Cássio Borges é Engenheiro Civil.

Em meio à discussão de quem é a ideia do Projeto de “Transposição de Vazões do Rio São Francisco”, hoje denominado “Projeto de Integração do Rio São Francisco às Bacias do Nordeste Setentrional” revejo nos meus alfarrábios meu artigo sobre este tema intitulado “Subsídio aos Estudos de Transposição de Vazões dos Rios Tocantins e São Francisco para o Nordeste”, publicado no Boletim Técnico do DNOCS (jul/dez) de 1981.

Vê-se no referido e despretensioso trabalho, porque naquela época não havia interesses empresarias envolvidos, seja do ramo de consultoria ou no ramo de construção, como acontece atualmente, e nem os políticos costumavam se pronunciar sobre temas técnicos. Tudo se fazia, se publicava e se dizia dentro da mais pura convicção e princípios visando os interesses mais nobres do povo nordestino. É triste observar que atualmente a água está sendo considerada como se fosse uma mercadoria, ganhar dinheiro, e ter poder.

Na primeira página do mencionado trabalho, isto é, no seu RESUMO, se lê o seguinte: “Em fevereiro de 1978, o Departamento Nacional de Obras Contra as Secas-DNOCS, preocupado com o problema das secas no Nordeste e sobremaneira sensível aos problemas da escassez de água, numa visão futura, resolveu trazer à tona o velho sonho da ligação das bacias hidrográficas nordestinas, já que as técnicas neste domínio, tendem a receber novos impulsos”. 

Mas que “novos impulsos” eram estes que já se vislumbrava àquela época? Também no referido RESUMO nós realçávamos que “este empreendimento, de elevado custo inicial, somente seria implantado, após o esgotamento das disponibilidades hídricas locais”. Isto é, dando prioridade ao uso das águas armazenadas nos açudes do DNOCS de custo praticamente zero.

Ao elaborarmos o referido trabalho tínhamos em mente que, para transpor as águas desde o Rio São Francisco, vencer uma altura de 110 metros topográficos e levá-las a uma distância 120 quilômetros até os limites dos Estados de Pernambuco e Ceará, teríamos que recorrer ao bombeamento destas águas mediante a instalação de possantes Estações de Bombeamento. Isto, naturalmente, exigiria um elevado consumo de energia e, naquela época, este insumo já considerado escasso e quase inacessível. Daí surgiu a ideia de fazer o bombeamento das águas do Rio São Francisco para a bacia do Rio Jaguaribe utilizando-se a energia “off-peak” da CHESF – Companhia Hidro Elétrica do São Francisco, a chamada energia ociosa, que é gerada depois das 22 horas até às primeiras horas da manhã, quando o consumo é muito baixo.

Todas essas iniciativas do DNOCS em torno deste assunto tiveram ampla repercussão nacional, tendo a imprensa falada, escrita e televisada dado grande destaque, como se pode verificar através dos arquivos da Divisão de Hidrologia do DNOCS. A revista do Ministério do Interior, ano IV-Nº 24, maio/junho de 1978, na seção ATUALIDADES, assim se expressou:

“Uma antiga e promissora ideia, por muitos considerada utópica, volta a repercutir entre técnicos em hidrologia de todo o país: a de transferência de água entre bacias hidrográficas vizinhas”.

A possibilidade foi novamente discutida durante Seminário de Recursos Hídricos promovido pelo DNOCS no início deste ano, e deverá ser estudada em profundidade a partir de 1979”.

Esta é mais uma comprovação documental que o DNOCS também é pioneiro neste tema da transposição. Como é que querem transformar este Departamento, tão importante, numa simples secretaria?

Senhores Senadores, Senhores Deputados, toda a sociedade civil e eclesiástica desta sofrida Região, vamos fazer uma mobilização junto aos altos escalões da República e não permitir que isto venha a ocorrer.

*Cássio Borges é engenheiro civil, formado pela Escola Politécnica de Pernambuco e cursos de especialização em Hidrologia na Escola Nacional de Engenharia e Pontifícia Universidade Católica –PUC, ambas do Rio de Janeiro.