Reunião da CPI das Associações de Militares na Assembleia Legislativa do Ceará. Foto: ALECE.

Na Assembleia Legislativa cearense foi instalada, recentemente, uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar o envolvimento de integrantes de Associações de Militares no financiamento do último motim de policiais cearenses, em 2020. Como todas as CPIs, esta também motiva divergências entre integrantes do Legislativo estadual, tanto em relação à constitucionalidade da investigação quanto à sua conveniência.

O deputado Salmito Filho (PDT) preside os trabalhos da investigação. Ele, pela respeitabilidade que tem emprestado a seus mandatos, inclusive como ex-presidente da Câmara Municipal de Fortaleza, transmite credibilidade ao trabalho junto com o relator da CPI, deputado Elmano Freitas (PT). Mas, como o objetivo da investigação é antes de tudo político, como todas as outras CPIs já produzidas, em qualquer das Casas legislativas brasileiras, o seu desenvolvimento haverá de gerar inflamados discursos.

Alguns percalços foram registrados pouco logo da sua instalação. O presidente natural da CPI deveria ser o deputado Romeu Aldigueri (PDT), autor do requerimento, apoiado por vários outros colegas. Representantes das investigadas, de pronto, fizeram um dossiê contra o deputado e ele desistiu de ser o presidente. A alegação de ser o presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Assembleia, foi a saída apresentada. Outros deputados, antes, já haviam recusado a indicação para membro da CPI, alegando razões menores.

A investigação, embora não seja diretamente ligada à Segurança, busca alcançar políticos a ela ligados, hoje, formando o núcleo central da oposição ao Governo do Estado. De fato, as associações, quase dez ao todo, com as exceções de praxe, são oposição ao Governo estadual, seja pelo interesse político de seus integrantes, seja pelo descontentamento das suas reivindicações não atendidas. As informações chegadas ao comando da CPI, informa o deputado Elmano, dão conta de as Associações terem movimentado, nos últimos anos, um montante de recursos da ordem de R$ 300 milhões. E parte desses recursos teria sido utilizada no financiamento do motim de 2020, além de contribuírem para financiamento de campanha de seus representantes, eleitos ou não para as Casas legislativas.

Representantes dos investigados contestam. E justificam a existência das Associações pela necessidade de dar o atendimento social negado pelo Estado a seus associados e familiares. Além do mais, questionam os representantes das Associações o fato de elas não dependerem de recursos públicos, posto sobreviverem de contribuições individuais de seus associados em média R$ 40 ou R$ 50 por mês. E eles, como fizeram no início, ensejando a desistência do deputado Romeu de presidir a investigação, parecem estar pronto para a luta.

A direção da Assembleia precisa estar atenta ao desenvolver dessa CPI. Embora a Comissão tenha todas as garantias constitucionais para o seu mister, sem interferência direta de terceiros, é preciso que o próprio Poder Legislativo esteja preparado para não deixar que haja excesso de parte a parte. As Associações não são Militares, mas são de militares. E estes não devem ser estimulados à desordem.

O corporativismo dos policiais pode ser maior que o dos políticos interessados nessa CPI. Se as associações realmente estão extrapolando ou extrapolaram e a Assembleia tem competência de contê-las, que o faça. Senão, reconhecendo necessidade de agir, recorra ao Judiciário, onde, aliás, já há demanda no mesmo sentido e em razão do tal motim de 2020.

Esta, como as demais CPIs, mesmo que não apresente um relatório final consistente, com razões de incriminar culpados, cumprirá o seu objetivo primeiro: o político. Ela, embora tenha muitos poderes, só o político é realmente o importante. Suas recomendações, por mais severas que sejam, dependerão de outros agentes públicos, ou mais precisamente dos representantes do  Ministério Público, no caso de infringências ao ordenamento jurídico penal. No caso de questões administrativas nada pode fazer o Legislativo e nem o Executivo, pois essas Associações são entes privados.

Veja o comentário do jornalista Edison Silva: