“Atos praticados por um ou outro servidor não podem ser transferidos ao governo como um todo”, defendeu Fernando Bezerra. Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado.

Para o líder do governo, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), o depoimento de Cristiano Carvalho, representante da empresa Davati, deu vazão a mais uma “narrativa falsa” de que teria havido corrupção no governo.

Ele ainda fez questão de defender Elcio Franco. Admitiu que os áudios e mensagens trazidos por Carvalho são “constrangedores”, mas o compliance do governo teria funcionado e, segundo Bezerra, nenhum ato corrupto se consumou.

— Manifesto meu desconforto com os diálogos que foram mantidos entre representantes da Davati e servidores públicos ou ex-servidores públicos, numa narrativa em que a gente constata a falta de credenciamento, capacidade técnica, para que a Davati ou seus eventuais representantes pudessem tratar com o governo. Estou realmente constrangido com os diálogos que estão sendo aqui mostrados, mas é importante deixar claro que apesar de todos estes equívocos ou transgressões que possam ter sido praticados, as negociações não foram à frente, não se comprou uma dose de vacina da Davati. Atos praticados por um ou outro servidor não podem ser transferidos ao governo como um todo. Não tinham vacina pra vender, nenhuma vacina foi comprada e o coronel Franco barrou a negociação, a fraude — afirmou Fernando Bezerra.

Durante seu depoimento, Cristiano Carvalho atribuiu a terceiros o fato de ter recebido o auxílio emergencial pago pelo governo no ano passado. Pressionado por Marcos Rogério (DEM-RO), acabou admitindo que pediu o auxílio por conta própria, e que já teria iniciado gestões para devolver o dinheiro que recebeu. Diante da revelação, Marcos Rogério chegou a pedir a prisão de Carvalho, mas não foi atendido por Aziz.

– Será que o depoente mentiu só neste caso? Existiu uma coisa muito estranha: a tentativa de golpe ao Ministério e a um conjunto de governos e prefeituras. Quem está dando validade, palco a trambiqueiro, é a CPI da Pandemia, não é o Ministério. O Ministério expurgou esta tentativa de venda do nada, de vacinas nem existentes, nos trâmites de compliance. Lá não teve êxito. O que não avançou um milímetro no Ministério aqui é tratado como “muito importante”. Qual o crime? O que foi contratado? O que foi entregue? O que foi pago? Nada. Ofertou o que não tinha, tentou enganar o Ministério, e agora usa a CPI pra criar narrativas. Nenhum centavo foi pago — reclamou Marcos Rogério.

Os senadores Marcos do Val (Podemos-ES), Eduardo Girão (Podemos-CE) e Luís Carlos Heinze (PP-RS) defenderam posições semelhantes, que os mecanismos de compliance funcionaram e nenhum recurso público foi desperdiçado.

Alto escalão

Já a senadora Simone Tebet (MDB-MS) observou que, mesmo sem ter condições de confirmar capacidade fiscal e regularidade jurídica, conseguiu chegar ao mais alto escalão do Ministério da Saúde. Para ela, a CPI revelou uma briga de quadrilhas no âmbito da pasta da Saúde, sendo um grupo de servidores civis e outro de militares.

— Havia um núcleo de agentes políticos e agora um núcleo militar numa briga interna para a compra de vacinas. Mas não no sentido de conseguir vacinas para colocar no braço da população. Mas para fazer qualquer tipo de negociação, de negociata. Tudo nos leva a crer que são brigas de quadrilhas: atravessadores e agentes que queriam vender vacinas sem saber sequer se tinha — disse Simone Tebet, lembrando que o governo Bolsonaro perdeu tempo para comprar vacinas de eficácia reconhecida e de forma direta com os laboratórios.

O senador Rogério Carvalho (PT-SE), por sua vez, apresentou conversa obtida no celular do PM, Dominguetti, na qual uma pessoa estaria afirmando que outro dos intermediários da Davati, o reverendo Amilton, chegou a se encontrar com o presidente da República.

— Uma senhora identificada, no celular dele, como Maria Helena Embaixada, do dia 16 de março, confirma que houve esse encontro, ou seja, não temos mais dúvidas disso. Houve o encontro entre o presidente Bolsonaro e o reverendo das armas. Deixa eu mostrar aqui a conversa de Maria Helena. Ela diz: ‘Ontem o reverendo esteve com o presidente’. ‘Sim’, Dominguetti responde. Depois: ‘O problema não é o presidente, mas o Ministério da Saúde, lá é complicado’, responde o Dominguetti. Encontro em que estava combinado para tratar sobre o contrato com a Davati. Então, o presidente estava envolvido, sim, nesta negociata — disse Rogério Carvalho.

Em resposta ao senador Izalci Lucas (PSDB-DF), Cristiano Carvalho afirmou que a proposta da Davati ao Ministério da Saúde originalmente era endereçada ao ex-secretário-executivo Elcio Franco, mas o nome foi substituído pelo do ex-diretor de Logística Roberto Dias. A mudança teria sido um pedido do tenente-coronel Marcelo Blanco, ex-número 2 de Dias no departamento. Naquele momento, Blanco já estava exonerado e atuava como representante de vendas junto ao Ministério, intermediando a negociação com a Davati. Izalci observou que a empresa de Marcelo Blanco foi criada três dias antes do encontro de Roberto Dias com o policial Luiz Paulo Dominguetti.

Carvalho também confirmou ao senador os nomes de duas pessoas que estavam presentes em uma reunião no Ministério com Elcio Franco: Laurício Monteiro Cruz, então diretor de Imunização e Doenças Transmissíveis da Secretaria de Vigilância em Saúde, e Hardaleson Araújo de Oliveira, major da Força Aérea que não tinha cargo na pasta.

Comissão de US$ 0,20 

Durante o depoimento, Carvalho disse ainda que a Davati receberia uma comissão de US$ 0,20 por vacina vendida ao Ministério, e que todos os envolvidos na negociação receberiam suas partes.

— Como estávamos lá através da Senah, a Senah teria uma participação, acredito que o Instituto Força Brasil teria sua participação também, o Dominguetti teria sua participação, a própria Davati teria sua participação nos Estados Unidos, e eu também teria alguma participação.

Fonte: Agência Senado.