O procurador-geral da República, Augusto Aras, defende no Supremo Tribunal Federal (STF) que é inconstitucional trecho da resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN) que permite a cobrança de tarifa pela disponibilização do cheque especial ao cliente independentemente da utilização do serviço.

De acordo com a regra, correntistas com limites de crédito superiores a R$ 500 poderão sofrer cobrança de uma tarifa calculada em 0,25% do valor excedente, mesmo sem tomar o crédito. Na avaliação do procurador-geral, a medida caracteriza conduta proibida à luz do princípio de proteção ao consumidor previsto constitucionalmente.

A manifestação foi na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6.407, com pedido de medida cautelar, convertida a partir da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 645/DF, proposta pelo partido Podemos. O questionamento da legenda se volta contra o artigo 2º, parágrafos 1º, 2º e 3º, da Resolução 4.765/2019.

Embora a norma do CMN também tenha limitada as taxas de juros aplicáveis ao cheque especial ao patamar de 8% ao mês, simultaneamente, estipulou a possibilidade de cobrança de tarifa que remunera a mera disponibilização de limite de crédito pelo banco. Nas palavras do procurador-geral, essa cobrança “onera de maneira desarrazoada e desproporcional” o consumidor desse serviço.

Na manifestação, Augusto Aras lembra ainda a submissão das instituições financeiras às normas do Código de Defesa do Consumidor (CDC), foi reconhecida pelo Supremo no julgamento da ADI 2.591. Na oportunidade, a Suprema Corte reconheceu as relações jurídicas entre clientes e bancos como consumeristas. Essa proteção se destina a equilibrar relações, marcadas pelas evidentes desigualdade e vulnerabilidade do polo mais frágil.

“As normas regulamentadoras das relações de consumo têm, portanto, natureza de ordem pública e interesse social, não podendo sua proteção ser afastada por convenção entre as partes ou mesmo por meio de atos normativos expedidos pelo Poder Público”, assevera.

Quanto ao exercício das competências atribuídas ao CMN, Augusto Aras salienta que este deve ser orientado pelas diretrizes instituídas pelo artigo 192 da Constituição, sobretudo, no que diz respeito à promoção do desenvolvimento equilibrado do país e ao atendimento aos interesses da coletividade.

Entre os objetivos que devem nortear a aplicação dos recursos, destacam-se ações que propiciem condições favoráveis ao desenvolvimento harmônico da economia nacional, visando à maior eficiência do sistema de pagamentos e de mobilização de recursos.

Enriquecimento sem causa

O PGR chama atenção para o fato de a cobrança de tarifa “diluir” os custos do crédito efetivamente tomado, possibilitando aparente redução das taxas de juros praticadas. “No entanto, o respectivo incremento nas despesas dos clientes que não usufruirão de nenhuma vantagem adicional não pode ser considerado, sob a ótica destes, senão como enriquecimento sem causa por parte dos bancos”, alerta.

Considerando informação do Banco Central, segundo a qual, os bancos têm hoje aproximadamente R$ 350 bilhões disponibilizados para seus clientes como limite de crédito no cheque especial – dos quais R$ 26 bilhões foram efetivamente concedidos –, a tarifa de 0,25% incidirá mensalmente sobre até R$ 324 bilhões.

A arrecadação das instituições financeiras pode chegar a R$ 810 milhões por mês. “As instituições financeiras brasileiras passariam […] a gozar de regime jurídico privilegiado, que lhes permite lucrar, na modalidade de cheque especial, tanto por meio da exigência de juros remuneratórios, quanto por taxação de quem sequer tomou recursos emprestados”.

Juros altíssimos

Na manifestação, o PGR destacou o fato de a remuneração cobrada a título de juros pelas instituições financeiras brasileiras, sobretudo na modalidade de cheque especial, estar entre as mais elevadas do mundo, o que favorece o inadimplemento das obrigações creditícias.

O fato, conforme frisou, tem o potencial de elevar o nível de endividamento, principalmente das famílias de menor renda, que utilizam o cheque especial mais frequentemente, e acabam por ter significativa parcela de seus orçamentos comprometidos com o pagamento de juros e amortizações.

Fonte: site do MPF.