Leia artigo do jurista Djalma Pinto.

Duas inovações se mostraram de grande relevância nas eleições de 2018: a) a criação do Fundo Eleitoral para financiamento das campanhas, e b) a cláusula de desempenho a ser observada pelo partido para ter acesso ao tempo de propaganda gratuita e ao Fundo Partidário.

O dinheiro do Tesouro foi entregue aos partidos, sem fixação de critérios para repasse aos respectivos candidatos. Tiveram, paralelamente, as agremiações partidárias sua autonomia reconhecida pelo TSE para definir a forma de distribuição dos recursos, observando apenas os limites de gastos fixados pela lei para cada candidatura. Duas questões básicas, porém, foram suscitadas pelos cidadãos, que bancaram os gastos eleitorais: a falta de isonomia na distribuição da verba oriunda dos contribuintes e o repasse de dinheiro público para candidatos com diversas denúncias em tribunais pela práti ca de diferentes crimes.

Dos 35 partidos com registro no TSE, 14 não satisfizeram a cláusula de desempenho. Ficarão, em consequência, sem tempo de rádio e TV e sem verba do Fundo Partidário. O objetivo da lei foi, justamente, reduzir o número de agremiações para “garantia da governabilidade”. A boa governança, entretanto, não é alcançada com a simples redução do número de partidos. Precisa de algo mais. Faz-se necessária uma mudança na cultura política dominante, segundo a qual o mandato pode ser utilizado como instrumento para satisfação do interesse pessoal daquele que foi investido na representação popular. Essa compreensão distorcida do papel do representante do povo leva, inevitavelmente, a nação à pobreza, agrava as desigualdades e estimula a violência, em decorrência dos péssimos exemplos aos jovens oferecidos por quem exerce o poder político e faz opção pelo crime, apostando na impunidade.

Sem a sedimentação dos conceitos de “bem comum”, supremacia do interesse coletivo e impessoalidade, na governança do Estado, continuaremos a assistir a prevalência da falta de decoro no exercício do mandato, bem configurada na exigência de benesses em troca de apoio político.

A Constituição, por sua vez, enfatiza no seu art. 205 ser o preparo para o exercício da cidadania um dos objetivos da educação. Nessa “qualificação” está compreendido o preparo para o respeito ao pluralismo, à liberdade de expressão e aos princípios da legalidade, impessoalidade, publicidade, moralidade e eficiência na condução dos negócios públicos. A própria democratização dos partidos deve ser objeto de preocupação da sociedade que almeja desfrutar da democracia com duração de longo prazo. Educação para a cidadania deve iniciar-se na escola do ensino fundamental e somente se consolida com a pedagógica aplicação da sanção aos governantes e representantes do povo que se utilizam do pode para a prática de crimes, desviando-se completamente da finalidade do mandato.

Sem um aprimoramento na qualificação das pessoas para o exercício do poder, sempre se aguardará a efetivação de uma reforma política. É ilusão, porém, supor que homens indiciados, denunciados ou condenados, atuando como legisladores irão fazê-la. Com efeito, enquanto o País consentir que alguém possa exercer função legislativa, durante o dia, e à noite ser recolhido à penitenciária para cumprimento de pena pela prática ilícitos contra a Administração Pública, a sociedade não concretizará o objetivo fundamental da República de construir uma sociedade livre, justa e solidária.

Djalma Pinto é Jurista, Advogado, Mestre em Ciência Política e autor de diversos livros.