Liminar que havia suspendido processo contra Dallagnol é derrubada. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil.

O não julgamento de um réu eventualmente culpado configura situação mais grave do que o julgamento e a absolvição de um réu eventualmente inocente. Com esse entendimento, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, deferiu pedido do advogado-Geral da União para sustar todos os efeitos da decisão liminar que havia suspendido um processo administrativo disciplinar (PAD) contra o procurador Deltan Martinazzo Dallagnol, em trâmite no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). A decisão é de sexta-feira (04).

O PAD foi instaurado pelo CNMP após representação do senador Renan Calheiros (MDB-AL), para quem Dallagnol, por meio de postagens em redes sociais, tentou influenciar as eleições para a presidência do Senado, em 2019. Na ocasião, o procurador apontou que, caso o emedebista fosse eleito, dificilmente uma reforma contra a corrupção seria aprovada.

Dallagnol recorreu ao STF pleiteando liminarmente a suspensão do processo, o que foi deferido pelo relator do caso, ministro Celso de Mello. O AGU, então, interpôs agravo regimental, alegando existência de perigo de demora inverso, pois a pretensão punitiva pode prescrever na próxima quinta-feira (10).

Assim, em razão da licença médica de Celso de Mello, Gilmar Mendes valeu-se de dispositivo do Regimento Interno da Corte que autoriza a substituição do relator, pois a licença médica encerra-se, a princípio, em 11/9, após o prazo prescricional.

Ironia
Gilmar Mendes abre sua decisão citando excerto de Rui Barbosa sobre “alucinações coletivas”: “a irritação pública deixa de enxergar a verdade com lucidez, fazendo que todas as alegações contra o acusado ecoem apenas aplausos”.

A esse excerto, o ministro coteja outro, da lavra do próprio Dallagnol: “Nosso sistema prescricional, aliado ao congestionamento dos tribunais, é uma máquina de impunidade”. Máquina essa que estaria à beira de o deixar impune. Mais uma vez: em outro caso, o CNMP deixou de abrir um PAD contra Dallagnol, pois a pena já estava prescrita. O julgamento do caso foi adiado 42 vezes.

Consta da decisão de Gilmar Mendes, segundo o relator do PAD no CNMP, conselheiro Otavio Luiz Rodrigues Jr., a pena aplicável a Dallagnol é de censura, que prescreve em um ano. Portanto, de fato, em 10/9. Anteriormente, Dallagnol havia afirmado nos autos que a prescrição seria apenas em 10/9/2021, pois a pena seria de suspensão, que prescreve em dois anos.

“Diante disso, entendo que as informações colidentes juntadas aos autos geram incerteza quanto ao prazo prescricional, situação que justifica o deferimento da medida de contracautela – o risco gerado pela insegurança quanto ao prazo prescricional encontra-se no âmbito de incidência da medida contracautelar pleiteada pela AGU, reafirmando a necessidade de sua concessão”, afirmou Gilmar.

O ministro do STF também destacou a gravidade das imputações oferecidas contra Dallagnol. “Parece-me que a maior violação ao devido processo legal, no caso em apreço, seria justamente impedir o julgamento do agravado por seus pares, possibilitando-se dirimir, finalmente, com a devida verticalidade de cognição que o julgamento de mérito pressupõe, as questões que envolvem o caso”, disse.

A contracautela deferida por Gilmar Mendes vale até que seja julgado o mérito do agravo do AGU.

Fonte: site ConJur.