O ministro Marco Aurélio, como relator das ações, foi o primeiro a votar na sessão desta quarta-feira (23) do Supremo. Ele é contra a prisão de condenado em segunda instância. Foto: STF.

Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) começaram a julgar nesta quarta-feira (23), as Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADC), ajuizadas pelo Partido Ecológico Nacional (PEN – atual Patriota), pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB) contra a possibilidade de execução provisória da pena antes de esgotadas todas as possibilidade de recurso (trânsito em julgado). A sessão foi interrompida, no fim da tarde, com o placar de três votos a favor da prisão de condenados em segundo grau e um a favor, este do ministro Marco Aurélio, relator das ações. Os demais foram dos ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachim e Luís Roberto Barroso.

No seu voto, proferido logo no início da manhã desta quarta-feira, o ministro Marco Aurélio disse não se poder inverter a ordem natural do processo-crime: é preciso apurar para, formada a culpa, prender o cidadão em verdadeira execução da pena, que não comporta provisoriedade.

O relator das ADCs afirmou que a literalidade do inciso LVII do artigo 5º da Constituição Federal, segundo o qual “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”, não deixa margem a dúvidas ou a controvérsias de interpretação. “A Constituição de 1988 consagrou a excepcionalidade da custódia no sistema penal brasileiro, sobretudo no tocante à supressão da liberdade anterior ao trânsito em julgado da decisão condenatória”, afirmou. “O pressuposto da execução provisória é a possibilidade de retorno ao estágio anterior, mas quem vai devolver a liberdade ao cidadão?”, perguntou.

Quadro lamentável

O ministro observou que a redação dada ao artigo 283 do Código de Processo Penal (CPP) pela Lei 12.403/2011 – para dispor que “ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva” – foi uma providência do Poder Legislativo para se adequar à jurisprudência então dominante do Supremo, firmada no Habeas Corpus (HC 84078), de que a prisão antes do trânsito em julgado da condenação somente pode ser decretada a título cautelar. Mas, depois de sete anos, ao julgar o HC 126292, a Corte reverteu o entendimento que havia inspirado a reforma do CPP. “Tem-se quadro lamentável, no qual o legislador se alinhou à Constituição Federal, ao passo que este Tribunal dela se afastou”, criticou.

Sem distinção

Em seu voto, o relator das ações afirmou que o CPP prevê, em seu artigo 312, a possibilidade de prisão antes do trânsito em julgado da condenação em situações individualizadas – para a garantia da ordem pública e econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria. Para o ministro Marco Aurélio, não faz sentido a distinção jurídica feita entre as situações de “inocência” e “não culpa”. “As expressões ‘inocente’ e ‘não culpável’ constituem somente variante semântica de um idêntico conteúdo”, ressaltou.

Meio termo

O relator também criticou a proposta de permitir a execução antecipada da condenação após julgamento de recurso pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), por considerar que se trata de uma tentativa incompatível de admitir “gradação na formação da culpa”. Para o ministro Marco Aurélio, não cabe ao Supremo eximir-se da tarefa de guardião da Constituição Federal e transformar o Superior Tribunal de Justiça em “Supremo Tribunal de Justiça”.

Efeitos

Ao concluir seu voto, o ministro Marco Aurélio julgou procedentes os pedidos formulados nas ADCs para assentar a constitucionalidade do artigo 283 do CPP e, como consequência, determinar a suspensão da execução provisória de penas que tenham sido determinadas antes do trânsito em julgado, com a libertação dos que tenham sido presos após o julgamento de apelação. O ministro ressalva a possibilidade de prisão preventiva aos casos “verdadeiramente enquadráveis” no artigo 312 do CPP, ou seja, para garantia da ordem pública e econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.

Com informações do site do STF.