O senador eleito Cid Gomes (PDT) disse que mudou de telefone por estar recebendo ligações com “ataques sucessivos” por conta de sua posição em defesa do voto aberto na eleição para o comando do Senado Federal, no dia primeiro de fevereiro próximo. Na próxima sexta-feira, dia 25, ele diz que haverá uma nova reunião dos senadores que integram o grupo de oposição para nova rodada de discussão sobre o nome do candidato ao Senado, que se contraponha a Renan Calheiros (MDB).

Cid concedeu uma longa entrevista para o site Congressoemfoco, assinada pelo jornalista Edson Sardinha, assim sintetizada:

O ex-governador Cid Gomes (PDT-CE) se prepara para assumir seu primeiro mandato no Congresso Nacional como um dos líderes do recém-criado bloco oposicionista formado por PDT, PSB, Rede e PPS. O primeiro desafio, brinca, é conseguir reunir senadores no recesso. “Vim a Brasília [na semana passada] e só consegui encontrar dois.”

Mas a grande tarefa inicial é construir uma candidatura à presidência do Senado que concilie, segundo ele, o sentimento predominante na Casa: alguém que não pregue oposição radical ao governo, nem seja alinhado automaticamente ao presidente Jair Bolsonaro. Pelo primeiro motivo, o grupo quer se desvencilhar do PT. E, com o receio de incorrer em uma situação ou outra, não quer a volta de Renan Calheiros (MDB-AL) ao comando do Senado.

Na próxima sexta-feira (25) o bloco vai se reunir em Brasília na busca de um nome de consenso para enfrentar Renan – até agora o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) é o mais cotado para encarnar esse papel. Cid defende que a discussão seja feita sem maniqueísmos e casuísmos. “Não vou fazer disso um cavalo de batalha. Não é o Major Olimpio que é o bonzão, nem o Renan que é o péssimo”, afirma, em referência ao senador eleito pelo PSL que se lançou à disputa como nome do governo.

Segundo Cid Gomes, é preciso tomar cuidado com o discurso de que quem está entrando na política agora, com bandeiras moralistas, é melhor do que quem já exerce funções públicas há mais tempo.

“Não tenho menor vocação para o maniqueísmo. Agora o Alexandre Frota é o protótipo do bom político? E o Rodrigo Maia o da política antiga? Me perdoe. Kim não sei das quantas é protótipo da nova política? Joice Hasselmann é protótipo da nova política?”, indaga. “Quando se fala do protótipo da nova política boto os cinco pés atrás para ver se não é oportunismo ou casuísmo de quem está querendo autoritarismo no poder”, acrescenta em entrevista exclusiva ao Congresso em Foco.

Camisas negras

Cid afirma que nos últimos dias teve de trocar de telefone por causa de ataques sucessivos que vinha recebendo daqueles que ele chama de “camisas negras” – termo utilizado em referência ao fascismo – para que o Senado eleja seu próximo presidente, no dia 1º de fevereiro, em votação aberta. De acordo com o ex-governador, outros colegas também têm sofrido pressão dessa natureza.

O Movimento Brasil Livre, fundado pelo deputado eleito Kim Kataguiri (DEM-SP), mencionado acima, de maneira irônica, pelo senador eleito, faz campanha sistemática pela abertura do voto nas duas casas legislativas. Embora haja o entendimento generalizado de que a votação secreta favoreça a volta de Renan à presidência do Senado pela quinta vez, Cid afirma que é contra qualquer iniciativa para abrir o voto por entender que essa é a regra regimental.

“A gente segue o regimento. Se está insatisfeito, mude o regimento. Não dá para mudar no dia da votação. São pseudopolêmicas.” Há duas semanas o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, determinou que a votação seja secreta.

Para o pedetista, o novo presidente do Senado deve zelar pela independência da Casa em relação ao Executivo e assegurar o papel do Parlamento pelos próximos anos dada a “imponderabilidade e a instabilidade” do novo governo.

O início da atual gestão, de acordo com o senador eleito, já demonstra o que vem pela frente. “Há muita trapalhada. Mas elas devem ser vistas com alguma tolerância porque, afinal de contas, tem muita gente que não teve experiência na administração pública que agora está na frente dela. Temos de ter tolerância”, defende o irmão do ex-presidenciável Ciro Gomes (PDT), que declarou “apoio crítico” a Fernando Haddad (PT) no segundo turno contra Bolsonaro.

Lua de mel

Cid Gomes acredita que parte do eleitorado já se sente frustrada com o novo presidente e alerta para o risco de a tradicional lua de mel entre Executivo e Legislativo, que costuma caracterizar o início de governos, ser encurtada.

“Isso vai depender também da quantidade de frustrações, da quantidade de incoerências que o governo praticar. O governo que vivia falando do filho do Lula e bota o filho do Mourão começa a despertar nas pessoas que é mais do mesmo. Não sou adepto das teses moralistas. Geralmente por trás de defensores delas tem santos de pau oco. Estou falando só da incoerência.”

Governador do Ceará por dois mandatos, ex-prefeito de Sobral (CE) e ex-deputado estadual, Cid terá sua segunda experiência política em Brasília – a primeira foi sua passagem relâmpago pelo Ministério da Educação. Dois meses após ter assumido o cargo, ele foi convocado pela Câmara, então presidida por Eduardo Cunha (MDB-RJ), para explicar a declaração de que a “Câmara tinha de 300 a 400 achacadores”. Em vez de se desculpar, como os parlamentares esperavam, aumentou a artilharia e pediu demissão do cargo. Em outubro de 2018, Cid foi eleito senador com 41,62% dos votos válidos para o Senado.

Fotos: Pedro França e Marcos Oliveira/Agência Senado.