Sede do Ministério Público Federal, em Brasília. Foto: João Américo/PGR.

Levantamento realizado no âmbito do Ministério Público Federal (MPF) identificou 700 investigações e ações penais paralisadas após a decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, de suspender apurações que contenham dados fiscais e bancários repassados ao Ministério Público pelos órgãos de fiscalização e controle sem prévia autorização judicial. De acordo com a Câmara Criminal do MPF (2CCR), responsável pelo levantamento, os dados ainda são parciais, e o número de casos paralisados pode ser ainda maior, uma vez que os próprios membros do MPF estão apontando quais processos e procedimentos sob sua tutela foram impactados pela medida. O número não considera investigações suspensas nos MPs Estaduais, apenas no MPF. A última atualização é de 24 de outubro.

Conforme aponta o levantamento, investigações em todo o país foram afetadas pela decisão do ministro Dias Toffoli. Os processos envolvem, majoritariamente, crimes contra a ordem tributária, relacionados à lavagem ou ocultação de bens, direitos ou valores e aqueles cometidos contra o Sistema Financeiro Nacional. Também foram paralisadas investigações que apuram contrabando e descaminho, corrupção ativa e passiva, peculato, sonegação previdenciária, entre outras.

De acordo com a coordenadora da 2CCR, a subprocuradora-geral da República, Luiza Cristina Frischeisen, a decisão inviabiliza qualquer investigação que envolva persecução patrimonial, principal fonte de indícios dos crimes citados. “O impacto da decisão é imenso. Afeta, de forma diversificada, milhares de investigações, desde aquelas relacionadas a tráfico de drogas até as que apuram corrupção e lavagem de dinheiro nos grandes casos em curso no país”, sintetizou.

Luiza Frischiesen destacou o prejuízo que a ausência de dados financeiros pode ocasionar às investigações, em especial o Relatório de Inteligência Financeira (RIF), elaborado pelo antigo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), atual Unidade de Inteligência Financeira (UIF) do Banco Central. “Em investigações mais sofisticadas de lavagem, por exemplo, é necessário que haja o RIF e o relatório da Receita Federal. Sem eles, não há sequer elementos para pedir a quebra do sigilo bancário, matando a investigação na raiz”, ponderou. A subprocuradora-geral apontou ainda obscuridades na decisão do ministro Dias Toffoli que, de acordo com ela, “criou um cenário de tremenda insegurança jurídica no país”.

Além disso, a decisão do ministro Dias Toffoli ocasiona a burocratização da Justiça, ao inundar os juízos de processos com pedidos de autorização para uso desses dados, aponta Frischeisen. Ainda de acordo com ela, a medida contraria diretrizes da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e do Grupo de Ação Financeira Internacional (Gafi) que recomenda explicitamente aos estados partícipes, a exemplo do Brasil, que informações de órgãos de controle sejam acessíveis e proativamente compartilhadas com o Ministério Público e órgãos de persecução penal e criminal, sem a necessidade de autorização judicial.

A subprocuradora-geral considera de extrema urgência a necessidade de votação, pelo Plenário do STF, do recurso extraordinário que trata da questão, com repercussão geral, uma vez que milhares de inquéritos, procedimentos investigatórios criminais e ações penais estão paradas em virtude da decisão liminar.

Organizações criminosas – Luiza Frischeisen também demonstrou preocupação com o futuro de investigações relacionadas a facções criminosas. De acordo com ela, o modo de operação dessas organizações requer total acesso às informações bancárias por parte dos órgãos de investigação para que seja possível combatê-las. A subprocuradora-geral diz que é impossível enfrentá-las sem algum tipo de quebra de sigilo. “Nesse ponto, a decisão fragilizou o combate ao crime organizado, favorecendo o fortalecimento dessas facções, uma vez que sem os dados financeiros não há elementos para o pedido judicial de quebra dos sigilos”, concluiu.

Fonte: site do MPF.