Dr. Carlos Felipe defende que resultados que poderiam ser obtidos com eletrochoques podem ser conseguidos com medicações mais modernas e menos agressivas. Foto: Marcelo Bloc/Blog do Edison Silva.

O projeto de Lei 317/19, de autoria do deputado Renato Roseno (Psol), que veda a comercialização de equipamentos de eletrochoque (ECT) para tratamentos psiquiátricos e segue tramitando na Assembleia Legislativa, vem causando reações adversas inclusive de membros da Comissão da Saúde da Casa. Os deputados Carlos Felipe (PCdoB) e Dra. Silvana Pereira (PL), ambos médicos, têm entendimentos diferentes quanto à matéria.

“Acredito que seria brutal tomarmos essa decisão sem ouvir os devidos profissionais. Vou pedir aos Conselhos Regional e Nacional de Medicina, ao Conselho Regional de Psiquiatria e aos que precisar relatórios sobre o assunto. Não vou pautar na Comissão de Saúde dessa Casa algo sem um aval de especialistas”, afirmou a deputada em pronunciamento no primeiro expediente desta sexta-feira (27). Esta semana, profissionais de saúde ligados aos CAPS, que defendem o projeto de Renato Roseno, foram até a Assembleia Legislativa para um encontro com a Comissão de Saúde. Como a reunião acabou adiada, eles se posicionaram nas arquibancadas com cartazes pedindo o fim do eletrochoque e defendendo o incentivo à arte como uma forma de tratamento.

Carlos Felipe lembrou que, antigamente, além do eletrochoque fazia-se a lobotomia. “Se operava, retirava-se um pedaço do cérebro da pessoa, que posteriormente tinha déficits horríveis. Hoje, está acontecendo só o eletrochoque”, explicou o parlamentar. Ele defendeu que o tratamento pode ser viável em situações bem específicas, mas que necessita de uma estruturação adequada, com apoio cardiovascular, relaxante e anestésico, o que o serviço público hoje não tem como oferecer, segundo ele. “E a gente pode obter os mesmos resultados com as medicações de última geração. É um processo mais lento, mas se consegue também. E a desvantagem do eletrochoque é que eles são três por mês, e o índice de reincidência é de quase 60% em um mês”, acrescentou.

Durante a sessão da última quinta-feira, manifestantes exibiram cartazes contrários ao tratamento com eletrochoque. Foto: Blog do Edison Silva.

O comunista lembrou que esse tipo de tratamento é pouco utilizado nos dias de hoje, apesar de ainda aceito do ponto de vista constitucional. Ele alertou que o eletrochoque já é proibido em alguns países europeus e no estado de Santa Catarina, além de algumas cidades brasileiras. “Interessa (o tratamento) muito ao sistema privado. Nos EUA, onde mais se faz, onde mais se ganha dinheiro é com eletrochoque. Então a gente tem que ver o que é que de interesse público e o que é de interesse privado”, concluiu, em conversa com o Blog do Edison Silva.

O que diz o projeto

O caput do projeto de Lei afirma que ‘fica vedada a comercialização de equipamentos para eletroconvulsoterapia no Estado do Ceará’. Na justificativa, Roseno argumenta que ‘não há consenso entre profissionais de saúde acerca da eficácia da ECT, uma vez que não há suficientes estudos que indiquem a segurança do procedimento, há uma trajetória desumanizadora em torno desta prática, utilizada, ao longo do tempo, como forma de controle, disciplinamento e tortura’. Segundo ele, a proibição de comercialização desses produtos por parte do Governo do Estado ‘contribuirá para a saúde e a garantia dos Direitos Humanos no Estado do Ceará’.