O ex-prefeito de Fortaleza, Roberto Cláudio (PDT), abordou, em entrevista à TV Democracia, o cenário brasileiro diante do enfrentamento à pandemia causada pela Covid-19.

Em resposta aos questionamentos dos jornalistas Fábio Pannunzio e Florestan Fernandes Júnior, o médico sanitarista, ph.D em saúde pública, avaliou o cenário vigente e defendeu a união de esforços preventivos e assistenciais em todas as esferas da administração pública.

Ao analisar os indicadores epidemiológicos nacionais, marcados por expressivos índices diários de óbitos pela doença, o atual vice-presidente da Frente Nacional dos Prefeitos (PNF) enfatizou a relevância do papel da ciência, da coesão social e da civilidade.

“Chegamos ao trágico e inimaginável número de 340 mil mortos pela Covid no País. Recentemente, alcançamos o número diário de 4.200 óbitos. Diante de um cenário trágico, infelizmente, temos assistido à política do confronto partindo da autoridade máxima do País. O Governo Federal negou o problema, não fez campanhas de comunicação e, inicialmente, desprezou a vacina, gerando confusão de informação, promovendo a não adesão às medidas sanitárias e ampliando a disseminação viral. A prevenção deve ser promovida pela mudança de hábitos. A saída para o atual cenário se dará, também, por meio da vacinação em massa, sobretudo dos grupos de risco”, introduziu.

O papel do municipalismo, nessa perspectiva, vem incorporando importante colaboração frente à missão de salvar vidas. “Se a liderança municipal não for promotora, propulsora e incentivadora de comportamentos exemplares, o cenário não irá mudar. É fundamental que um prefeito busque garantir o cumprimento de medidas sanitárias indispensáveis, a exemplo do isolamento social, a partir de seus decretos, de seus órgãos de fiscalização e de saúde”, declarou.

Mesmo diante de divergências ideológicas instaladas na esfera política nacional, Roberto Cláudio analisou positivamente a estratégia implantada por diversos administradores municipais e estaduais. “A despeito dos maus exemplos do Governo Federal, é possível observar uma grandiosíssima maioria de gestores buscando agir responsavelmente. Mesmo prefeitos e governadores alinhados ao presidente têm praticado, de forma solidária, a emissão de mensagens favoráveis ao controle da disseminação viral”, observou.

Sinalização positiva

Nesse sentido, o ex-prefeito e atual pós-doutorando em Ciências Econômicas defendeu a integração entre todas as esferas de governo. “Não se vê uma atitude proativa, nacionalista e engajada com valores humanos básicos vinda do Governo Federal. Mas isso não é ideologia. A união deve ser uma questão ética e humanitária. Portanto, se houver uma mudança positiva de postura, pautada por gestos corretos, cientificamente embasados e socialmente humanitários, haverá toda a nossa solidariedade e apoio”, garantiu.

Aquisição de imunobiológicos

Questionado acerca das diretrizes implantadas para a aquisição de imunobiológicos contra a doença, o pedetista criticou a compra de vacinas pelo setor privado. Para ele, a liberação configura grave ofensa às autoridades de saúde pública, que, ao longo dos anos, consolidaram a estrutura de imunização do País.

“De um lado, temos visto, de forma criminosa, setores da elite, irresponsavelmente, adquirindo materiais clandestinos para fazer imunização. De outro, o Congresso, sem nenhuma base científica, para a nossa surpresa, está legitimando um desrespeito e um atropelo às normas sanitárias. Certamente, em um país severamente desigual como o nosso, a consequência será o favorecimento dos mais ricos no acesso à vacina”, ressaltou.

Em sua explanação, Roberto Cláudio defendeu o patamar referencial conquistado pelo Sistema Único de Saúde. “Ao longo dos anos, o Brasil virou exemplo para a Organização Panamericana de Saúde graças à boa burocracia governamental que criou regras, fortaleceu pesquisas, estudou e compartilhou conhecimento com o mundo. Por meio de um SUS capilarizado e descentralizado, passamos a dar exemplo para o mundo”, disse.

Críticas às notícias falsas

Na avaliação do ex-prefeito, o combate às notícias falsas, amplamente disseminadas na contemporaneidade, também configura importante elemento a ser debatido. “Há diversos sofismas, falsas histórias e controversos debates criados. Falam, por exemplo, em números maquiados. Na verdade, não há poder político para influenciar hierarquias de servidores, médicos, unidades hospitalares, órgãos de medicina legal, secretários e demais pessoas que têm demonstrado respeito e compromisso com a saúde do País”, assegurou.

Papel do Estado

Os cenários locais, nacionais e internacionais, diante do contexto pandêmico, têm vivido o dilema de conciliar diretrizes sanitárias e econômicas. Nessa perspectiva, Roberto Cláudio defendeu o papel do Estado.

“Até as economias historicamente mais sólidas, com excedente de capital, com bases de igualdade e de infraestrutura, têm sofrido com a Covid. Mas essas nações, a exemplo EUA, da Alemanha e da França, ao invés de criarem um falso debate entre economia e saúde, têm cuidado das duas coisas. Diante do papel de ordem de segurança nacional e de proteção aos mais humildes, o Estado deve se sobressair para proteger os mais vulneráveis”, esclareceu.

Ao elogiar a performance do presidente norte-americano eleito, Joe Biden, Roberto Cláudio justificou a própria percepção. “Até nos EUA, berço da economia liberal, o presidente assumiu a Covid-19 como problema grave, como emergência nacional, mudou a curva de óbitos porque assumiu a vacinação como ação de proteção à vida e de retomada econômica”, exemplificou.

Os recursos investidos nos Estados Unidos superam a ordem dos R $4 trilhões. “Com esses valores, estão pagando auxílios emergenciais, apoiando micro e pequenas empresas, ampliando o seguro desemprego, fazendo investimentos sociais nas mais diversas áreas, além de um pacote de investimentos em infraestrutura para ajudar a retomar a economia”, elencou.

Aprofundamento da crise

Já no Brasil, o cenário econômico nacional apresenta sinais de preocupação em virtude do aprofundamento da crise. “Depois de meses de interrupção do auxílio emergencial, os indicadores preocupam. Dados recentes apontam que quase metade da população entrou em área de insegurança alimentar sem suporte calórico e nutricional adequado no mês. Agora, o auxílio será retomado pelo prazo restrito de  4 meses com valor médio de 250 reais, enquanto, no Brasil, uma cesta básica custa mais de
R$ 600,00. Não dá nem para comer”, lamentou.

Novas variantes virais circulantes

Ainda em relação à Covid-19, Roberto Cláudio, médico sanitarista, comentou o cenário vigente, composto pela circulação de novas variantes do novo coronavírus. “Nem toda variante deixa de ser coberta pelas vacinas existentes. Mas há o risco de, eventualmente, algumas não estarem no espectro de cobertura das vacinas atuais, o que demandaria o desenvolvimento de novas vacinas”, antecipou.

Nessa perspectiva, a celeridade da campanha de vacinação torna-se fundamental para reduzir a circulação viral, o surgimento e a transmissibilidade de novas mutações. “A saída é o bom senso. O governo americano e o governo inglês, por exemplo, seguem vacinando em massa e promovendo o isolamento da maneira que for necessária”, mencionou.

Defesa à democracia

Por fim, Roberto Cláudio discursou em defesa das instituições democráticas. “As maiores forças de democracia, o Judiciário, o Congresso, a imprensa, os movimentos sociais, a universidade e a ciência não podem ser escolhidos como adversários simbólicos. Diante da tragédia, da morte, do agravamento das questões sociais, são necessários o bom senso e a responsabilidade para governar”, concluiu.

Da assessoria do ex-prefeito.