Estudo do Ipea mostra as vantagens de o Governo Federal unificar os seus programas de assistência social. Foto: Agência Brasil

A unificação de programas sociais pode potencializar duas vezes mais o enfrentamento à desigualdade e à pobreza no Brasil. De acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), com a fusão de quatro iniciativas de âmbito federal, o sistema passaria a incluir 17 milhões de crianças em situação de vulnerabilidade que, atualmente, não recebem benefício do Governo Federal. Desse total, metade encontra-se, hoje, na parcela dos 30% mais pobres da população brasileira.

Segundo documento divulgado nesta segunda-feira (02) pelo Ipea, a revisão prevê a integração entre o Bolsa Família, o salário-família, o abono salarial e a dedução por dependente no Imposto de Renda Pessoa Física “em uma única política coerente”. Os autores do estudo afirmam que, mesmo ampliando a abrangência da proteção social, a reestruturação não demandaria mais recursos públicos, ou seja, não feriria o princípio da responsabilidade fiscal.

Na prática, isso quer dizer que o montante destinado às políticas públicas de proteção à infância e aos vulneráveis à pobreza, de cerca de R$ 52,8 bilhões, seria mantido – e, conforme enfatizam os pesquisadores, “também não poderia ser reduzido”. A soma equivale a 0,8% do Produto Interno Bruto (PIB), soma de todos os bens e serviços produzidos no país.

Disparidades

Para os pesquisadores do Ipea, um dos fatores que justificam a reformulação do sistema de programas sociais é a discrepância entre valores de benefícios concedidos pelo governo. A avaliação é que pessoas que enfrentam os mesmos riscos sociais acabam recebendo quantias diferentes.

Como exemplo, é citada a disparidade entre o seguro-desemprego e o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), dois tipos de garantia de renda para quem perde o emprego que, segundo os técnicos do Ipea, “não conversam entre si”. “Para pessoas com deficiência, benefícios assistenciais, previdenciários e tributários têm definições diferentes de deficiência, pagam valores muito diferentes em função do mesmo fato gerador e, frequentemente, estão em contradição com outras políticas para este mesmo público.”

Os especialistas propõem um conjunto de medidas para que essas correções possam ser feitas. Um dos pontos seria a adoção do uso do Cadastro Único como mecanismo de identificação das pessoas que se encontram em situação de pobreza e definir essa condição a partir da renda familiar per capita.

Segundo os pesquisadores, para que a mudança no sistema de programas sociais vingue, a base deve ser composta por um benefício universal para todas as crianças e adolescentes e dois benefícios focalizados. Estes dois últimos contemplariam crianças pobres e famílias em extrema pobreza.

De acordo com Sergei Soares, um dos pesquisadores do Ipea que assinam o estudo, o Brasil, reserva verbas significativas para a proteção social, “mas obtém relativamente poucos resultados”. Ele diz que a “fragmentação” dos programas sociais é um dos aspectos que geram esse quadro e explica como o modelo proposto na pesquisa seria capaz de dobrar o impacto sobre a desigualdade social e a pobreza no país.

“Como a gente consegue dobrar: primeiro, eliminando sobreposições. Existem pessoas que ganham [benefícios] duas vezes, sem precisar. Focalizando o que não é universal, porque coloca [o processo de concessão de benefícios] orientado pelo critério de renda familiar per capita e os benefícios vão para os mais pobres”, explica Soares, que é técnico de planejamento e pesquisa na Diretoria de Estudos e Relações Econômicas e Políticas Internacionais (Dinte), do Ipea.

Outro ponto é relativo à dedução por dependente no Imposto de Renda Pessoa Física, que, para os pesquisadores, representa “um benefício extremamente regressivo focado quase exclusivamente nos mais ricos” e que poderia, portanto, estar a serviço dos mais pobres, no modelo proposto por eles. “E, finalmente, colocando num arcabouço único, que funcione de modo articulado. Hoje, o Brasil tem programas fragmentados. Ao articular, consegue-se um impacto muito maior”, acrescenta o pesquisador.

Bolsa Família

Para Soares, o Bolsa Família é “o que há de melhor”, em termos de políticas voltadas à proteção da infância e de pessoas vulneráveis à pobreza. “[O programa] vem sendo muito aprimorado, ao longo dos últimos 15 anos. Quando foi feito, fundamentou-se na estrutura do Bolsa Escola Federal, algo que também foi sendo aprimorado. Ele [Bolsa Família] é perfeito? Não, tem como melhorar. Mas é o que tem de mais iluminador, tanto que nossa proposta o segue de perto.”

Dados do Governo Federal, mencionados no estudo, demonstram que, em 2017, o Bolsa Família alcançou 43,3 milhões de beneficiários, com orçamento de R$ 29,05 bilhões. “Embora seja relativamente modesto em termos orçamentários, com 0,44% do PIB, [o programa] é grande em termos de alcance, chegando a 20% das famílias no Brasil”.

Com informações da Agência Brasil.