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A longa entrevista publicada no site do O Globo, no último domingo (09), do professor de Ciência Política da Universidade de São Paulo (USP), André Singer, porta-voz da Presidência da República em um dos governos no ex-presidente Lula, precisa ser lida e devidamente estudada pelos adversários do presidente Jair Bolsonaro, também pelo fato de ele ser um dos mais qualificados lulistas a dar conta das investidas do atual chefe da Nação, com perspectiva de sucesso, num dos nichos da política mais caros ao PT, a parte do eleitorado de menor poder aquisitivo, beneficiado com o Bolsa Família e outros programas sociais. Um acidente de percurso, na busca de oferecer os primeiros socorros a brasileiros carentes, atingidos duplamente pela pandemia, abriu o campo para a conquista de um eleitorado, até então fechado com Lula, admite o professor.

Singer trata como acidente o fato de o Governo ter feito uma proposta de socorro à população carente durante a pandemia, de um auxílio emergencial de R$ 200, mas os parlamentares preferiram triplicar esse valor. Ele admite não saber da extensão e profundidade dessa mudança, mas afirma: “Seja como for, é muito claro que o governo decidiu se beneficiar politicamente de tudo que ocorria e a viagem do presidente ao Nordeste na semana passada é talvez o elemento mais visível dessa operação. O governo Bolsonaro nunca foi próximo do Nordeste. Parece claro que algo está acontecendo”.

E prossegue: “A mecânica do auxílio emergencial fez com que as pessoas tivessem que abrir mão do Bolsa Família. É como se as pessoas tivessem saindo do programa lulista e entrando num programa bolsonarista. O governo começou a pensar numa estratégia inteligente, mas depende de ter recursos, que é fazer com que as pessoas não voltem mais para o Bolsa Família, mas entrem direto no Renda Brasil. Nesse caso, a pandemia criou uma situação inesperada que pode facilitar uma transição inesperada. Porque o Bolsa Família era muito consolidado. Não seria fácil simplesmente mudar de nome, as pessoas iriam continuar chamando de Bolsa Família”. No pensar do professor, aqui reside a ameaça ao lulismo.

Bolsonaro, em mais de uma oportunidade, tem dito que não participará das eleições municipais deste ano. Falácia. Nenhum político ativo deixa de se envolver com eleições, qualquer delas, pois sempre de uma está a depender para a outra. No caso de presidente da República ou governadores, eles até podem deixar de estar em cima do palanque, mas direta ou indiretamente ajudará o seu favorito, seja para elegê-lo ou, simplesmente, para ajudar a derrotar o seu provável adversário no futuro. Desse modo, no caso da disputa pela Prefeitura de Fortaleza, a entrevista do cientista político André Singer deve merecer uma atenção especial. No caso dos governistas cearenses, Singer pode estar advertindo de que o desgaste de Bolsonaro, registrado pelas pesquisas de hoje, talvez não seja o mesmo amanhã.

E não sendo, o presidente pode influir de algum modo na disputa. Para os adversários dos governistas cearenses, que votaram em Bolsonaro para presidente, mas estão evitando dizer que têm suas candidaturas apoiadas por Bolsonaro, melhor reverem o discurso, pois amanhã poderão querer beneficiarem-se da sua popularidade. Esta observação, contudo, não quer dizer que a sucessão em Fortaleza esteja condicionada à boa ou má avaliação do presidente da República. A disputa pela Prefeitura da Capital cearense só dependeu do presidente quando os prefeitos eram biônicos, no período dominado pela Revolução de 1964, quando os chefes políticos locais defendiam as indicações dos seus filiados para o cargo junto ao presidente, responsável pela nomeação. Depois disso, nenhum presidente da República teve influência direta na eleição de prefeito de Fortaleza. Ao contrário, Lula foi derrotado por Luizianne, quando queria eleger Inácio Arruda.

O jornalista Edison Silva comenta a influência dos programas sociais do governo do presidente Bolsonaro no Nordeste: