Deputada Margarete Coelho (PP/PI) chamou a atenção para a falta de controle da internet durante as eleições. Foto: Vinicius Loures/Câmara dos Deputados.

Uma reforma do sistema eleitoral no Brasil deve pensar como a participação dos cidadãos na eleição pode ser mais instruída e colocá-los no centro do debate.

Essa é a opinião da deputada federal Margarete Coelho (PP-PI), doutora em Direito e Políticas Públicas (UniCeub), e do professor Orjan Olsen, presidente da Analítica Consultoria e doutor pela Universidade de Syracuse (EUA).

Os dois participaram, na segunda-feira (21), de evento do ciclo de debates “Reforma Política e Democracia: um olhar para o futuro”, promovido pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP). O tema desse terceiro encontro do ciclo foi “Reforma Eleitoral e Democracia Participativa“.

A deputada Margarete Coelho é relatora de Grupo de Trabalho (GT) na Câmara Federal que discute a reforma do Código Eleitoral e a criação de um Código de Processo Eleitoral. Ela afirmou que a intenção é sistematizar o processo eleitoral no Brasil, que hoje é confuso e não coloca o eleitor no centro do debate do sistema.

Além disso, pontuou que há necessidade de tornar a legislação clara e uniforme, facilitando o controle social do processo eleitoral. Atualmente não existe um texto que envolva todos os dispositivos sobre o processo, esses estão pulverizados em diversos diplomas e em resoluções do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Margarete destacou em sua fala alguns dos pontos mais relevantes do trabalho do GT na Câmara. Primeiro, a utilização da internet nas eleições, e como essa pode deturpar o processo de escolha por meio de abusos. Em sua opinião é importante controlar o financiamento do discurso de ódio, sem mitigar a liberdade de expressão do cidadão comum. Por isso, para tipificação como crime deve ocorrer disseminação por empresa que lucra com esse serviço; o discurso tem que ser sabidamente inverídico; e deve haver o dolo específico em atacar a democracia.

Além disso, a moderação dos conteúdos deve ser feita pelo judiciário. Assim, o que a reforma busca é que o eleitor possa receber o maior número de informações verdadeiras possíveis.

Inelegibilidade

Segundo o relatório da deputada, outro tema sensível é sobre a inelegibilidade. A Constituição não permite cassação dos direitos políticos, mas como hoje a inelegibilidade é usada como pena ela acaba se tornando um banimento da política (em alguns casos pode chegar a 30 anos). A proposta, então, seria a detração (efeito de desvalorizar) da pena.

Opinou ainda pela criação de cadeiras para mulheres, não só na Câmara, mas em todas as circunscrições. A mulher ainda participa de forma desequilibrada na política: cerca de 700 municípios não têm nenhuma mulher atuando no legislativo e em três estados nenhuma mulher foi eleita para a Câmara Federal. A cadeira seria um gatilho: se nenhuma mulher assumiu, as mais votadas substituem o candidato menos votado do partido (eleito pela legenda).

Pesquisa

O professor Orjan Olsen, por sua vez, apresentou pesquisas promovidas por ele, que demonstram que a maioria do eleitorado brasileiro não tem conhecimento dos debates que estão ocorrendo no âmbito eleitoral. Com base em pesquisas de opinião pública, constatou que a confiança nas instituições está no seu ponto mais baixo — apenas 32% confiam na Presidência; 15% no Senado; 10% na Câmara dos Deputados e 9% nos partidos.

Além disso, 48% das pessoas consideram o Congresso Nacional como ruim ou péssimo. Uma reforma eleitoral teria que ser no sentido de melhorar essas porcentagens, apontou o professor.

A representatividade eleitoral é outro ponto da pesquisa, pois 73% da população com idade para votar tem ido às urnas, porém o voto efetivo está diminuindo (32.2% dos eleitores acabaram não escolhendo um partido ou candidato em 2018). O voto distrital poderia aproximar os candidatos dos eleitores, porque dependeria menos das grandes mídias.

De acordo com Olsen o país não tem estabilidade. Em cerca de 600 municípios o número de eleitores aptos é maior que a população apontada pelo IBGE. Assim a questão do censo torna-se fundamental e a posse de título de eleitor deve ser levantada no censo, para que se tenha controle do número real de eleitores e, então, formular reformas amparadas em dados precisos.

Voto distrital e distritão

Segundo Olsen a mudança para o voto distrital misto ou distritão não afetaria muito o número de partidos no sistema atual, não resolvendo o problema da fragmentação partidária.

O que mudaria seriam os eleitos: 65 candidatos seriam substituídos com o distritão e aproximadamente 131 com o voto distrital misto. Com o distritão surgiria uma tendência de saída de candidatos de histórico recente, com menos votos, puxados pelos mais votados. Ou seja, muito dos votos casados cairiam fora, e seriam substituídos por nomes mais conhecidos de partidos mais tradicionais.

Hoje, candidatos pesam mais que partidos, e os “puxadores” de votos tem muita influência, isso gera instabilidade no sistema, demonstrou o professor. Outro fator de instabilidade do sistema eleitoral é a grande renovação que vem ocorrendo e cresceu na eleição de 2018 (31,9%). O debate sobre a reforma precisa tratar da qualidade da representação, precisam ser propostos mecanismos de controle, diminuindo partidos e visando a criação de blocos ideologicamente homogêneos, assim ficaria mais fácil do eleitor entender a diferença entre eles.

O voto distrital puro reduz a possibilidade do candidato de voto espalhado se eleger. Por outro lado, o voto distrital misto garante a representação geográfica adequada e permite que figuras que representam ideias também sejam eleitas. O debate tem que levar em conta as consequências do processo escolhido.

O professor da Universidade de São Paulo e ex-advogado geral da União, José Levi do Amaral, também se manifestou no evento. Para ele o sistema proporcional apesar de dar representatividade para minorias, tem algumas desvantagens: não gera vínculo entre eleito e eleitor e gera um sistema mais caro. Já o sistema distrital gera o vínculo entre eleito e eleitor, além de diminuir o custo, pois os candidatos estarão em uma base restrita e não vão competir com pessoas do seu próprio partido.

O distritão, por sua vez, representa o voto majoritário plúrimo (por exemplo, em São Paulo seriam eleito os 70 mais votados), não é proporcional, não é amigo de minorias. Na opinião do ex-AGU, se for para pensar em algo, que seja o distrital misto, porque esse é proporcional.

Por fim, a deputada Margarete argumentou que a modalidade que se discute hoje na Câmara é o distritão com fidelidade partidária (a candidatura não pode ser avulsa) e com quociente eleitoral (só concorrem as vagas os partidos que atingirem o quociente eleitoral). Entende que não há necessidade para tantos candidatos, e o ideal é limitar um candidato por vaga no sistema proporcional, criando relacionamento mais próximo com o candidato.

Proporcional x Distritão

No sistema proporcional o eleitor vota em candidatos ou na legenda. As cadeiras são distribuídas com base na votação total do partido e de todos os seus candidatos, mesmo aqueles que não forem eleitos. Por isso, às vezes um candidato é eleito mesmo recebendo menos votos do que um concorrente. Basta ele pertencer a um partido que tenha reunido, no total, mais votos.

No distritão são eleitos os mais votados em cada estado. Os votos em candidatos não eleitos não influenciam a distribuição das cadeiras. Os votos dados em excesso aos eleitos também não.

Assim, segundo pesquisa do jornal Folha de São Paulo, se o distritão estivesse valendo em 2018, 30,5% dos votos válidos elegeriam os 513 deputados, e 69,5% dos votos válidos não teriam nenhum peso nessa eleição. Com isso, 68 milhões de votos para deputado seriam desprezados.

Fonte: ConJur.