No entendimento do procurador-geral, os protocolos sanitários são medidas suficientes para conciliar liberdade de culto e saúde coletiva. Foto: Isac Nobrega/PR.

Observados os protocolos setoriais relativos a cada matriz religiosa e atendidas as medidas sanitárias definidas pelo Ministério da Saúde, há de ser assegurada a realização de cultos, missas e demais atividades religiosas de caráter coletivo, em razão do direito consagrado no art. 5º, VI a VIII, da Constituição Federal.

O entendimento é do procurador-geral da República, Augusto Aras, e foi defendido no Supremo Tribunal Federal (STF) na segunda-feira (05) em dois pareceres apresentados no âmbito das ADPFs 701 e 811, de relatoria dos ministros Nunes Marques e Gilmar Mendes, respectivamente. A última ação questiona decreto do governo de São Paulo que vetou a realização de atividades religiosas presenciais.

O procurador-geral defende que a Presidência do STF centralize no ministro Nunes Marques a relatoria das duas ações que tratam da autorização para realização de atividades religiosas durante medidas de enfrentamento à Covid-19.

Nas petições, Augusto Aras ressalta que a Constituição assegura o livre exercício dos cultos religiosos e garante a proteção aos locais de culto e suas liturgias. Além disso, o decreto 10.282/2020 estabelece que as atividades religiosas são consideradas essenciais.

Para Aras, a incapacidade do Estado de fiscalizar o cumprimento das medidas sanitárias nas igrejas e templos não justifica a limitação do exercício de direito à liberdade de culto ou de qualquer outra atividade considerada essencial mesmo durante a vigência de medidas de enfrentamento da epidemia de covid-19.

No entendimento do procurador-geral, os protocolos sanitários são medidas adequadas e suficientes para conciliar os direitos à liberdade de culto e à saúde coletiva.

“Ressalte-se que suposta eventual deficiência do aparato estatal para fiscalizar o cumprimento das medidas sanitárias não pode justificar a limitação do exercício de direito fundamental. A proibição total, generalizada e a priori, embora seja solução mais fácil, não se coaduna com a garantia das liberdades civis, recomendando-se, em caso de descumprimento, a imposição de sanções gradativas, proporcionais e a posteriori”, afirma Augusto Aras.

O próprio Estado de São Paulo já havia elaborado, em parceria com especialistas e setores envolvidos, um detalhado protocolo voltado a auxiliar os estabelecimentos a reduzir o risco de contágio, baseado em critérios técnicos e de saúde. O documento contém prescrições específicas – que podem ser adotadas – para as atividades praticadas em cada matriz religiosa.

Outro exemplo citado pelo PGR, o Distrito Federal, em vez de vedar cultos e missas, implantou regras específicas, como a exigência de afastamento mínimo de uma pessoa para outra, a recomendação para que se evite contato físico, a disponibilização de álcool em gel e a aferição de temperatura.

Assim, não é proporcional que o Poder Público determine a proibição absoluta da realização de cultos e missas, sobretudo quando há outras medidas menos restritivas e igualmente adequadas para o objetivo de conter o coronavírus.

Competência

Nas petições, o procurador-geral da República pontua que a competência material comum de todos os entes federativos para adoção de medidas de enfrentamento da Covid-19 não afasta a possibilidade de revisão, por parte do STF, de atos determinados com base nos direitos fundamentais assegurados pela Constituição Federal, como ficou assentado no julgamento da ADPF 672.

Augusto Aras destaca que a liberdade de culto é elemento primordial da liberdade religiosa, que o Estado deve assegurar principalmente em momentos de grande aflição social, como é o caso do agravamento de epidemias que atingem não apenas a saúde física, mas também a saúde mental e espiritual da população.

“O ordenamento jurídico brasileiro confere especial proteção ao direito fundamental à liberdade de religião e de culto, ao ponto de garantir sua concretização e exercício a todos, seja em tempos de paz e estabilidade, seja nos mais variados cenários de incerteza, instabilidade, crise, calamidade pública ou mesmo guerra”, sustenta o PGR.

Relatoria

Augusto Aras ressalta que, conforme o regimento interno do Supremo Tribunal Federal, a coincidência de objetos em ações acarreta na redistribuição do processo mais recente ao ministro relator da ação mais antiga.

No caso concreto, esse ministro é Nunes Marques, relator da ADPF 701 (mais antiga). “A verificação das datas de propositura e de distribuição, bem como a caracterização da coincidência de objetos das ações recomenda seja a ADPF 811/SP redistribuída, por prevenção/dependência”, afirmou o procurador-geral.

Fonte: site do MPF.