Palácio do Planalto, sede do Governo Federal. Foto: Cristiano Mascard.

O mês de abril se encerra com 26 Medidas Provisórias publicadas pelo Governo Federal. É o número mais alto para um único mês desde 2001, quando as atuais regras para edição e tramitação de MPs entraram em vigor.

Todos os textos, com exceção de um, se referem à pandemia do novo coronavírus (COVID-19), assunto que tem dominado as atividades políticas do país neste início de ano.

As Medidas Provisórias ligadas apenas à pandemia já somam 35 desde março, número que representa quase 75% de todo o volume de MPs produzido em todo o ano de 2019 e que iguala ou supera toda a produção de MPs em três dos últimos 11 anos.

Ao todo, são agora 42 MPs somente nos quatro primeiros meses de 2020. A média registrada desde 2001 para cada ano inteiro fica entre 49 e 50.

Desde 13 de março, quando saiu a primeira Medida Provisória destinada ao combate da COVID-19, a MP 924, que autorizou R$ 5 bilhões em créditos extraordinários para os ministérios da Saúde e da Educação, o Palácio do Planalto emitiu uma média de mais de uma MP por dia útil, 36 em 32 dias. Tradicionalmente, o Poder Executivo assina apenas uma por semana.

Das 35 peças voltadas à pandemia, 14 são aberturas de créditos extraordinários. Elas totalizam, até agora, repasses de R$ 252,8 bilhões para ministérios, estados e municípios, empresas e cidadãos. Para agilizar a análise das demais MPs, cujo conteúdo precisa ser debatido e modificado pelos parlamentares, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, decidiu que as medidas de crédito não serão votadas. Isso não impacta os repasses, que são feitos imediatamente e não são afetados pela perda de vigência da MP.

Além dos créditos extraordinários, as MPs relacionadas à pandemia de coronavírus incluem a criação de programas para manutenção de empregos durante a crise, por meio de linhas de crédito para empresas (MP 944) e compartilhamento de encargos trabalhistas (MP 936); medidas para os setores de energia (MP 950), turismo e cultura (MP 948), portos (MP 945) e telecomunicações (MP 952); a liberação de recursos do FGTS (MP 946); a recomposição dos fundos de participação dos estados e dos municípios (MP 938); a simplificação de compras públicas (MP 951); e a facilitação de acesso ao crédito (MP 958).

“Momento de exceção”

A sucessão inédita de Medidas Provisórias é um retrato do período histórico. A pandemia do novo coronavírus já é a maior enfrentada pela humanidade desde a gripe espanhola, no início do século XX. No Brasil, são mais de 85 mil casos diagnosticados e 5.901 mortes confirmadas até quinta-feira (30). Entretanto, esses números podem estar severamente subestimados, dado que o país está entre os que menos administram testes à população.

A senadora Simone Tebet (MDB/MS), presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), reconhece o “momento de exceção” atravessado por todos os países, e defende que é a hora mais adequada para que o Executivo se valha das medidas provisórias, que são instrumentos típicos para situações de urgência e relevância.

Com as restrições impostas às reuniões do Congresso Nacional (e, consequentemente, à elaboração de leis), a eficácia imediata e a tramitação acelerada das medidas provisórias se tornam necessárias para minimizar os impactos da pandemia sobre a sociedade.

Ao mesmo tempo, a senadora alerta para que os parlamentares não se acomodem com as iniciativas do Governo e não se furtem das suas responsabilidades na análise das MPs. Justamente por reconhecer a necessidade de um volume maior de medidas provisórias, Simone afirma que o Congresso deve redobrar a vigilância sobre as decisões tomadas pelo Executivo.

“É preciso que o Governo se limite a ser fiel cumpridor do texto constitucional, que seja cobrado e responsabilizado pelos excessos e pela edição de MPs que nada tenham de urgentes. É aquilo que fazemos: depurar as MPs, deixar caducarem as que não são relevantes, aperfeiçoar as que são”, disse Simone.

Com essa postura, o Senado provocou o Governo a revogar e reeditar a MP 905/2019, que criava nova modalidade de contratação para jovens e para trabalhadores há mais de um ano sem carteira assinada. Os senadores argumentaram que não seria adequado votá-la neste momento, uma vez que o texto flexibilizaria direitos trabalhistas.

Na véspera do esgotamento do prazo de validade, o Executivo concordou em retirar a MP de circulação e produzir um novo texto, que ainda não foi apresentado. A revogação da MP 905 foi feita também por medida provisória, e representou a única MP sem relação direta com a Covid-19 desde o dia 13 de março.

A preponderância do Executivo neste momento também é vista como normal pelo consultor legislativo do Senado Gilberto Guerzoni, especialista em direito constitucional, principalmente pelo fato de o Parlamento estar realizando apenas encontros à distância e com pautas reduzidas.

“A deliberação remota é uma restrição muito grande. Ela consegue dar vazão a temas urgentes, mas a articulação política fica limitada com cada parlamentar na sua casa. O contato é muito mais difícil. Apesar de todas essas limitações, o Congresso tem tido atuação”, opinou Guerzoni.

O consultor cita o auxílio emergencial de R$ 600 para desempregados e trabalhadores informais (Lei 13.982, de 2020), a PEC do Orçamento de Guerra para a pandemia (PEC 10/2020) e o “Plano Mansueto” de auxílio financeiro aos estados e municípios (PLP 149/2019) como iniciativas importantes para a pandemia que contaram com a proatividade do Legislativo.

Tramitação diferenciada

Para agilizar a passagem das medidas provisórias pelo Senado, o presidente Davi Alcolumbre criou um procedimento para vincular projetos de Lei de assuntos semelhantes a cada MP que chegar. Dessa forma, as MPs tomam a frente na pauta da Casa e os projetos já em andamento poderão servir para aprimorá-las, com dispositivos sendo incorporados diretamente ao texto.

No início de abril o Congresso já havia adotado um procedimento diferente para a votação de Medidas Provisórias, tendo em vista as restrições físicas aos trabalhos legislativos e as sessões deliberativas remotas.

As novas regras dispensam as atividades das comissões mistas e permitem a análise diretamente nos plenários das Casas, além de implementar um prazo reduzido para os parlamentares votarem as MPs, de até 16 dias. O procedimento foi definido por um ato conjunto das Mesas Diretoras da Câmara e do Senado e tem o respaldo do Supremo Tribunal Federal (STF).

Com informações da Agência Senado.