Segundo dados do Relatório Justiça em Números, cerca de dois milhões de processos do Poder Judiciário são relacionados ao direito à saúde. Foto: Pedro Ventura/Agência Brasília.

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), por meio do Fórum Nacional da Saúde, está estudando ações para atender a um possível aumento da judicialização no período pós-pandemia. A preocupação do colegiado é buscar a estruturação de ações e o diálogo interinstitucional. As medidas também estão sendo discutidas no âmbito dos Comitês Estaduais da Saúde, especialmente com o reforço para as ações conciliatórias.

Durante a crise sanitária gerada pelo novo coronavírus, muitos tratamentos eletivos foram suspensos, quer por receio dos pacientes em irem ao hospital, quer por necessidade da instituição de saúde em focar no atendimento dos casos de Covid-19.

Com isso, espera-se que essa demanda reprimida sufoque o sistema de saúde e os casos acabem na Justiça. Nesse sentido, o Fórum está elaborando um plano de ação, que tem por fundamento o monitoramento das demandas de saúde destinadas ao atendimento de serviços previstos nas políticas públicas de saúde, principalmente na atenção primária e secundária. A finalidade é fomentar a execução das políticas na atenção básica e especializada à saúde e, em última análise, prevenir a judicialização.

Para tanto, o Fórum da Saúde busca a estruturação de ações para organizar a atuação e o diálogo interinstitucional, e construir, juntamente com os gestores estaduais e municipais de saúde, uma política pública que não seja imposta por meio de decisões judiciais, mas discutida e implementada por todos em cooperação. “Será o momento para o Sistema de Justiça e o Sistema de Saúde conversarem entre si para apontarem os problemas e oferecerem caminhos que possibilitem redução na intervenção judicial”, explica a supervisora do Fórum, conselheira Candice Jobim.

Em âmbito nacional, a conversa entre os poderes Executivo e Judiciário já acontece. Por sugestão do Comitê Executivo Nacional do Fórum, o Ministério da Saúde tem compartilhado uma nota informativa sobre suas ações contra o novo coronavírus, como as realizadas no âmbito da Secretaria de Atenção Primária à Saúde (SAPS) para o enfrentamento da Covid-19; o protocolo de manejo clínico da doença na atenção primária; a habilitação dos leitos de unidade de terapia intensiva (UTI) adulto e pediátrica; e o monitoramento da capacidade operacional dos estabelecimentos de saúde frente a pandemia, entre outros.

O material, apresentado também aos Comitês Estaduais da Saúde, tem o objetivo de contribuir com o monitoramento e resolução das demandas, e auxiliar a magistratura brasileira no julgamento de novas ações sobre o tema. “Essa troca de informações facilita a criação de critérios e parâmetros para o monitoramento das ações judiciais relativas à saúde – que deve ser sempre comparativo e contínuo”, afirma a chefe de gabinete da Secretaria de Atenção Especializada em Saúde do Ministério da Saúde, Maria Inês Pordeus Gadelha, que também integra o Comitê Executivo do Fórum e é responsável pela elaboração da nota informativa.

Resolução

Uma das medidas adotadas pelo Fórum foi a edição da Resolução CNJ n. 388/2021, que reestrutura os Comitês Estaduais de Saúde, aprovada pelo CNJ no último dia 6 de abril. O objetivo é fortalecer os grupos, especialmente no momento da pandemia. A norma deve padronizar a estrutura e funcionamento dos comitês, que são compostos por representantes da Justiça Federal e Estadual. Para a conselheira Candice Jobim, a medida facilitará o diálogo interinstitucional com os diversos atores do Sistema de Justiça e do sistema de saúde, de forma a contribuir com ações referentes às demandas de saúde, especialmente quanto à racionalização e qualificação da judicialização no Brasil.

Além disso, espera-se que, com a estrutura padronizada, os comitês consigam identificar e suprir as falhas da política pública local pelo diálogo. “A padronização dos comitês pode colaborar com essa conversa. Afinal, há uma expectativa de que a pandemia vá terminar, mas não sabemos quando. Logo, não há porque perder de vista a questão da mediação”, ressalta o membro do Comitê Executivo e ex-conselheiro do CNJ, Arnaldo Hossepian.

Impactos

Segundo o ex-conselheiro Arnaldo Hossepian, o aumento da judicialização poderá ter duas vertentes. A primeira, vai obrigar o Estado a fornecer o que está previsto na política pública; a organizar a fila da saúde; e a dar acesso ao medicamento básico. “Depende de quanto a ressaca da pandemia vai impactar cada região”.

Hossepian lembrou que o orçamento da saúde nem sempre é suficiente para prestigiar as políticas públicas e a falta de recursos não permite cumprir decisões judiciais que ultrapassam o planejamento local. Por isso, a outra via refere-se ao que não está previsto.

“Para os medicamentos e tratamentos que não estão no SUS, o CNJ tem estrutura montada – por meio dos Núcleos de Apoio Técnico do Poder Judiciário (NATJUS) Estaduais e Nacional – para não trazer déficit ao erário. Para essas demandas, se não tiver evidências científicas, o magistrado tem como enfrentar essa situação”, observa. Além disso, com um sistema disponível 24 horas por dia pela plataforma e-NatJus, o CNJ disponibiliza subsídios técnicos e fundamentos científicos que os magistrados necessitam para bem decidir, tendo como principal objetivo a qualificação e a racionalização da judicialização da saúde no Brasil.

Recomendação

Para aprimorar a prestação jurisdicional durante a pandemia da Covid-19, o CNJ está orientando e sensibilizando os magistrados na adoção de providências relacionadas aos procedimentos tendentes à resolução das demandas de saúde. Nesse sentido, o Conselho tem reforçado, por meio de recomendações, que os magistrados utilizem as informações técnicas de medicina baseada em evidências disponibilizadas na plataforma NatJus Nacional para embasar decisões relativas às demandas que envolvam o direito à saúde. “O objetivo é que haja uma qualificação da judicialização.

Segundo dados do Relatório Justiça em Números do CNJ, cerca de dois milhões de processos do Poder Judiciário são relacionados ao direito à saúde. Apenas em 2019, foram juizados 474.429 mil novas ações ao relacionadas ao tema”, afirmou o presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luiz Fux.

O Fórum Nacional da Saúde também está levantando informações sobre a estrutura, gestão, demanda e tempo de atendimento, entre outros, dos serviços de atenção primária e secundária da saúde. Uma pesquisa nacional, que está sendo finalizada pelo Departamento de Pesquisas Judiciárias (DPJ/CNJ), vai dimensionar o tamanho da rede de atendimento, bem como os índices de judicialização do setor. “Os dados vão ajudar a construir um Plano Nacional com indicadores de melhorias na prestação dos serviços de saúde e redução da judicialização”, explica a supervisora do Fórum, conselheira Candice Jobim.

Após a coleta e o tratamento dos dados, os Comitês Estaduais de Saúde elaborarão suas propostas para solução dos conflitos mais recorrentes, o que contribuirá no aperfeiçoamento do acesso universal à saúde da população local. As propostas elaboradas servirão de subsídio para a elaboração do Plano Nacional para o Poder Judiciário – “Judicialização e Sociedade: ações para acesso à saúde pública de qualidade”.

Esse plano vai apresentar uma proposta de execução de ações pelos Comitês Estaduais de Saúde, sob supervisão do Fórum da Saúde, com os seguintes objetivos: acompanhar os indicadores de melhorias na prestação da atenção primária e secundária à saúde; acompanhar e monitorar indicadores da redução da judicialização; promover ações específicas orientadas pelos indicadores acima indicados; sugerir, se for o caso, a criação de câmaras de resolução pré-processual; sugerir, se for o caso, a aproximação dos magistrados com os gestores em saúde, propor medidas específicas em cada Comarca e/ou Subseção Judiciária; e avaliar outras medidas específicas para adoção pelos Comitês de Saúde do CNJ.

Fonte: Agência CNJ de Notícias.