indispensável ao exercício das funções de um cargo específico, não se aplicando indiscriminadamente a todo e qualquer processo seletivo.

Jurisprudência

O ministro lembrou que o STF já enfrentou questões semelhantes e citou o julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 676335, em que foi estabelecido que a presunção de que nenhuma das atribuições dos cargos de natureza policial pode ser desempenhada por pessoas com deficiência é incompatível com a norma constitucional, que lhes garante a destinação de vagas em concurso público.

A eventual incompatibilidade com a função deve ser avaliada segundo os princípios do concurso público, da legalidade, da igualdade e da impessoalidade.

Com informações do STF.