Ministro do Tribunal Superior Eleitoral, Alexandre de Moraes. Foto: Fábio Rodrigues/Agência Brasil.

Para o ministro Alexandre de Moraes, o Tribunal Superior Eleitoral deve relativizar a regra do Código de Processo Civil que define como impenhoráveis os recursos do Fundo Partidário, na hipótese de ela impedir que partidos políticos cumpram condenações judiciais com determinação de restituição ao tesouro público.

A proposta foi feita em julgamento iniciado na noite de terça-feira (17) e interrompido por pedido de vista do ministro Mauro Campbell.

No caso, o diretório baiano do MDB teve a prestação de contas de 2018 aprovada com ressalva, com ordem de devolução de R$ 18 mil aos cofres públicos.

O caso transitou em julgado e, mesmo após intimação no cumprimento de sentença, o partido nada fez. Com isso, a Advocacia-Geral da União requereu o bloqueio do valor atualizado de R$ 23,2 mil em contas do diretório.

O MDB impugnou o cumprimento da sentença sob a justificativa de que os valores bloqueados estão em conta na qual recebe verbas do Fundo Partidário, as quais são impenhoráveis de acordo com o artigo 833, inciso XI do Código de Processo Civil.

“Aqui, me parece que a Justiça está sendo duplamente ridicularizada”, disse o ministro Alexandre, relator do caso. “Primeiro porque sua decisão de aprovação das contas com ressalvas e determinação de devolução simplesmente foi ignorada. E no segundo momento, esse mesmo Fundo que foi usado ilicitamente vai continuar com o partido, porque não vai usar dele para pagar o que deve à Justiça”, continuou.

O Tribunal Regional Eleitoral da Bahia adotou o mesmo entendimento e afastou a impenhorabilidade da verba. A Corte entendeu que afastar o bloqueio transformaria em tábula rasa do princípio segundo o qual “a ninguém é dado beneficiar-se da própria torpeza”.

“Estaríamos aqui a incentivar os partidos a terem suas contas rejeitadas, porque não daria em absolutamente nada”, criticou o ministro Alexandre de Moraes.

Ele defendeu que a regra do inciso XI do artigo 833 do CPC foi editada com o objetivo de impedir que eventuais penhoras acabassem dificultando ou obstaculizando o exercício do próprio partido político. E não para ser usada como escudo para atividades ilícitas.

Por isso, defendeu não o afastamento, mas a flexibilização excepcional da norma. Caso contrário, o partido que tem como única forma de financiamento recursos do Fundo Eleitoral poderá continuar gastando erroneamente. “Se não for nessa hipótese [da penhora], não há outro meio para promover essa devolução aos cofres públicos”, pontuou.

A regra é clara

Abriu a divergência o ministro Luís Felipe Salomão, apoiado em precedente de sua própria relatoria julgado na 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça em outubro de 2020. Na ocasião, o colegiado entendeu que recursos do Fundo Partidário são impenhoráveis mesmo para dívidas de propaganda eleitoral, que é uma das formas de aplicação da verba pública previstas na legislação.

Isso porque as regras de impenhorabilidade estão dispostas nos incisos do artigo 833. Na sequência, os parágrafos trazem as exceções. “Não se poderia cogitar de exceções onde há regra cogente, salvo se estiverem previstas na lei”, disse o ministro Salomão.

Relativizar a impenhorabilidade do Fundo Eleitoral abriria portas para fazer o mesmo em outras situações expressamente fixadas em lei. “Quando quis excepcionar, o próprio código fez. Não deu margem, em meu modo de pensar, para interpretação extensiva, ainda que em caráter excepcional”, concluiu.

A única saída

O ministro Alexandre de Moraes pediu a palavra para dizer que a regra da impenhorabilidade faz sentido quando se tratar do diretório nacional do partido. Nesses casos, é possível impor que, no próximo repasse dos recursos públicos, os valores pendentes em prestação de contas sejam descontados.

O problema é que os diretórios estaduais e municipais recebem dinheiro do fundo Partidário pelos seus diretórios nacionais. Ou seja, a Justiça Eleitoral não tem como agir para impedir que o repasse de determinadas quantias ocorram para determinados diretórios, como no caso do MDB da Bahia.

“Quando se trata do diretório nacional, nós não penhoramos o que tem. Nós sustamos o repasse das próximas cotas. O sistema fecha. Nem o CPC, nem a decisão do STJ pensaram em nível estadual e municipal — e nem poderia, pois não estava em julgamento. Se essa mesma hipótese ocorre em nível estadual ou municipal, o que fazer? Nada”, criticou.

“Quando suspendemos o repasse, é pena. Não é penhora”, disse o ministro Salomão. Ele elogiou a proposta do relator, que alia a questão teórica à prática, mas manteve a divergência por conta da regra expressa em lei.

Fonte: site ConJur.