Ministro Lewandowski destacou a importância da participação de todos para mudar as regras atuais. Foto: Máximo Moura/ALCE.

“Quem sabe faz a hora, não espera acontecer”. Com esta frase, retirada dos versos da famosa canção “Para não dizer que não falei de flores”, símbolo das manifestações contra a ditadura militar nos anos 1960-1970, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, concluiu seu pronunciamento no I Seminário de Direito Constitucional realizado na Assembleia Legislativa. O magistrado utilizou o verso para conclamar as assembleias legislativas, câmaras municipais, governadores, prefeitos e sociedade em geral a “criar coragem e audácia” para conquistar espaços no embate sobre o universo do federalismo brasileiro.

Segundo o ministro, existe espaço na Constituição Federal para que estados possam exercer competências no direito do consumidor, meio ambiente, segurança, combate à pobreza e cultura. Segundo ele, “há um grande espaço para que o Estado possa ampliar seu grau de atuação”, disse.

O magistrado afirmou que é preciso saber explorar o que diz o parágrafo primeiro do Art 24 da Constituição Federal. De acordo com o texto constitucional, “no âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais. O parágrafo terceiro diz ainda que “inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades”.

“Espaço existe, e o próprio STF pretende prestigiar estados e municípios também. Mas essa não é uma tarefa exclusiva do STF. Portanto, compete às assembleias legislativas, às câmaras municipais, aos governadores, prefeitos e sociedade em geral coragem e audácia. Existe um espaço em que os estados podem exercer tais competências”, defendeu.

Segundo ele, a federação brasileira padece daquilo que se denomina como “pecado original”, uma vez que a nossa Constituição não garantiu maior autonomia para as unidades federativas, o que foi sendo reduzido, ainda mais, ao longo do tempo.

Centralização

Do ponto de vista formal, a Constituição de 1988 foi generosa ao federalismo brasileiro e prestigiou a municípios, estados e o Distrito Federal. Mas mesmo assim, dentro deste arcabouço institucional, permitiu-se que o pêndulo fosse para a centralização”, afirmou.

Segundo ele, tal concentração de forças da União ocorreu durante o Governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) com suas reformas administrativa e previdenciária, e quando estabeleceu-se a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). “Tudo no sentido de fazer com que os estados ficassem engessados”, disse.

Nos governos seguintes, em sua avaliação, não foi diferente. Na gestão do ex-presidente Lula (PT) houve um movimento de centralização do poder com a Reforma do Judiciário. Se criou o Conselho Nacional de Justiça, que é o supervisor das justiças estaduais. “Antes disso, as justiças estaduais tinham ampla liberdade e, agora, perdeu várias de suas competências para a Justiça Federal e do Trabalho”.

O ministro do STF foi a principal personalidade do I Seminário de Direito Constitucional da Assembleia Legislativa. Foto: Máximo Moura/ALCE.

Ainda em sua avaliação, algumas súmulas vinculantes de repercussão geral entregaram ao STF “quase que o Poder legiferante. Entregou nas mãos do STF para ele estabelecer normas que no passado poderiam ser interpretadas pelos juízes locais”.

Durante a gestão da ex-presidente Dilma Rousseff  (PT) houve movimento no sentido de estimular as economias, as chamadas exonerações fiscais, em detrimento dos estados e municípios. “O Governo Federal passou a lançar mão das contribuições e os estados ficaram a ver navios. Isso continuou no Governo Temer (MDB) e no Governo Bolsonaro (PSL). As grandes reformas, a nível de União, continuam sendo levadas a cabo. Do ponto de vista da federalização, os estados não podem mais legislar, por exemplo, sobre Previdência Social”.

Segundo ele, a federalização do Estado é um instrumento de aperfeiçoamento da democracia. Portanto, é preciso um maior esforço em prol da verticalização. Em sua avaliação, é necessário ficar atento aos princípios de subsidiariedade e de proporcionalidade além de revalorizar a federação brasileira.

“Esse é um papel importante das assembleias legislativas, dar completude ao parágrafo primeiro do Art. 25 da Constituição que diz que são reservadas aos Estados as competências que não lhes sejam vedadas por esta Constituição”, avaliou.

Frase

“Existe um espaço em que os estados podem exercer essas competências. Compete às Assembleias Legislativas, câmaras municipais, governadores, prefeitos e sociedade em geral. É preciso coragem, audácia. Como dizia Geraldo Vandré, quem sabe faz a hora, não espera acontecer” – Ricardo Lewandowski.