Conselho Nacional de Justiça criou Grupo de Trabalho para debater e apresentar propostas. Foto: Gil Ferreira/CNJ.

Em 2020, dois assassinatos mobilizaram cidadãos em todo o mundo contra ações violentas praticadas por seguranças do setor privado e de agentes públicos. No caso do americano George Floyd e do brasileiro João Alberto Freitas de Porto Alegre, a violência foi letal.

Para buscar uma atuação que respeite os direitos de todos os cidadãos apesar de raça, gênero ou condição social, o Conselho Nacional de Justiça, por meio da Portaria 81/2021, criou um Grupo de Trabalho para debater e apresentar propostas de melhorias na área da vigilância privada no país.

A primeira reunião está marcada para 12 de abril. Coordenador do grupo, o conselheiro Mário Guerreiro explicou que o CNJ tem como objetivo contribuir na proposição de medidas que melhorem a prestação desse serviço, que atende praticamente todos os ramos de atividades, desde transporte, passando por hospitais, escolas, shopping centers, comércio de rua, até festas e shows.

“O GT vai estudar e conversar com especialistas em vigilância pública e privada, e pretende sugerir melhorias legislativas, ideias novas que contribuam para construirmos uma segurança mais humana e confiável”, afirmou.

Integrante do GT, a juíza Karen Luise Vilanova de Souza Pinheiro diz que é primordial que se encontre soluções que aprimorem o trabalho dessas empresas ao mesmo tempo que garanta a vida das pessoas. A magistrada coordenou a primeira sessão de mediação no caso da morte de João Alberto, entre o Carrefour, a empresa de segurança contratada (Vector) e entidades de defesa dos direitos humanos, para que fossem pagas indenizações.

“Apesar de chocantes, esses casos não são raros. Eles ganharam repercussão, mas infelizmente essa é uma situação corriqueira entre indivíduos negros”, afirmou a juíza, que também está contribuindo com seu conhecimento para que a Câmara dos Deputados formule propostas de uma legislação antirracista.

Para Karen, que é titular da 1ª Vara do Júri de Porto Alegre, a violência tem como base o racismo e não é possível admitir que profissionais de segurança sejam preparados com estereótipos raciais de suspeitos. Na opinião da magistrada, a violência e o abuso policial ou de seguranças privados são, também, decorrentes da falta de preparo desses profissionais.

“Temos de reconhecer que nossa sociedade é racista. As pessoas negras estão sempre em suspeição em nosso país. No passado, houve uma política de Estado que moldou as relações raciais injustas. Para desconstruir isso também é preciso políticas de Estado que reeduquem a população, que desnaturalizem a violência nos corpos negros”, disse Karen Luize, que também é formadora da Escola Nacional de Formação de Magistrados (Enfam).

Controle
A fiscalização das atividades no ramo da segurança privada é de competência da Polícia Federal. Mas o número de empresas e de profissionais que atuam na área é grande demais e supera a possibilidade de um controle efetivo. “Há muita gente nesse negócio. O número de seguranças privada é, no mínimo, três vezes maior que o de policiais”, diz o diretor-executivo da ONG Viva Rio, o antropólogo Rubem César Fernandes, também membro do grupo de trabalho.

Levantamento do Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2020 revelou um contingente de mais de um milhão de pessoas trabalhando com vigilância privada no Brasil. No Sistema de Segurança, são 540 mil agentes, incluindo federais, civis e militares.

A situação da segurança privada também impressiona pela variedade na qualidade dos serviços prestados pelas empresas. Segundo Rubem César, em geral, elas são criadas por policiais ou ex-policiais e muitas são extremamente zelosas e bem qualificadas. No entanto, há também aquelas cujas ações se assemelham a das milícias, “no limite da criminalidade”, pondera.

Para o especialista na área de segurança, uma saída possível para aprimorar o trabalho das empresas seria a criação de um selo de qualidade com base em critérios específicos para a contratação dessas empresas. Entre os pontos a favor estariam aquelas que treinam seu pessoal com orientações em direitos humanos e que estão em dia com as exigências da Polícia Federal, inclusive no que se refere a avaliações físicas e psíquicas.

O GT da segurança privada concretiza mais uma proposta apresentada pelo Observatório dos Direitos Humanos do Poder Judiciário, criado em 17 de setembro de 2020, pelo presidente do CNJ, ministro Luiz Fux, para fundamentalmente proteger e garantir os direitos humanos no âmbito da Justiça brasileira.

Fonte: site ConJur.